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Criatividade: competência do futuro ou uma realidade do presente?

É fundamental que se aplique criatividade em termos práticos e que se leve os futuros professores a vivenciar em si mesmos a importância de o fazer e de como o fazer.
14 Julho 2021, 07h15

A criatividade cada vez mais tem sido encarada como uma competência-chave inserida no que podemos chamar de soft skills ou transversal skills. Podemos considerar estas como sendo competências que vão para além do conhecimento factual como são exemplo a capacidade de comunicação, trabalho em equipa, resolução de problemas, liderança, criatividade, entre muitas outras.

Estas competências são atualmente condição sine qua non no mundo profissional e por isso mesmo também devem ser uma preocupação da Educação pois é esta que, em última instância, deve preparar os seus alunos para o mercado de trabalho.

Neste sentido, a Comissão Europeia lançou em 2020, o relatório final sobre o estudo “Creativity – a transversal skill. An overview of existing concepts and practices”. Um dos pontos mais surpreendentes neste relatório encontra-se logo no seu início. O mesmo reporta que num estudo desenvolvido, também pela Comissão Europeia, por volta de 2010, esta considerou a criatividade como efetivamente uma competência transversal que estaria relativamente presente nas diretrizes educativas dos países europeus, mas que seria necessário muito mais fazer para torná-la uma realidade visível e “palpável”. Passados 10 anos, este novo estudo reporta que a criatividade continua a surgir de forma destacada nos modelos educacionais, contudo, não é ainda uma competência ensinada ou promovida de forma sistemática, na grande maioria dos países. Quão interessante é esta constatação? Ou talvez quão preocupante? Mas mais importante do que isso: por que razão, após 10 anos, ainda muito mais necessita ser feito para efetivamente assegurar que a criatividade se afirme, não só no papel, mas sobretudo na realidade como uma prática recorrente?

Pessoalmente, acho que as razões podem ser muitas, mas destaco a necessidade de introduzir criatividade muito mais cedo nos currículos do Ensino Superior e, consequentemente, nas aulas daqueles que um dia vão ensinar e ser professores. A meu ver, não basta apenas falar sobre criatividade. Apesar de, claramente, ser importante transmitir os conhecimentos teóricos que a sustentam. É fundamental que se aplique criatividade em termos práticos e que se leve os futuros professores a vivenciar em si mesmos a importância de o fazer e de como o fazer. Alguns não o fazem na sua sala-de-aula talvez porque não saibam como fazê-lo ou talvez pensem que não têm capacidade para tal.

Aplicar criatividade na sala de aula não tem que ser (nem é) algo “do outro mundo”. Criatividade pode nascer de algo tão simples como fazer um desenho, criar uma história ou simplesmente fazer brainstorming. O que importa é que deixemos a criatividade ser livre, que a deixemos crescer, que demos liberdade para que os alunos possam ter as suas próprias ideias e que juntos as possamos discutir, sem reprimendas, sem regras restritivas, mas com uma mente aberta ao desconhecido.

Se desde o início da formação dos professores este esforço for realizado, teremos pessoas mais consciencializadas para esta competência. Assim sendo, este professor criativo potenciará mais facilmente a criatividade na sua sala de aula, levando ao desenvolvimento da capacidade criativa dos seus alunos, que ao crescerem neste ambiente poderão levar esses conhecimentos e experiências pela sua vida fora, estando mais bem equipados para enfrentar o mundo do trabalho. Desta forma, poderemos quebrar este ciclo de que, passados 10 anos, ainda não se veja espelhada uma realidade que há muito tempo é uma necessidade e atualmente uma emergência para lidar com a crise que vivemos e que, provavelmente, iremos continuar a viver por mais algum tempo.

Termino com um pensamento de Sir Ken Robinson cuja visão sobre criatividade na Educação sempre me motivou e que, infelizmente, faleceu no ano passado: “Teaching is a creative profession, not a delivery system. Great teachers do [pass on information], but what great teachers also do is mentor, stimulate, provoke, engage”. Por isso, deixo a todos os professores e educadores; professores dos professores; professores dos educadores, o desafio de que sejam grandes professores: arrisquem e tornem as vossas salas-de-aula verdadeiros centros de criatividade. Talvez com esta pequena grande mudança possamos daqui a 10 anos afirmar que a criatividade não é uma competência do futuro, mas uma realidade do presente.

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