As sociedades de advogados e outras empresas que se querem transformar nesta Quarta Revolução Industrial, através da digitalização, devem evitar cometer erros como o de manter a sua cultura inalterada, defende Nuno da Silva Vieira, sócio coordenador do departamento de Legal Intelligence da Antas da Cunha Ecija & Associados.
“Não podemos simplesmente encontrar a melhor empresa de tecnologia do mundo e comprar serviços. Temos de fazer um set up inicial. De que me vale contratar para fabricar uma app se os meus clientes não se adaptam a esse tipo de tecnologia?”, questionou o advogado, na web conference “Sociedades de advogados: o desafio da digitalização”.
Logo, as organizações devem perceber se as pessoas com as quais trabalham e com quem fazem negócios darão efetivamente uso a essas ferramentas antes de recorrer a legaltech ou outros serviços vendidos pelas tecnológicas.
Na sessão transmitida esta quinta-feira na JE TV, o advogado disse que não acredita em escritórios de advogados que se transformam simplesmente comprando serviços tecnológico e admitiu que este processo de modernização tem “zonas densas e por vezes perigosas”.
“Em relação a Portugal, há boas notícias. A industrial legal portuguesa – apesar de não ser tão grande quanto Londres, por exemplo, e ser até bastante pequenina – tem dado sinais de compreensão deste tipo de necessidade. Admito que a transformação tecnológica no país esteja a caminhar a um nível global”, defendeu.
No entanto, o que mais choca a Nuno da Silva Vieira é a narrativa e teatralidade da justiça continuarem iguais apesar de um europeu-tipo no séc. XV ser alguém que acredita em superstições e um europeu do séc. XXI ser uma pessoa que convive com a tecnologia diariamente.
“Se há profissões que sempre resistiram ao impacto da tecnologia foram de facto as jurídicas. Se olharmos para a forma como um julgamento era feito há 2.000 anos e tentarmos replicar um julgamento hoje a diferença é muito pouca: a oralidade, a presença de alguém que decide, das partes e prova testemunhal”, compara.
Contratos podem ser assinados online ou com dados biométricos
Miguel de Azevedo Moura, professor auxiliar da Nova School of Law, não tem dúvidas de que no último houve uma explosão de tecnologia e rapidez na advocacia, tal como em todas as atividades económicas devido à pandemia, mas antevê que a recuperação económica abrandará esse ritmo de digitalização.
“Como acontece nos mercados financeiros, quando há um boom no preço depois há uma correção para ajustamento. Porquê? Se é verdade que os advogados precisaram urgentemente de se adaptar ao teletrabalho, gestão documental sem qualquer papel, isso implica assinaturas digitais”, explicou o docente, que coordena o mestrado em Direito – Especialização em Direito e Tecnologia da Nova School of Law.
Além das assinaturas digitais, o painel debateu ainda o recurso à biometria (que envolve leitura de características físicas como impressão digital ou retina) para assegurar a fiabilidade dos documentos. Sobre estas tecnologias, Miguel de Azevedo Moura adverte que é importante o consenso. Ou seja, o colaborador tem de concordar em facultar esses dados, que podem envolver padrões de voz ou medições da mão.
“Se eu, enquanto trabalhador, não consinto em dar os meus dados biométricos para que no futuro, em representação da empresa, possa assinar o contrato, julgo que a lei deve proteger a minha vontade, que – na minha perspetiva – prevalece sobre essa obrigatoriedade. Mas se eu consentir não vejo motivo pelo qual esse método não seja legalmente viável”, referiu Miguel de Azevedo Moura na mesa redonda intitulada “A transformação digital das profissões jurídicas: oportunidades e desafios” e moderada pelo diretor do Jornal Económico, Filipe Alves.
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