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De solavanco em solavanco, rumo a um dos maiores crescimentos desde 2000

A economia travou a fundo no segundo trimestre, mas a dinâmica da atividade é suficientemente boa para assegurar um crescimento acima dos 2% em 2017 e repetir a melhor marca desde 2000 (2,5% em 2007).
  • Wolfgang Rattay/Reuters
20 Agosto 2017, 21h45

Um conselho útil para quem gere a comunicação de dados económicos: nunca deixar que as expectativas voem demasiado alto. É abdicar, logo à partida, da possibilidade de ganhar uma batalha. Se os números ficarem em linha com o esperado, o máximo que se poderá dizer é que a economia não desiludiu, instalando-se aquela satisfação contida típica de quem se limitou a cumprir os mínimos olímpicos; mas se as esperanças saírem frustradas – como frequentemente saem sempre que a fasquia é colocada demasiado alta – o desânimo alastra. Mesmo que os dados sejam bons, é difícil ignorar o facto de que se esperava que fossem melhores.

As reações iniciais aos números do crescimento económico do segundo trimestre parecem ter sido marcadas por este desalento contido, provavelmente em parte devido ao efeito das expectativas geradas ao longo dos últimos meses. Segundo o Instituto Nacional de Estatística, a atividade económica cresceu apenas 0,2% face ao trimestre anterior (bastante menos do que os 1% dos primeiros três meses), mas avançou 2,8% em relação ao período homólogo, mantendo assim o ritmo de crescimento do passado recente, que continua bem acima da média histórica.

Vale a pena destilar estes números. Comecemos pelos 0,2%. A maior parte das previsões disponíveis numa base trimestral sugeria que o PIB poderia crescer entre 0,3 e 0,5%, com alguns, poucos, aventureiros a arriscarem uma expansão que podia ir até aos 0,7%.

Havia indicações sólidas que justificavam este optimismo, como o comportamento do comércio a retalho, a evolução das exportações de bens, o boom do turismo e os excelentes números do emprego.

O indicador coincidente do Banco de Portugal, que tenta capturar o comportamento do PIB a uma frequência mais alta, também apontava para um crescimento superior. Para perceber o que é que correu mal será preciso esperar pela análise mais detalhada das contas nacionais por componentes, que o INE só divulga a 31 de Agosto.

Em todo o caso, convém contextualizar esta travagem. O PIB português tinha crescido perto de 1% ao longo dos três trimestres anteriores, valores muito acima de qualquer estimativa para o crescimento potencial que a economia consegue sustentar.

Como tudo o que sobe muito tem de descer, era provável que a maré acabasse por baixar. Apesar de a travagem ser superior ao esperado, quase ninguém esperava que taxas daquela ordem pudessem ser mantidas durante mais do que dois ou três trimestres a fio.

De resto, este crescimento ‘aos solavancos’ não é estranho em Portugal. Em 2013, houve dois trimestres de crescimento sólido (0,6 e 1%) que foram seguidos de pequenas contrações da atividade. Em 2015 o PIB voltou a ter dois trimestres bastante bons, aos quais se seguiu uma travagem brusca.

Basta que haja grandes investimentos a concentrar-se nalguns trimestres específicos (empolando o PIB nesses períodos e reduzindo-o assim que os seus efeitos se evaporam) para produzir este padrão. A principal implicação é que não é fácil identificar inversões de tendência em números trimestrais.

Em direção a 2,5%?

Porquê o foco no crescimento trimestral e não no crescimento homólogo? Na verdade, as duas métricas referem-se à mesma realidade e as conclusões deviam ser invariantes ao termo de comparação escolhido. A questão é que o crescimento trimestral é mais fácil de interpretar do que o crescimento homólogo, sendo também mais simples explicar as suas implicações. Mas é importante não esquecer que a única coisa em causa aqui é mesmo o referencial usado – o PIB, seja qual for a métrica, é sempre o mesmo.

Para evitar tomar o todo pela parte e confundir a árvore com a floresta, proponho um exercício simples de projeção, que permite clarificar o verdadeiro significado destes números. Na prática, este exercício consiste em fazer uma previsão para o crescimento anual do PIB tendo em conta os dados já divulgados pelo INE, e assumindo que nos trimestres seguintes a economia cresce em linha com um valor constante, considerado ‘razoável’ tendo em conta os padrões históricos. (No caso, esse número é 0,4%. Há pouco de místico neste valor: ele corresponde à generalidade das expectativas de longo prazo produzidas por organismos internacionais). A ideia é responder a uma pergunta simples: o que é que isto significa na prática?

Com a informação disponível no final de 2016, seria expectável que a economia crescesse 2% no conjunto de 2017. A divulgação dos dados do primeiro trimestre levou-nos a rever fortemente em alta a expectativa para o crescimento, de 2 para 2,6%. Incorporando os dados mais recentes do primeiro trimestre, a fasquia baixa, mas não muito. O best guess, neste momento, é de um crescimento anual de 2,5% – curiosamente, o mesmo valor que a última previsão do Banco de Portugal, divulgada no Boletim Económico de junho. O quadro ao lado mostra a evolução das previsões para 2017 ao longo do tempo, que mostra bem a convergência para valores em torno dos 2,5%. O crescimento do segundo trimestre não irá mudar muito o tom geral das previsões.

É possível usar o mesmo método para balizar as expectativas daqui em diante. Com estes dados, é praticamente certo que a economia vai crescer pelo menos 2% este ano – na verdade, o PIB até poderia registar uma ligeira contração até ao final do ano para assegurar este número global. O limite superior deve estar algures nos 3%, que é o valor que seria atingido se a economia avançasse mais 1% em cada trimestre (ou seja, se repetisse o excelente primeiro trimestre). Tudo somado, parece certo que Portugal vai crescer algures perto dos 2,5%, um valor em linha com a melhor marca desde 2000 (2,5% em 2007).

Artigo publicado na edição digital do Jornal Económico. Assine aqui para ter acesso aos nossos conteúdos em primeira mão.

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