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“Desde 2015 foram captadas 584 novas operações e rotas aéreas”

Turismo em Portugal tem sofrido uma mudança estrutural, deixando de ser uma atividade sazonal. Novos mercados de origem foram captados, como os EUA, Brasil e Coreia do Sul. Brexit é o maior desafio.
4 Maio 2019, 17h00

O turismo é um setor de atividade que pode ser instrumento de promoção de um país como destino ideal para investir, viver e estudar. É essa a premissa que a secretária de Estado do Turismo, Ana Mendes Godinho, tem aplicado na estratégia do Governo, que desde  há quatro anos procura criar um quadro estável, previsível e de confiança para os empresários do turismo nacional. Ana Mendes Godinho acredita que o turismo nacional é cada vez menos volátil aos ciclos do turismo e, em entrevista ao  Jornal Económico, falou do quadro atual, dos desafios e tendências, mas também de novos mercados.

Qual é o cenário atual do setor do turismo em Portugal?
O turismo tem mudado estruturalmente em Portugal, afirmando-se cada vez mais como uma atividade sustentável economicamente, ao longo do ano – está a deixar de ser uma atividade sazonal e o índice de sazonalidade assim o indica, visto que no ano passado tivemos o índice mais baixo de sempre, 36% quando em 2015 era 39%. Há, por isso, uma evolução positiva. Outro indicador são as receitas turísticas, que em 2018 cresceram 45% em Portugal – se pensarmos na rentabilidade dos capitais próprios das empresas turísticas, que em 2015 era de 1%, em 2018 passou para 14%. Este é um indicador muito apelativo. E também sentimos uma forte dinâmica em termos de investimento em todo o país. Nos últimos três anos tivemos cerca de 1,3 mil milhões de euros de investimentos turísticos a acontecer ao longo de todo o país. Esta é outra mudança estrutural: a procura e a oferta também estão a crescer em todo o território. Temos cada vez mais investidores à procura de ativos em regiões que não eram preferencialmente turísticas e também temos os números a confirmarem que em 2018 as regiões que mais cresceram percentualmente foram as que tradicionalmente eram menos turísticas.

Está a falar do interior do país, que tem ganho outra relevância?
Falo do Porto e norte, regiões do Centro e Alentejo – claramente o interior do país. Nós tivemos um crescimento de 4 milhões de dormidas no interior do país, o que é muito significativo e que demonstra que o interior está a ser descoberto. Têm surgido muitos novos produtos turísticos que estão a levar as pessoas a descobrir a autenticidade que Portugal tem, muito relacionado com o património cultural que o país tem, mas também com a gastronomia e os vinhos.

O que é que tem sido feito nesse sentido?
Por um lado, promover e garantir atividades aéreas nos aeroportos do país ao longo de todo o ano e nos mercados que nos interessa atingir, que são os que deixam mais valor em Portugal e aqueles que viajam ao longo de todo o ano.

Pode dar exemplos concretos?
Exemplos concretos? Fruto deste aumento expressivo das ligações aéreas, desde 2015 foram captadas para os aeroportos portugueses 584 novas operações e rotas aéreas. Isto traduz-se numa capacidade de diversificação de mercados, no crescimento expressivo em mercados onde Portugal era praticamente desconhecido há quatro ou cinco anos – era o caso dos Estados Unidos – e em mercados cuja principal motivação não fosse apenas sol e praia.

Como se promoveu Portugal nos EUA?
Por exemplo, o que aconteceu na Estrada Nacional 2 [N2], que liga Chaves a Faro pelo interior do país: nos EUA ninguém sabia o que era a N2 e o que fizemos foi ações com a vinda de jornalistas e operadores turísticos norte-americanos para conhecer a estrada. Resultado? A N2 foi considerada nos EUA, pelas principais publicações americanas, como o destino a não perder em 2019.

De forma geral, como se faz a promoção de Portugal?
Por um lado, foram criados instrumentos financeiros específicos para dinamizar produtos turísticos em todo o país – por exemplo, as termas, as aldeias histórias, o enoturismo – e digitalização da oferta, quem não está no digital, está fora do mapa. Resumindo, o que temos feito é estruturação e dinamização de produto. Por outro, a promoção focada dando visibilidade a regiões e produtos que antes não eram objeto de promoção internacional. A par disto, houve uma aposta em novos negócios no turismo. É interessante ver a evolução das empresas de animação turística desde 2015 até agora: tínhamos cerca de duas mil empresas de animação turística e hoje temos oito mil.

Estamos na reta final da atual legislatura. Que balanço faz dos últimos quatro anos no setor do turismo?
Tivemos a preocupação de ter um quadro estável, previsível e que gerasse confiança para os empresários e que não fosse volátil nos ciclos do turismo. Por isso, em 2016 aprovámos uma estratégia para dez anos – o Plano de Estratégia 2027, que foi publicada em 2017 – em que identificámos as metas que todos, entidades públicas e privadas, nos comprometemos a atingir em 2027. Trata-se de metas com indicadores objetivos e concretos de sustentabilidade ambiental, social e económica. Agora momento temos um quadro estável.

Os indicadores apontam para o cumprimento dessas metas?
Neste momento, mostram que conseguimos crescer mais do que aquilo que tínhamos previsto, o que nos dá algum conforto em termos de metas e permite apostar em áreas que eu considero prioritárias, como a promoção e abertura do mapa turístico de Portugal.

Por exemplo, criámos um programa especial para a sustentabilidade ambiental que já tem duzentas candidaturas em análise. Também criámos o programa de apoio à implementação de sistemas e eficiência. No fundo, já criámos condições para que o investimento acontecesse, o que dá confiança aos investidores, que reagiram muito bem.

Que desafios identifica na evolução do turismo em Portugal?
Desde logo o Brexit, que é um desafio que temos tentado transformar em oportunidade, através de medidas aprovadas no plano de contingência e que foram acolhidas no mercado britânico com grande satisfação e que acabou por transformar este plano de contingência num instrumento de promoção de Portugal no Reino Unido.

Qual é o valor do prejuízo para o turismo nacional com a concretização do Brexit?
Neste momento, o número que tenho é que o mercado do Reino Unido, entre janeiro e março, no tráfego do transporte aéreo, cresceu 12% no número de passageiros internacionais que desembarcaram em Portugal. Este é um bom sinal face às quebras que tivemos o ano passado, em outubro. Desde esse mês que estamos a recuperar.

Além do Brexit, que outros desafios há?
Há o desafio de alargar a procura ao longo do território e há a questão da sustentabilidade ambiental como prioridade da nossa agenda, para sermos cada vez mais reconhecidos como líderes do turismo em termos de sustentabilidade. Este ano já fomos reconhecidos, na Alemanha, como o destino que mais está a apostar na sustentabilidade ambiental. Outro desafio é a diversificação de mercados, evitando o excesso de dependência de alguns.

Um outro desafio é encontrar uma solução para a Portela, cuja capacidade estará saturada. Mesmo com os planos de expansão da Portela e com o novo aeroporto no Montijo, há uma solução a encontrar…

A nossa preocupação tem sido promover todos os aeroportos nacionais, internacionalmente – ou seja, captando rotas não só para Lisboa mas para os vários aeroportos no continente e nas regiões autónomas. E o novo número de operações e rotas que já referi reflecte esse aumento da procura. É preciso garantir que continuamos a acompanhar e a crescer na procura para Portugal, nas várias portas de entrada. O Aeroporto de Lisboa é, claramente, uma das nossas portas de entrada e, por isso, já foi apresentado o plano de expansão, que pressupõe dois momentos: a duplicação da capacidade aérea com o Montijo, mas também – até lá – a otimização e maximização do espaço na Portela para permitir este aumento da capacidade aérea. É isso que nos tem permitido conseguir trazer cada vez mais pessoas que viajam ao longo de todo o ano. A nossa preocupação é, sobretudo, passar a mensagem de que é um país inclusivo mas também exclusivo, no sentido em que nos temos posicionado muito junto da procura. Não nos estamos a posicionar como um destino massificado. Não queremos competir com países como a Turquia ou Egito pelo preço ou por soluções com tudo incluído. Portugal é um país diferente, completamente aberto em que o turismo é também um instrumento de desenvolvimento regional e dos territórios.

Queremos continuar a crescer do ponto de vista de ligações aéreas para todos os aeroportos e, neste momento, penso que temos as soluções e as condições para o efeito, nomeadamente com a optimização que a ANA vai fazer na Portela até que o Montijo esteja operacional.

Países do norte de África, como Egito, Tunísia, Marrocos têm apoios estatais para que os operadores aéreos abram rotas e levem turistas para aqueles países. Há até o pagamento de taxas de passageiros, por lugares ocupados e vagos. Como é que Portugal pode defender-se desta concorrência?
A nossa aposta tem sido o posicionamento do país e campanhas de promoção conjuntas, quer com companhias aéreas, quer com operadores turísticos. Por exemplo, em conjunto com as regiões do Algarve e da Madeira lançámos uma campanha especifica em que desenvolvemos ações de marketing e promoções especiais, com campanhas agressivas de venda, dedicadas a mercados como o Reino Unido e Alemanha, que são dois mercados muito importantes, quer para o Algarve, quer para a Madeira. O que fazemos é esta articulação a nível regional com campanhas dedicadas a mercados concretos e que têm dado alguns resultados.

Quais são os principais mercados de origem dos turistas que chegam a Portugal?
Contextualizando, em 2015, cerca de 60% a 70% dos nossos mercados de origem concentravam-se no Reino Unido, Alemanha, Espanha e França. Neste momento, esta percentagem está abaixo dos 50%, o que não quer dizer que estes mercados tenham caído. Pelo contrário, estes mercados cresceram. Mas no volume global da procura conseguimos atrair novos mercados de origem, como é o caso de EUA, Brasil, Canadá, Coreia do Sul e China.

Qual é o grande diferencial de Portugal relativamente a outros mercados?
Portugal é um país autêntico, genuíno mas com inovação e muita sofisticação. Para se perceber o crescimento em notoriedade, em 2015, Portugal recebeu cerca de 150 prémios internacionais de turismo e, em 2018, recebemos 4.243. Isto mostra bem a notoriedade alcançada por Portugal, não só como destino para visitar mas como instrumento de promoção de Portugal como um destino bom para investir, viver e estudar.

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