Fundada há cerca de nove anos, a Bitcoin continua a valorizar e a somar recordes, tendo no passado dia 21 de outubro atingido os 6.194,88 dólares (5.341,65 euros) e ultrapassado a fasquia dos 100 mil milhões de dólares de capitalização. As razões para esta valorização não são claras, mas a verdade é que todos os dias há dinheiro “fresco” a entrar, principalmente proveniente da Coreia do Sul e do Japão, os países onde mais se investe nesta criptomoeda. Os investidores podem estar confiantes no seu investimento, poderia pensar-se, mas a verdade é que a Bitcoin está prestes a enfrentar o seu maior desafio de sempre, não se sabendo se sobreviverá a ele, e de que forma o fará.
Segundo adianta a Forbes, a 16 de novembro, a blockchain original da Bitcoin (uma espécie de livro-razão onde estão guardados todos os dados acerca de todas as moedas do planeta) será dividida em duas, cada uma com o seu conjunto de moedas. Os investidores poderão ver isto como uma boa notícia, porque acabarão de ver a quantidade de criptomoeda que detêm duplicar de uma hora para a outra, mas a luta para saber qual destas duas novas moedas será a “verdadeira” Bitcoin poderá lançar o caos nos mercados. Quem vender o seu set de criptomoedas corre o risco de ser afetado financeiramente – seja porque escolheu o set que irá desvalorizar, seja porque pode existir uma corrida às vendas de ambos os lados e a própria Bitcoin poderá perder grande parte do seu valor.
É verdade que a Bitcoin já passou por um evento semelhante – a divisão entre Bitcoin e Bitcoin Cash – mas nestes caso o que aconteceu não foi uma divisão na tecnologia, foi a dissidência de um grupo, que abandonou a forma inicial para criar uma nova criptomoeda. Os planos não correram da melhor forma e a nova moeda desvalorizou-se bastante, devido à torrente de vendas, descendo até pouco mais de 300 dólares por Bitcoin Cash.
O que está em causa?
A este respeito convém informar que as transações de Bitcoin são agrupadas e processadas a cada 10 minutos e que o limite máximo de informação em cada bloco é de 1 MB, um limite arbitrário imposto no início da vida da Bitcoin para limitar o SPAM. O aumento das transações tem atrasado o seu processamento e aumentado as taxas transacionais, à medida que as pessoas competem para que as suas transações sejam processadas o mais rapidamente possível.
No seu nível mais básico, a questão que divide a comunidade é trivial: como fazer upgrade na rede para acomodar mais transações num qualquer espaço de tempo? A forma como esse upgrade será feito é o que maiores reações tem provocado, com os dois lados – os chamados Cypherpunks, que criaram a tecnologia original, e os partidários de Silicon Valley, que popularizaram a moeda – a trocarem acusações, numa batalha que já dura há três anos.
Divisões, divisões…
O debate gira em torno da forma como será feito o aumento de espaço. Os cypherpunksacreditam em “arrumar” melhor a informação, para caber mais no mesmo espaço, e aumentar um pouco o tamanho dos blocos, ao passo que Silicon Valley acredita em duplicar o tamanho dos blocos de informação, porque a primeira solução será apenas temporária. É aqui que começam as grandes divergências filosóficas. O primeiro grupo afirma que, se se fizerem blocos maiores, será mais difícil a sua criação, diminuirão os construtores e começará a centralização desta construção, com o perigo do monopólio a espreitar. Já o segundo grupo, afirma que passar de blocos minúsculos para blocos pequenos será apenas uma solução temporária e terão de aumentar o tamanho novamente a breve trecho. Por isso, por que não fazer tudo de uma vez?
Se a divisão cypherpunks vs. empreendedores de Sillicon Valley representa a divisão filosófica, a divisão política é representada pelas duas tecnologias em contenda: SegWit vs. SegWit2x. Os quatro principais detentores de Bitcoin são os developers, os mineiros as startups e os utilizadores, que vão de imigrantes aos ultra ricos, que esperam pela corrida ao ouro digital.
Em fevereiro de 2016, em Hong Kong, um grupo de mineiros e developers concordou em adotar a solução SegWit2x (mais arrumação, no dobro do espaço), mas a maioria dos developers continuou a trabalhar com a solução SegWit (melhor arrumação). Apesar disso, no outono de 2016, os developers declararam que esta solução só seria adotada de 95% dos mineiros a quisessem adotar. Seis meses mais tarde, apenas 30% tinha afirmado a sua vontade em o fazer, com a maioria a sentir-se traída pela atitude dos developers. Por seu turno, os developers afirmaram que os mineiros queriam tomar o controlo do sistema e ameaçaram com a adoção forçada da tecnolgia SegWit a 1 de agosto deste ano, o que dividiria a bitcoin em duas chains.
Foi nessa altura que o terceiro grupo político, o dos negócios, surgiu em cena. Em maio, a maior conferência de blockchain do planeta, promovida por uma subsidiária do Digital Currency Group, conseguiu um acordo com os mineiros para a adoção do SegWit2x. O grupo englobava 58 empresas e detiha 83% da capacidade de processamento da rede Bitcoin, declarou que adotaria esta solução se 80% dos mineiros declarasse o seu apoio, o que aconteceu em duas semanas, e os developers chamaram a este acordo uma aquisição hostil da rede.
O que acontece em novembro?
O plano que será colocado em marcha pretende que a divisão seja feita de tal forma que a rede original (a dos blocos com 1MB) não sobreviva. A ideia é a de atribuir tanto poder de processamento à nova chain, que tornará disfuncional a antiga, garantindo o título de “verdadeira” Bitcoin. Se 90% dos mineiros saírem dessa rede, um bloco demorará 100 minutos a ser criado, 10 horas a ser confirmado e serão precisos 140 dias para ajustar a dificuldade extra.
Além disso, os developers da SegWit2x deverão replicar as transações nas duas chains ou seja, a mais pequena vai ficar ainda mais lenta. Além disso, porque as transações são replicadas, quem vender um set de moedas, perderá os dois.
Dado que entre 85 e 90% dos mineiros já assinalou a sua intenção de adotar a nova tecnologia, seria certo pensar que esta triunfará. Mas não será bem assim. Se 85 a 90% dos utilizadores apoiar a chain com menor poder de processamento – como indica a pesquisa da Forbes – ao ponto de prescindirem das suas Bitcoin SegWit2x para comprar mais Bitcoin SegWit1x, nada está decidido e tudo dependerá do preço.
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