O mercado dos dispositivos móveis em Portugal está a recuperar do impacto da pandemia da Covid-19. De acordo com os últimos dados recolhidos pela consultora IDC, no segundo trimestre do ano, os fabricantes entregaram 956.716 ‘máquinas’ (entre smartphones, computadores e tablets), o que representa um crescimento de 5,8% face ao período homólogo de 2020. Os dados “são animadores”, sobretudo no mercado dos smartphones, afirma ao Jornal Económico (JE) Francisco Jerónimo, vice-presidente da IDC para a região EMEA. Contudo, há uma condicionante transversal a todas as categorias de produto, que traz instabilidade a todo o mercado e impede que o crescimento esteja num nível idêntico ao observado antes da pandemia: a escassez dos semicondutores. Para os retalhistas de telecomunicações, “adaptação” e “resiliência” serão as palavras de ordem.
Depois de a pandemia ter imposto o teletrabalho e ressuscitado a telescola, fazendo disparar a procura por computadores de secretária, computadores portáteis e tablets, ao passo que as aquisições de smartphones desaceleraram ou decresceram, em 2021 os movimentos modificaram-se. Quem adiou a renovação do seu smartphone está, agora, à procura de um novo aparelho. “Este ano nota-se já alguma recuperação [nos smartphones], refere Francisco Jerónimo, apontando que, ainda assim, o “mercado não está a crescer para níveis muito superiores aos que existiam antes da pandemia”.
“Estamos a recuperar o que se perdeu no ano passado e, nesse sentido, acaba por ser um crescimento quase nulo, se compararmos a quebra do ano passado e esta recuperação”. Isto nos smartphones, cujos campeões de venda nacionais são a Samsung (162.485 unidades vendidas), a Xiaomi (152.913 unidades vendidas), a Apple (79.313 unidades vendidas), a TCL (53.392 unidades vendidas) e a Huawei (24.388 unidades vendidas).
Quanto aos segmentos dos computadores de secretária e portáteis, o especialista da IDC salienta que, apesar do abrandamento nas aquisições, continou-se a registar um crescimento das entregas de computadores, no conjunto da primeira metade do ano, “verificando-se na Europa algumas das maiores taxas de crescimento dos últimos 10 a 15 anos”. As fabricantes de referência continuam a ser a HP e a Lenovo e destaca-se a portuguesa Inforlândia, “por causa dos concursos públicos ganhos para fornecer computadores às escolas”.
O crescimento mantém-se porque, por um lado, “há uma expectativa das empresas de que a pandemia continue por mais algum tempo – e, mesmo que termine por completo, mudou-se o paradigma do trabalho – e, por outro, toda a procura observada em 2020 “não foi satisfeita”, devido à escassez de semicondutores.
Francisco Jerónimo explica, porém, que avaliar o crescimento de um fabricante, agora, “significa muito pouco”. “O mercado está instável”, afirma, sendo que “o que diferencia um fabricante do outro não é tanto o produto lançado, mas sim a gestão da cadeia de abastecimento que mantém”.
Ou seja, “como há tanta falta de componentes e de máquinas, qualquer coisa que esteja disponível acaba-se por vender”, comenta. Logo, os “que conseguem fornecer são os que ganham quota de mercado”.
‘Chips’ são o grande desafio
Para o vice-presidente da IDC na Europa, a escassez de semicondutores “está a ser, efetivamente, a grande condicionante do mercado”. E, para já, “não há grande solução à vista, porque montar uma fábrica de semicondutores não acontece de um dia para outro, nem com meia dúzia de trocos”.
Alternativa? “O problema é muito complexo e acho que ainda não há resposta, há uma série de questões que não são fáceis de resolver”, responde, indicando que a falta de semicondutores já se verificava antes da pandemia, pelo que o contexto pandémico “veio agravar a situação de uma forma quase exponencial”. É que praticamente todos os aparelhos utilizados no dia a dia têm dezenas ou centenas de chipsets instalados, o que “coloca pressão no fornecimento do mercado”.
Neste cenário, como resistem as retalhistas de telecomunicações no ramo da venda de dispositivos móveis? Ao JE, Daniel Queiroz Antunes, diretor de I&M, Apoio Técnico, Logística e Gestão de Terminais da NOS, explica que a telecom, para reduzir o impacto no consumidor, aumentou a cobertura de stock em categorias de maior risco, diversificou o portefólio, assumiu um planeamento de longo prazo e acionou ordens de compra com maior antecedência. “Algumas destas medidas foram implementadas no início de 2020, ainda antes da pandemia ter chegado à Europa”, visto que a empresa já sentia o problema dos chips desde o final de 2019, motivado pelo fecho de fábricas e fiscalização mais apertada na China, para controlo da pandemia naquela região.
Num contexto altamente complexo, a NOS adotou também uma estratégia de “ainda maior proximidade com os parceiros, o que permitiu continuar a atividade com normalidade”. A crescente preponderância dos canais de venda online também ajudaram a acomodar a situação.
Também Miguel Caridade, diretor responsável pela área de Equipamentos da Vodafone Portugal, sublinha que a empresa sentiu dificuldades com a escassez dos semicondutores. Ainda que “as alterações na compra de equipamentos provocadas pelo contexto pandémico não tenham um impacto tão negativo como inicialmente se previa”, Miguel Caridade refere que se verificaram problemas na cadeia de produção ou logística, “tendo sido necessário adaptar processos e ciclos de compra, onde muitas vezes os planos de entrega não eram cumpridos com claro impacto negativo na gestão logística”.
“A crise dos chipsets não veio ajudar, complicando bastante o planeamento e todo o processo de aquisição de equipamentos, o que nos obriga a um planeamento de compras com um horizonte temporal mais alargado (às vezes de dois anos, e em alguns casos até mais)”, adianta.
Mesmo assim, o gestor da Vodafone Portugal assegura que tem sido possível fazer uma “gestão quase diária dos stocks existentes e, em conjunto com o grupo, garantir que não existem grandes disrupções ao nível de falta de equipamentos”.
Do lado da Altice Portugal, Tiago Silva Lopes, diretor de Produtos e Serviço B2C da Meo, aponta ao JE que os efeitos são “transversais a todos os sectores” e, por isso, a empresa “tem procurado um equilíbrio entre o valor da sua marca, traduzido na confiança; o fator experiência no ato da compra; o preço cada vez mais competitivo e a conveniência na distribuição face às necessidades dos seus clientes”. Isto para acautelar a operação ao novo cenário.
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