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Feira Popular: Por que é que a Fidelidade comprou terrenos 45% acima do preço pedido pela Câmara de Lisboa?

O valor estipulado pela Câmara Municipal de Lisboa para a venda da chamada ‘Operação Integrada de Entrecampos’ era de 188,4 milhões de euros, mas os terrenos foram arrematados por 273,9 milhões de euros. A seguradora adquiriu todos os lotes.
29 Dezembro 2018, 17h00

Três anos depois de terem sido colocados à venda em hasta pública, os terrenos da antiga Feira Popular, em Lisboa, foram, por fim, comprados este mês, a 12 de dezembro.

A seguradora Fidelidade Property Europe SA comprou o espaço por 273,9 milhões de euros, 85 milhões de euros acima do valor mínimo estipulado pela Câmara Municipal de Lisboa (CML), ou 45%, 188,4 milhões. A Fidelidade comprou todos os lotes que se encontravam para venda, os quais ocupam um total de 83.814 metros quadrados. A seguradora controlada pelos chineses da Fosun bateu a concorrência das outras duas empresas concorrentes à hasta pública, Dragon Method SA. e a MPEP-Properties Escritórios Portugal, SA, demonstrando o seu interesse por garantir os terrenos abrangidos pela denominada ‘Operação Integrada de Entrecampos’.

Este bónus de 85 milhões de euros será “integralmente afeto a habitação para as classes médias”, referiu o presidente da CML, Fernando Medina, logo após o desfecho das licitações, assumindo que este havia sido “um dia de grande importância para a cidade” e de “grande felicidade”. A câmara lisboeta já tinha assumido o compromisso de construir 500 fogos com rendas controladas na Avenida das Forças Armadas, mas com este ‘prémio’ Fernando Medina, embora sem dizer em concreto como, pretende “ir mais longe”.

Da parte da Fidelidade, o facto de ter assumido esta parada tão alta pressupõe que tem fortes expectativas de obter rentabilidades bastante interessantes com a comercialização do futuro projeto imobiliário que ali vai ser construído, incluindo a própria sede da seguradora. Apesar de ter fornecido poucos detalhes sobre o que vai surgir nos terrenos da antiga Feira Popular, a seguradora da Fosun assumiu, em comunicado, que “a envergadura deste novo projeto imobiliário, que envolve não só escritórios, comércio e serviços, mas também habitação, irá certamente traduzir-se no potencial encontro com outros investidores e parceiros que, conjuntamente com a Fidelidade tornarão este empreendimento um ícone da nossa cidade”.

Na opinião de Pedro Lancastre, diretor-geral da imobiliária Jones Lang LaSalle (JLL) em Portugal, este desfecho acaba por ser “muito positivo para todos os intervenientes: para a Câmara Municipal de Lisboa [CML], para quem comprou [Fidelidade Property SA], mas sobretudo para a cidade e para o imobiliário português”.

Em declarações ao Jornal Económico, sobre os valores envolvidos na compra destes terrenos, o diretor-geral da JLL considera que “foi um bom negócio para todos. As pessoas sabem fazer as contas e o mercado está muito dinâmico”. Admite que “a Fidelidade comprou por um preço se calhar um pouco acima do que as pessoas estavam à espera”, mas que “certamente vai fazer um excelente negócio com aqueles terrenos”, e afirma que não ficou surpreendido com as verbas envolvidas.

Pedro Lancastre sublinha que a capital portuguesa “deve ser das únicas cidades europeias que tem um terreno daquela dimensão para fazer promoção imobiliária no centro da cidade. Isto causa alguma estranheza, sobretudo aos investidores internacionais, que se perguntam como é possível haver situações destas”.

Pedro Lancastre olha para esta venda como um ponto de partida para a nova realidade de um espaço que foi outrora de diversão, e deixa também elogios à Fidelidade.

“A partir de agora, já podemos dizer que o terreno não é público. É de uma entidade privada muito credível, que tem património e uma visão de longo prazo que faz o imobiliário mexer e sabe fazer as coisas com qualidade. Temos que estar todos muito satisfeitos com este desfecho”, refere o diretor-geral da JLL.

Um dos principais pontos de interesse relativos à compra destes terrenos é conhecer quais os projetos que serão desenvolvidos no futuro. De acordo com o comunicado emitido pela Fidelidade, sabe-se que é desejo da seguradora construir a sua nova sede. Facto que não é visto como prejudicial por Pedro Lancastre.

“Independentemente da Fidelidade fazer ali [Entrecampos] ou não a sua sede, é uma zona muito central, com excelentes acessos (metro, comboio) e na entrada da cidade. Se não for a Fidelidade, será outra grande empresa, porque temos grandes corporates a procurar espaços em Lisboa, e não faltariam alternativas para ocupar espaços de escritórios”, frisa.

No panorama do setor residencial, Entrecampos “é uma zona muito central e vai ser um sucesso”, realça o diretor-geral da JLL, analisando a situação na perspetiva do mercado. “Estivemos muitos anos sem construção nova em Lisboa. Tem-se feito reabilitação, a maior parte dela num nicho que nem todos os portugueses têm capacidade para comprar. Agora, vamos começar a ver a construção com mais escala, de raiz e não apenas reabilitação, e isso vai ser bom para a procura, que há muita, não só dos estrangeiros, mas também dos portugueses que possam ter mais alternativas. Vai ser um projeto que vai ter muito sucesso, certamente”, refere Pedro Lancastre.

Questionado sobre um possível interesse da JLL em promover algum dos projetos destinados àquele espaço, Pedro Lancastre destaca que a empresa trabalha “com os grandes promotores em Portugal” e que “tem uma presença muito forte em todos os setores do imobiliário” e, como tal, “certamente que alguma coisa vamos fazer. Vai haver muito trabalho para muita gente nos próximos anos e espero que possamos ter ali uma intervenção”, sublinha.

Em relação aos diversos atrasos na conclusão deste processo, o diretor-geral da consultora olha para os dois lados da moeda. “Quando o imobiliário está nas mãos do Estado ou dos bancos é uma coisa. Quando está nas mãos dos promotores e agentes imobiliários é outra”, afirmando que “não é suposto o Estado, nem os bancos serem promotores de terrenos e imóveis, e isso faz com que as coisas demorem mais tempo”. Realça que esse “é um mal que ainda temos, mas felizmente toda a economia do imobiliário está a funcionar. Vamos ter cada vez mais a economia à volta do imobiliário, com os agentes certos, para que as transações ocorram com mais velocidade e haja mais liquidez no mercado”, frisa Pedro Lancastre.

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