Daqui a menos de quatro meses a informação bancária vai deixar de ser propriedade exclusiva dos bancos. Fruto da legislação europeia, a partir do próximo dia 14 de setembro, todas as instituições financeiras terão de ter operacionais plataformas de open banking – para que várias entidades, que não apenas os bancos, possam ter acesso às contas bancárias dos seus clientes (ainda que só com o “ok” dos donos). “Imaginem o que uma seguradora pode fazer quando souber que gasto 5 euros em tabaco e o que pago todos meses num ginásio?”, exemplificou Diogo Nesbitt, cofundador da Bankonnect, no “1º Encontro Fintech”, organizado pela sociedade de advogados Sérvulo e do qual o Jornal Económico foi media partner.
Alguns bancos e fintechs já se chegaram à frente da diretiva dos pagamentos (PSD2) e disponibilizaram as suas APIs, mas, no final do verão, nascem mais oportunidades e ofertas neste negócio, capazes de impactar o trabalho dos programadores, das entidades e a experiência dos consumidores. “Vai ter pontos positivos mas será um misto de sensações. Ninguém vai querer desenvolver um PFM [Personal Finance Management] em Portugal. A inovação não é só fazer porque a PSD2 obriga. Se os bancos inovassem davam acesso a tudo. Os clientes querem-no”, defendeu o Diogo Nesbitt, uma vez que a quantidade de exigências, o número de logins necessários, “matam a experiência do utilizador” na gestão do seu próprio dinheiro e contas.
Para o diretor comercial da SIBS, assiste-se um novo paradigma de concorrência que está a mudar a dinâmica do mercado e a criar uma estandardização de novos comportamentos por parte dos utilizadores, bem como um fenómeno que apelidou de «walletização» – a opção pelas carteiras digitais. Apaixonado pelos modelos matemáticos do machine learning, Ricardo Chaves apresentou, nesta conferência, uma série de tecnologias massificadas e sublinhou que o foco do regulador europeu é também a evolução da arquitetura do sistema financeiro. Enquanto representante do processador português (ou “fintech de back-end”), Ricardo Chaves lembrou que o open banking da SIBS dá acesso, numa só ligação, a 18 bancos. “Enquanto os bancos estavam ocupados a lamber feridas as fintechs estavam a inovar”, afirmou.
No painel sobre o “admirável mundo novo” da banca e da tecnologia, moderado pelo of counsel da Sérvulo Francisco Mendes Correia, empresas de pagamentos portuguesas apontaram o dedo aos chamados incumbentes. “Todos os consumidores sentem que a banca não está lá. É preciso pôr o titular da conta no centro da atenção, o que não tem acontecido. Como é que só chegaram no final de 2018 as transferências instantâneas?”, criticou Sebastião Lancastre, CEO da Easypay. Na sua opinião, é arcaico que os extratos bancários só fiquem disponíveis durante seis meses para consulta. João Barros, CEO da Pagaqui, admitiu que o dinheiro físico anda de mão dada com a pequena fraude, “é pouco higiénico e pouco prático”. Estes empresários, admitidos fãs da Revolut, frisaram que passaram por um processo “gigantesco” de regulação com a famosa diretiva, como se estivessem no arranque da regulação da sua atividade.
Atentos a estas preocupações e sentados na plateia, CMVM e Banco de Portugal (BdP) garantem que não se colocam à margem da inovação. “Os novos riscos não nos podem levar a abandonar as oportunidades, a favor do sistema, da economia e do bem-estar social”, Filomena Oliveira, vice-presidente cessante da CMVM. Para Hélder Rosalino, administrador do BdP, o uso da inovação como estratégia de mudança e a aposta na formação serão cruciais. “A banca está a fazer um esforço para pôr o cliente no centro”, diz.
Artigo originalmente publicado na edição do Jornal Económico nº 1991 de 31 de maio de 2019
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