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Governo de Cabo Verde cancela proposta de lei da regionalização

O maior partido da oposição (PAICV) “não ficou surpreso” com a decisão do executivo cabo-verdiano.
13 Abril 2019, 13h05

O governo de Cabo Verde pediu formalmente esta sexta-feira o“cancelamento” da proposta de lei da regionalização por causa da posição do maior partido da oposição (Partido Africano da Independência de Cabo Verde – PAICV), anunciou o ministro para os Assuntos Parlamentares cabo-verdiano.

“Cancelámos porque o PAICV posicionou-se claramente contra as ilhas, o aprofundamento do poder local e contra a criação de condições de oportunidade de criação de riqueza e de inclusão social”, justificou Fernando Elísio Freire aos jornalistas. O governante disse ainda que, com a recusa em aprovar este diploma, o PAICV está posicionar-se “contra a criação de emprego nas ilhas”.

Fernando Elísio Freire, que falava à imprensa após a retirada da proposta de lei do governo, reiterou que a regionalização não só “aumenta a eficiência e eficácia do Estado”, com também “reduz as assimetrias regionais”, na perspectiva da “consolidação da democracia cabo-verdiana”.

“O mais grave é que o PAICV condicionou tudo isto, a proposta de extinção de municípios, como São Vicente, Maio, Brava, Sal e Boa Vista, o que demonstra bem que está totalmente desalinhado com a descentralização”, defendeu o ministro, que acusa os “tambarinas” de “travar um processo fundamental para a afirmação de Cabo Verde como país que está na rota das grandes reformas” e esta da regionalização, diz, “teria um impacto muito positivo sobre as populações”.

Quanto às alegações do PAICV de que nunca foi chamado pelo executivo para negociações, Fernando Elísio Freire explicou que aquele partido político “esteve sempre presente na Comissão Paritária, através do seu deputado Manuel Inocêncio Sousa”. Ademais, referiu que o governo não quis fazer-se representar na tal comissão, já que “quem vota são os deputados”.

“Os deputados do PAICV, os do MpD [Movimento para a Democracia], e os da UCID [ nião Cabo-verdiana Independente e Democrática] reuniram-se várias vezes para trabalharem o diploma”, assegurou o ministro, acrescentando que o governo está de “consciência tranquila” e fez de tudo para dotar o país de uma “reforma estrutural e fundamental”.

Questionado sobre a possibilidade de o diploma regressar ao Parlamento durante a presente legislatura, respondeu que fica “muito e muito complicado”, tendo em conta o calendário eleitoral, ou seja, as eleições autárquicas.

PAICV:  “Foi a opção mais inteligente”

Para o deputado do PAICV, João Baptista Pereira, a retirada da lei da regionalização não apanhou de surpresa o seu grupo parlamentar: “Creio que foi a opção, digamos, mais inteligente. Não fazia sentido continuarmos a discutir até ao final os artigos”, disse aquele parlamentar, para quem, caso contrário, a sua bancada estava à espera para ver qual seria a “criatividade do Governo para continuar a discussão”, porque, adianta, “vários artigos já estavam a ser reprovados”.

Na óptica de Baptista Pereira, os discursos produzidos, quer pelo ministro Fernando Elísio Freire, quer pelo líder da bancada da maioria, “mostram que a intenção do MpD é dividir os cabo-verdianos”. “Não se faz uma reforma dessa maneira. Em 2010, fez-se um conjunto de reformas, nomeadamente, a revisão da Constituição e todo o edifício da Justiça foi alterado”, indicou, acrescentando que, para o efeito, foram necessárias “negociações intensas”, as quais levaram o seu tempo.

Quanto à não participação do governo na Comissão Paritária, entende que se trata de uma “grande desculpa”. “O governo anterior fez um conjunto de reformas e o MpD, na altura oposição, participou ativamente”, declarou, para depois sublinhar que o anterior era “mais humilde e ciente de que uma reforma se faz assim”.

Citou o caso do acordo militar que Cabo Verde assinou com os Estados Unidos da América (SOFA), uma “questão fraturante”, mas para a qual o governo decidiu avançar sozinho. “Não há capacidade negocial por parte do atual Governo”, acusou João Baptista Pereira, adiantando que “o MpD nunca quis a regionalização”.

Por outro lado, para o líder do grupo parlamentar do MpD, “não passa pela cabeça de qualquer cabo-verdiano” que o seu partido não está interessado na regionalização. “Nós trouxemos, discutimos e consensualizamos as posições com a UCID e pedimos ao PAICV que participasse nas reuniões da Comissão Paritária”, revelou Rui Figueiredo Soares, dizendo que o partido da estrela negra conseguiu “amedrontar os deputados que tinham votado favoravelmente” o diploma na generalidade.

“Os deputados do PAICV que tinham votado a favor, agora voltaram as costas às suas ilhas e às suas regiões e resolver alinhar-se com o PAICV.  É legítimo, mas lamentamos que assim seja”, queixa-se aquele responsável político, enfatizando que o PAICV só entende do discurso de um “Estado centralizador e, no fundo, um Estado em que há poder único a denominar toda a sociedade”.

Rui Figueiredo Soares acredita, porém, ser possível que a citada proposta de lei volte à Assembleia Nacional ainda na presente legislatura. No que tange ao referendo, admite que esta “possibilidade está no Programa do Governo”.

Por seu turno, o líder da UCID considera que “não foi a melhor solução” o cancelamento da lei de regionalização. António Monteiro acha que, infelizmente, “o processo sobre a regionalização iniciou-se muito mal”. “O MpD e o PAICV não conseguiram chegar a um acordo, quando se sabe que a lei necessitaria de dois terços dos deputados para passar”, apontou.

“Tratando-se de um instrumento importantíssimo para o desenvolvimento do país e para um certo equilíbrio entre as ilhas, os sujeitos parlamentares deveriam ter um pouco mais de tranquilidade e discutir as questões fraturantes até ao fim e darmos ao país uma proposta que o pudesse servir”, indicou António Monteiro.

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