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“Investimento público em infraestruturas está aquém do necessário”

Quase metade do investimento estrangeiro feito em Portugal nos últimos cinco anos vem de França, com forte concentração no norte e em Lisboa, afirma Carlos Aguiar, presidente da Câmara de Comércio Luso-Francesa.
14 Outubro 2019, 07h34

Que avaliação fazem as empresas francesas, ou de capital francês, que trabalham em Portugal sobre condições e custos do mercado?
Segundo dados recentes do INE, a carga fiscal atingiu, em 2018, o nível recorde de 35,4% do PIB, o que, naturalmente, não deixa de se relevar na ponderação que as empresas francesas fazem nas suas decisões de investimento em Portugal, e na competitividade do país – que desceu seis posições, para 39ª, na classificação mundial de Competitividade do IMD World Competitiveness Center/Lausanne. No entanto, cumpre salientar que em matéria de carga fiscal, Portugal se situa num patamar inferior à média europeia (UE a 28), que, em 2018, foi de 39,4%.

Não ignoram os investidores e as empresas, como o sublinha a Comissão Europeia no seu Relatório/2019 sobre Portugal, a falta de mão de obra qualificada, a ainda baixa produtividade dos trabalhadores, a necessidade de melhorar o nível de competências da população, a necessidade de reduzir a carga administrativa e regulamentar que pesa sobre as empresas, e os custos excessivos da energia e das telecomunicações, fruto de um mercado pouco concorrencial. E ainda o facto de o investimento público, sobretudo nas áreas da investigação e desenvolvimento, no transporte ferroviário, nas infraestruturas portuárias e na transição energética, ficar aquém do necessário, por comparação com os demais países da União.

No entanto, nenhum desses fatores desfavoráveis impediu a progressão muito significativa, nos últimos anos, do investimento estrangeiro em Portugal, e muito em particular do francês. Estudo recente indica que os investimentos estrangeiros no norte de Portugal, e em particular no Porto, aumentaram, entre 2013 e 2018, numa média anual de cerca de 11%; e que à França corresponde uma fatia de 46% desses projetos de investimento (seguida da Alemanha, com 13%). De notar que os projetos de investimento estrangeiro em Portugal estão, sobretudo, concentrados no norte (32% em 2018) e na região de Lisboa (41% em 2018).

 

A tendência é para aumentarem a presença ou a expetativa é de estabilização?
É difícil fazer previsões a esse respeito. Diria que mais em resultado do momento geopolítico e económico global presente – guerra comercial EUA/China, possível recessão na Alemanha, incertezas do Brexit e pós-Brexit e fragmentação política em países da UE – do que de variáveis internas, a tendência será para uma estabilização.

 

Com a expetativa de redução do crescimento na zona euro, incluindo a França, existe o risco de redução de atividade das empresas francesas em Portugal?
O investimento francês em Portugal é de muito longa data e tem-se mantido estável, e em progressão constante, ao longo dos últimos decénios, mesmo em períodos de maior instabilidade política, de menor crescimento económico, ou mesmo de recessão. E há novos investimentos franceses recentes que têm crescido em ritmo elevado.

Quando muito, face às condicionantes externas presentes ou próximas futuras, e aos reflexos que as mesmas poderão vir a ter na nossa economia, estou em crer que a tendência será para uma certa estabilização, ou para a ocorrência de menos novos grandes investimentos.

 

Quais os grandes setores de atividade industrial e de serviços que o capital francês detém em Portugal?
Indústrias automóvel e de componentes automóveis, aeronáutica, energia, digital, TI, novas tecnologias, distribuição, telecomunicações, aeroportuário, promoção e investimento imobiliário, turismo, agroalimentar, serviços financeiros, para mencionar alguns.

 

Questões como o Brexit ou a guerra comercial EUA/China poderão afetar o crescimento das economias do continente, incluindo as economias de França e Portugal?
Analistas bem melhor informados do que eu dizem que sim; a que acrescentaria a fragmentação da vida político-partidária em importantes parceiros nossos, como é o caso da Espanha e da Itália, onde são manifestas as dificuldades de formar governos, ou de coligações frágeis serem capazes de cumprir os respetivos mandatos eleitorais. E a possibilidade de a Alemanha entrar em recessão, e as tensões na coligação no poder não são, igualmente, boas notícias para os nossos países.

 

Que constrangimentos ao nível fiscal e de custos de contexto poderão ser melhorados para um crescimento do investimento francês em Portugal?
Eu diria, entre outros, os que mencionei na resposta à primeira pergunta, e para os quais a Comissão Europeia, o FMI, o Banco de Portugal, o Conselho de Finanças Públicas e o Forum para a Competitividade, para citar alguns, vêm chamando a atenção dos nossos decisores políticos.

É expectável que o Governo que sair das eleições de 6 de outubro se empenhe na realização das reformas necessárias, de modo a reduzir o peso do Estado na economia e na vida dos cidadãos, e a melhorar o ambiente em que as empresas e os agentes económicos se movem, uma vez que é da iniciativa privada, atuando dentro de um quadro legal estável e previsível, que depende, sobretudo, o crescimento económico e a melhoria da produtividade, sem os quais não pode haver aumento sustentado dos rendimentos das pessoas.

 

Para as famílias francesas que se querem instalar em Portugal há respostas suficientes ao nível do ensino curricular francês?
Dizem os meus amigos franceses, e portugueses que neles têm os filhos a estudar, que os liceus franceses de Lisboa e do Porto são centros de ensino de excelência, mas que já sentem algumas dificuldades em fazer face à procura crescente das famílias francesas que se instalam em Portugal (e não só). Não farei vaticínios sobre como resolver o problema, mas, aparentemente, haverá que tomar medidas.

E para os portugueses, a aprendizagem da língua francesa voltou a ganhar importância acrescida, face às oportunidades de emprego proporcionadas pelas empresas francesas, cabendo destacar o trabalho exemplar da Alliance Française e dos Conselheiros Franceses do Comércio Externo que desenvolveram um programa de aprendizagem da língua francesa “Langue Française, Langue d’Opportunités” em colaboração com várias universidades portuguesas.

 

As condições propostas por Portugal ao nível fiscal para Não Residentes Habituais têm atraído muitos cidadãos franceses. Essas condições que considera cruciais devem continuar a existir?
Espero bem que deixem de ser, como diz, “cruciais”. Estou em crer que a atratividade de Portugal para cidadãos franceses se deverá, crescentemente, afirmar pelas características permanentes do meu país (proximidade geográfica, de pessoas e histórico-cultural, clima, “douceur de vivre”, gastronomia, infraestruturas de excelência, para lembrar algumas) e por uma economia aberta à inovação, amiga do investimento produtivo privado, com um quadro legal estável, uma produtividade maior e uma fiscalidade competitiva, igual para todos, por aferição com os seus principais parceiros comerciais.

 

Falamos sempre do investimento francês em Portugal. E ao contrário? Há interesse de grupos portugueses no mercado francês?
Existe interesse crescente de grupos portugueses pelo mercado francês, existem investimentos portugueses importantes em França, e a Câmara, em articulação com a Business France e os Serviços Económicos da Embaixada de França, tem vindo, em Portugal e em França, a iniciar ou a participar em ações destinadas a dar a conhecer o mercado francês em Portugal.

Mas há muito mais a fazer neste domínio, e a Câmara quer continuar a ser um dos facilitadores dessa abertura do mercado francês ao investimento português, ou do estabelecimento de outros tipos de relações comerciais tendo o mercado francês como alvo.

 

Que riscos terão de ser acautelados quando um grupo empresarial português se quer instalar em França?
À semelhança do que recomendamos aos franceses que se querem instalar em Portugal, para um conhecimento aprofundado do mercado francês é prudente e avisado que o interessado procure conselho especializado adequado, que lhe permita compreender melhor o país, as suas gentes e a sua cultura, melhor formatar o seu projeto e avaliar os riscos do mesmo.

E assinalo a existência e o dinamismo da Business France, com escritório em Portugal, que desempenha um papel em vários aspetos semelhante ao do nosso AICEP no apoio ao potencial investidor em França.

 

Ao nível da CCILF como avalia as várias edições dos prémios da Câmara de Comércio? Há prémios novos a serem lançados?
No ano passado, na 25ª Edição dos nossos Troféus, iniciamos o Troféu Start-Ups, que teve um bom acolhimento. Ao todo, são, agora, 7 Troféus (Exportação, PME, Investimento, Inovação, Desenvolvimento Sustentável, Start-Ups, e Especial do Jury).

Estou convicto que esta 26ª Edição, que terá o seu Jantar de Gala de anúncio dos finalistas e do vencedor de cada Troféu no próximo dia 10 de Outubro, no Sud Lisboa, será um sucesso idêntico ao dos anos anteriores, em número de candidatos, de patrocinadores e de presença de pessoas nesse Jantar.

 

Os prémios têm sido um incentivo para as empresas melhorarem os procedimentos a nível ambiental e de responsabilidade social?
Espero que sim. O Troféu é em si o reconhecimento das muito boas práticas por parte da empresa premiada. Se constituir um incentivo a uma melhoria dessas práticas, tanto melhor!

 

A par dos Prémios anuais, quais as grandes iniciativas da Câmara de Comércio ao longo do atual mandato?
A CCILF dispõe de uma vasta gama de serviços e organiza regularmente seminários temáticos e missões setoriais para empresas francesas que desejam desenvolver os seus negócios ou implantar-se no mercado português. O Fórum do Investimento e Imobiliário, o Fórum Recrutar em Portugal; a participação no Fórum Expat em Paris, os Seminários Investir em Portugal realizados em várias regiões de França têm tido muito sucesso.

Para reforçar o seu carácter bilateral, a CCILF tem também uma atividade de apoio às empresas portuguesas que pretendem integrar o mercado francês. Nesta vertente a CCILF organiza ao longo do ano várias Missões de empresas portuguesas a França para facilitar a procura de agentes comerciais e eventos B2B com empresas francesas que procuram fornecedores ou fabricantes portugueses nos setores da construção civil (bolsa da subcontratação), automóvel, aeronáutica, têxtil, energias renováveis…

Para além do apoio comercial e sempre com o objetivo de facilitar as oportunidades de negócios entre os atores da comunidade empresarial luso-francesa e de permitir os intercâmbios de experiências e ideias entre profissionais de todos os sectores de atividade, a CCILF anima um Clube de Negócios e oferece um vasto e diversificado programa de atividades (almoços, seminários, reuniões temáticas, Soirées de Gala, cocktails, eventos desportivos…).

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