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Israel: Ativistas de direita tentam bloquear investigação a violações a detidos palestinianos por soldados

Após o anúncio do exército de que dez soldados seriam interrogados por alegadas violações sistemáticas a um detido palestiniano, ativistas de extrema-direita, incluindo deputados da coligação governamental, tentaram invadir duas bases militares israelitas para impedir a investigação.
30 Julho 2024, 17h01

Continua a troca de fogo entre o Hezbollah e as forças armadas israelitas ao longo da Linha Azul, a fronteira entre Líbano e Israel definida pela ONU, com a milícia xiita a reivindicar um ataque a uma base militar esta terça-feira que terá vitimado pelo menos um militar. Entretanto, em Israel, grupos de ativistas de extrema-direita estão a tentar impedir o interrogatório de soldados alegadamente envolvidos na violação sistemática de detidos palestinianos, uma discussão que já chegou ao Knesset.

A tensão entre israelitas e o Hezbollah conheceu novo capítulo esta terça-feira, com o movimento xiita a informar nos seus canais de Telegram que havia levado a cabo novo ataque contra um batalhão israelita. A ofensiva na zona de Beit Hillel foi concretizada com uma série de drones suicidas, fez saber o grupo, que fala num soldado morto e vários feridos.

Os incidentes ao longo da fronteira Líbano-Israel agravaram-se a partir deste fim-de-semana, quando um míssil atingiu um campo de futebol na comunidade drusa de Majdal Shams, nos Montes Golã, território sírio ocupado por Israel desde 1967, vitimando doze crianças. Apesar de a comunidade rejeitar a cidadania israelita, as autoridades sionistas procuraram capitalizar o incidente, prometendo retaliação contra o Hezbollah.

A comunidade local não só rejeita as ações contra a milícia libanesa, como recebeu com forte contestação o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, e o ministro das Finanças, Bezalel Smotrich, entoando cânticos em hebraico apelidando ambos de “assassinos”.

O movimento xiita, que tem por hábito reivindicar os seus ataques, rapidamente veio garantir que o incidente fatal na região síria ocupada não fora da sua responsabilidade, mas sim fruto de uma interceção falhada da Cúpula de Ferro, o sistema de baterias antiaéreas instalado por Telavive. Por sua vez, o exército israelita diz ter recolhido provas que o míssil era de fabrico iraniano.

Perante a troca de acusações, o chefe da diplomacia europeia, Josep Borell, pediu uma investigação independente.

Internamente, o debate em Israel foca-se agora nas alegações de violações e abusos sistemáticos em Sde Teimam, um campo de detenção em pleno deserto do Negev (ou Naqab, em árabe) onde nove soldados foram detidos para interrogatório após um detido palestiniano ter sido internado com graves ferimentos no ânus fruto de repetidas violações e agressões.

Perante esta situação, uma onda de protestos de ativistas de direita, incluindo pelo menos um deputado no Knesset da coligação que sustém o atual governo, dirigiram-se esta segunda-feira para o campo de detenção, forçando a entrada e agredindo os soldados que a guardavam. Também a base de Beit Lid, onde os militares estariam detidos, foi alvo de uma tentativa de invasão pelas multidões israelitas de extrema-direita.

O governo reagiu rapidamente, com parte a criticar as detenções dos militares e expressando apoio às suas ações, enquanto outra fação pedia a união nacional. Itamar Ben-Gvir, ministro da Segurança Interna, classificou a detenção como “vergonhosa” e exortou o país a mostrar aos soldados “todo o nosso apoio”; Yariv Levin, ministro da Justiç, descreveu as imagens de militares detidos como “impossíveis de aceitar”; o ministro da Economia, Nir Barkat, classificou a investigação como “um espetáculo” e expressou o seu apoio ao exército; e Miri Regev, ministra dos Transportes, alertou que estas investigações “alegram os nossos inimigos”.

Já Netanyahu e Yoav Gallant, o ministro da Defesa, pediram calma e defenderam que a tensão entre israelitas só ajuda os seus inimigos, sobretudo numa altura de guerra.

As alegações de abuso em Sde Teiman, uma base próxima da fronteira com Gaza para onde detidos palestinianos têm sido enviados e mantidos sem condições de higiene, têm sido ecoadas por vários denunciantes, incluindo organizações não-governamentais israelitas, valendo ao local o nome informal de ‘Guantanamo israelita’. Em abril, o jornal israelita ‘Haaretz’ teve acesso a uma carta enviada por um médico no hospital da base ao procurador-geral, ao ministro da Defesa e ao primeiro-ministro do país sobre os maus-tratos sistemáticos a que os prisioneiros estavam sujeitos.

Não existem dados para o número de detidos no campo, mas o ‘Haaretz’ fala em 36 prisioneiros mortos em Sde Teiman desde 7 de outubro, quando o Hamas atacou a zona envolvente, resultando em 1.139 mortos, 695 deles civis. Muitos dos detidos são libertados sem sequer terem sido acusados de qualquer crime, uma prática recorrente das autoridades palestinianas ao abrigo da chamada ‘detenção administrativa’.

Além destes, a base guardará os corpos de mais de 1.500 palestinianos, também de acordo com o ‘Haaretz’.

A carta falava em homens “alimentados por palhinha, a defecarem em fraldas e constantemente presos às suas camas”, situações que levavam a amputações rotineiras, frequentemente sem anestesia e que violam os princípios de ética médica, alertava o profissional de saúde. Esta descrição fica em linha com os relatos dados em primeira mão à CNN de palestinianos que falam em negação de comida e cuidados médicos, dizem ter estado constantemente vendados e algemados, reportando ainda várias formas de tortura como agressões repetidas, ataques de cães e choques elétricos.

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