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Eila Kreivi: “Já não é possível alterar a direção do comboio [do investimento sustentável]”

Em entrevista ao Jornal Económico, a diretora do Departamento de Mercados de Capitais do Banco Europeu de Investimentos, reconhecida como a “mãe das obrigações verdes”, considera que a relação entre o sistema financeiro e a sustentabilidade deverá estreitar-se e que isso terá reflexos no mercado.
4 Dezembro 2021, 11h00

A tendência para o investimento sustentável já provocou alterações nos comportamentos dos agentes do mercado, incluindo na área financeira, e não volta atrás. “Acredito que não seja já possível alterar a direção deste comboio”, diz ao Jornal Económico Eila Kreivi, diretora do Departamento de Mercados de Capitais do Banco Europeu de Investimentos (BEI).

Em entrevista, aquela que é reconhecida como a “mãe das obrigações verdes”, por ter sido responsável pelas primeiras emissões dete tipo de títulos, considera que a relação entre o sistema financeiro e a sustentabilidade deverá estreitar-se e que isso terá reflexos no mercado. “É cada vez mais difícil ignorar o que a mão esquerda faz, mesmo quando a direita está a fazer a coisa certa”, afirma.

A pandemia de Covid-19 é um ponto de inflexão na perceção sobre a necessidade de investimento sustentável?
Esse é, de facto, um argumento que podemos usar, especialmente no que diz respeito às finanças sociais. As finanças sociais – e estou bem ciente da amplitude dessa definição – multiplicaram-se desde o início da pandemia.
Os governos impuseram condições ambientais e/ou sociais para apoiarem o sector privado e os investidores estão cada vez mais interessados quanto a estes requisitos. Então, sim, podemos falar de um ponto de inflexão, mas ainda não alcançamos os objetivos.

Estamos num período de definição de regras e padronização de métricas. Qual a sua importância e o que podemos esperar?
Isso é crucial. Sem essas definições e métricas, é impossível saber o que conta e o que não conta. O BEI, enquanto Banco do Clima da UE, contribuiu para o marco que é o Regulamento de Taxonomia da UE. Ao estabelecer definições claras e robustas de atividades económicas verdes e ao exigir o reporte adequado, a taxonomia facilitará o investimento para a multitude de novos projetos verdes necessários para criar uma economia de baixo carbono. Além disso, o trabalho realizado pela Plataforma de Finanças Sustentáveis é essencial e é o centro das atenções a nível mundial.
As definições são mais fáceis do lado ambiental, mas [no lado] “social” também pode ser feito. Os mercados financeiros agora olham para a estratégia ou para a abordagem geral dos tomadores de crédito ou das empresas, enquanto anteriormente o foco estava na atividade financiada. É cada vez mais difícil ignorar o que a mão esquerda faz, mesmo quando a direita está a fazer a coisa certa.

O financiamento sustentável será o padrão ou será difícil manter a trajetória de crescimento atual?
Acredito que não seja já possível alterar a direção deste comboio. A velocidade pode variar, mas à medida que os mercados e investidores se acostumarem a receber todas estas informações, não voltarão atrás. O sistema financeiro e a sustentabilidade devem estar intimamente relacionados.

A UE está a mover-se rapidamente nesta direção, com o seu Plano de Ação para o Financiamento do Crescimento Sustentável, e estamos a assistir a uma procura crescente por títulos verdes, sociais e de sustentabilidade. Para se ter uma ideia, o BEI emitiu em 2020 um volume recorde de 10,5 mil milhões de euros de obrigações de Conscientização do Clima e de Conscientização para a Sustentabilidade, mais do dobro do valor emitido no ano anterior.

O que poderia ser feito para incentivar o financiamento sustentável? Que outros sectores vê como adequados, além das energias renováveis?
A energia renovável é, claramente, o sector mais popular para promover o financiamento sustentável. Estamos bem cientes disso. Entre 2016 e 2020, o BEI financiou infraestruturas energéticas com cerca de 60 mil milhões de euros, dos quais mais de 53 se destinaram a projetos de energias renováveis, eficiência energética e redes elétricas. Além disso, através do Mecanismo de Transição Justa, pretendemos mobilizar até 30 mil milhões de investimentos para apoiar os territórios e regiões mais afetados pela transição para uma economia neutra, priorizando aqueles com menor capacidade para lidar com os custos. No entanto, muito ainda precisa ser feito. Por exemplo, temos de melhorar urgentemente a eficiência energética dos sectores habitacional e imobiliário.

Por fim, um aspeto que não recebe atenção suficiente é a resiliência e a adaptação às mudanças climáticas. Vimos novamente neste verão, com as condições climáticas extremas, o quão importante é.

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