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Juízes e advogados unem-se em prol da Justiça

Terceira conferência “Diálogos Magistrados Advogados” teve como tema de debate os quatro anos do novo Código de Processo Civil.
Salvador Esteves
24 Julho 2017, 07h27

São juízes e advogados amigos improváveis? Na terceira edição da conferência “Diálogos Magistrados Advogados”, o Círculo de Advogados de Contencioso procurou provar que não, reunindo juízes e advogados para desvanecer formalismos entre os operadores da Justiça em Portugal. “Os bons juízes são aqueles que falam com os advogados”, resumiu o advogado José Jácome.

Em cima da mesa de conversações esteve o novo Código de Processo Civil (CPC) e as suas especificidades: prova por declarações de parte, ónus de alegação e poderes de cognição, gestão processual e adequação formal e alegações de recurso. De acordo com a Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/ XII, há razões “para esperar que, por via da presente reforma, o processo civil português se abra à modernidade e se liberte de amarras perfeitamente desajustadas e desfasadas”.

Os advogados e magistrados dividem-se perante esta crença, mas deixam claro que a reforma não é uma revolução. João Pimentel vê as alterações como uma “evolução positiva” e argumenta que são bem vindas porque “o regime pretérito tinha falhas”. Ao comparar o sistema português com jurisdições de França, Itália e Espanha, o advogado enfatiza que aquilo que se acrescenta aos documentos de 1939 e 1961 é que a interveniência das partes permite também dar informações.

Luís Filipe Pires Sousa, desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa, começou por levantar duas questões, sobre quando devem ser valoradas as declarações de parte e se o juiz as pode recusar, e apresentou três teses distintas, como a do princípio da prova e a de autossuficiência, sugerindo ainda que as partes fossem ouvidas no fim.
No ar ficou a hipótese de se estabelecer um único regime para as testemunhas. “Sempre tive alguns problemas com as regras do CPC, principalmente aquelas que favorecem o formalismo. As limitações das declarações de parte sempre me fizeram confusão e tive dificuldade em entender. O que está por trás disso é uma desconfiança. Não vejo razão para se presumir que a parte só por a ser tenha tendência para mentir”, explicou Miguel Pinho Cardoso, sócio da Vieira de Almeida.

Incerteza jurídica

Para Maria dos Prazeres Beleza, conselheira do Supremo Tribunal de Justiça, o ónus de alegação e os poderes de cognição são um tema central do processo. Na abertura do segundo painel, expôs que “o problema da articulação dos poderes do juiz e das partes põe se em vários casos, nomeadamente na matéria de facto”.

“Quando existe um ónus, as partes correm o risco de uma alegação insuficiente”, disse, notando que caminho da justiça portuguesa tem sido o do aumento dos poderes do juiz em vários domínios. Já o sócio da PLMJ Nuno Morais Sarmento acredita que face à nova redação do código, em certos casos, a estrutura não foi alterada, sendo que o que é diferente é saber qual o momento de alegação dos factos.

As mais de 10 horas do evento, que contou com o apoio da Deloitte, do Centro de Arbitragem Comercial e da Associação das Sociedades de Advogados de Portugal, não parecem suficientes para tirar impressões dos últimos quatro anos. “Em certos pontos umas pessoas continuam a pensar de uma forma e outras de outras. Foi uma reforma bem intencionada mas não está a ser bem conseguida. Devia haver mais formação específica sobre o assunto quer para advogados quer para magistrados”, sugere Fernando Pizarro Monteiro, sócio da Telles.

Na mesma ótica, a sócia da Cuatrecasas Rita Gouveia julga que fazer este balanço pressupõe a análise da interpretação e implementação das normas e que o maior defeito de certas soluções é que há situações em que estamos num “campo de incerteza jurídica”. Na sua “exposição cirúrgica” sobre o tema, Paula Natércia Rocha frisou ainda que a gestão processual visa diminuir custos e tempo, mas que as regras de certificação e agilização [celeridade processual] não se podem “transformar em formas de contender com os princípios de igualdade”. Segundo as mesmas, a gestão processual e a adequação formal exigem muito dos advogados e dos magistrados e um diálogo de proximidade entre ambos.

Artigo publicado na edição digital do Jornal Económico. Assine aqui para ter acesso aos nossos conteúdos em primeira mão.

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