Livro: “Mundo Subterrâneo: Uma Viagem pelas Profundezas do Tempo”

“Àquela altitude, o vento é gélido, embora o sol vespertino continue forte. O linho-dos-brejos balouça ao vento e brilha como as camisas dos candeeiros a gás. Para oeste, quatro peneireiros numa fila irregular por cima do brejo mantêm graciosamente as suas posições, contrariando o vento. Desfruto da fartura de luz, da imensidão do espaço. Ao alcançar um conjunto de pedregulhos, trepo para o mais alto deles, viro-me para leste e inclino-me um pouco na direção do vento; quero sentir a sua mão a empurrar-me o peito, quase erguendo-me no ar, tratando-me como um peneireiro.”

Esta Primavera, e esta semana em particular, trouxe boas notícias para além do florescer da natureza próprio da época, do arrulhar das aves e do desconfinamento quase total, após um tempo de estado de emergência que – não pondo em causa a sua necessidade premente – veio afetar sobremaneira o animal social que habita em praticamente todos os seres humanos. A boa notícia a que nos referimos é a da primeira edição em Português de um livro do autor britânico Robert Macfarlane.

“Mundo Subterrâneo: Uma Viagem pelas Profundezas do Tempo”, publicado pela Elsinore e traduzido por Eugénia Antunes, é o mais recente livro deste que é considerado atualmente como o melhor escritor sobre natureza – em particular, na sua vertente de literatura de viagem –, tema pouco comum entre nós, mas já com longa e profunda tradição nas terras além-Mancha.

Trata-se de prosa ficcional ou não, mas também poesia, em que o tema é o ambiente natural, englobando desde livros sobre história natural e conservação da natureza até ensaios literários de cariz mais filosófico sobre as questões ambientais e a relação dos seres humanos com os restantes animais e plantas. Em 1984, no “New York Times”, este novo género era descrito como uma espécie de apreciação estética a uma visão científica da natureza. “Walden”, de H. D. Thoreau, seria um dos primeiros exemplos.

Alguns dos livros escritos por Macfarlane são hoje praticamente considerados clássicos deste género. Entre eles, “Mountains of the Mind”, onde se debruça sobre o fascínio que as montanhas exercem sobre as pessoas, livro com o qual ganhou diversos prémios.

Por mais vasto que seja, o mundo que os nossos olhos veem é unicamente uma pequena parcela de tudo aquilo que existe no planeta. Debaixo de terra, das pedras e dos sedimentos milenares, encontra-se um universo subterrâneo, complexo e revelador, regendo-se por um ‘tempo profundo’ que ultrapassa os limites daquilo que conhecemos como passado.

Poético e preciso, narrativo e científico, “Mundo Subterrâneo” é uma viagem extraordinária pela nossa relação com a escuridão e por tudo o que repousa sob a superfície, tanto do mundo físico, como da mente.

Eis a sugestão de leitura desta semana da livraria Palavra de Viajante.