“Fiquei parada e lancei um olhar na direcção do barco, do letreiro, observei uma série de fotografias tão desbotadas que já só se distinguia algumas manchas de cor. Recordei-me do álbum que estivera a ver na tarde anterior, diante do quiosque do alfarrabista. O homem com a máquina de escrever. A mulher com o cesto de peixe. O passeio público quase deserto.”
Esta é uma daquelas obras onde o fio narrativo não redunda somente na construção de uma história e onde a qualidade da linguagem escrita produz um inegável e profundo prazer na leitura. “Rio” é um livro com um ritmo particular, que nasce da cadência dos passos de quem deambula sem destino, construído a partir de recordações casuais, que podem ser espoletadas por uma fotografia há muito esquecida numa caixa ou por uma conversa escutada ao acaso.
Carregado de pungência e filigrana poética, é uma ode à observação, ao efémero e à memória. Neste romance, que confirma a autora como uma das mais interessantes vozes da literatura germânica, a narradora relembra os rios que encontrou na sua vida – desde o Reno até um riacho em Telavive – ao longo de uma série de longas e solitárias caminhadas, desdobrando-se suavemente numa prosa hipnótica, precisa e límpida.
A prestigiada revista norte-americana “The New Yorker”, que classificou “Rio” como um livro magnífico, comparou o trabalho de Kinsky com o de outro grande escritor alemão, W. G. Sebald, referindo que, tal como com Sebald, “(…) Kinsky constrói o passado através de paisagens: para a mulher, um rio é um guião líquido das histórias.”
Esther Kinsky, que nasceu em 1956 nas margens do Reno, viveu em Londres durante doze anos. É autora de seis volumes de poesia, quatro romances e numerosos ensaios, sobre temas como poesia e tradução, entre outros, e ainda três livros infantis. Traduziu para alemão diversos autores como o poeta inglês John Clare, o galês Iain Sinclair ou o norte-americano Henry David Thoreau, e, diretamente do polaco, Joanna Bator e Magdalena Tulli.
Largamente premiado na Alemanha, “Rio” é o primeiro livro da autora a ser publicado em Portugal, e logo por uma editora recém-criada, no Porto, a Bazarov – talvez a mais corajosa dos últimos anos, não só pelo momento em que inicia a sua atividade, mas também pela escolha dos títulos que publica. Com menos de um ano de existência, a Bazarov é já detentora de um catálogo notável, dividido entre ficção (com capa negra) e ensaio (com capa branca), apresentando um design depurado que torna imediata a associação à editora.
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