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Livro: “Trieste”

Trieste é uma cidade literária que encontrou em Jan Morris a sua biógrafa ideal. Uma cidade imbuída de três culturas – eslava, latina e germânica – que lhe dá uma identidade única.
10 Julho 2021, 10h35

 

Jan Morris (na altura, ainda James) visitou Trieste pela primeira vez quando ainda servia no exército de Sua Majestade, no final da Segunda Guerra Mundial. Desde então, a cidade italiana tornou-se uma espécie de metáfora da sua vida, com as suas esperanças, desilusões, paixões e memórias; como afirmou, esta cidade é “uma descrição de mim própria”.

“Trieste” é o mais recente membro da coleção de literatura de viagens da Tinta da China, onde se encontram já vários livros da autora galesa, falecida em novembro de 2020, com a bonita idade de 94 anos. Nele encontramos uma série de reflexões sobre diversos assuntos – barcos, cidades, gatos, nacionalismo, bondade –, inspiradas pela presença desta cidade diferente, algo estranha quando comparada com a restante Itália (aliás, o título em inglês é algo como “Trieste e o significado de nenhures”).

Evocando a sua história moderna, desde o seu grande crescimento e fama sob os Habsburgos até ao período da Guerra Fria, quando os poderes mundiais de então não permitiram que se tornasse uma cidade livre (ou seja, autogovernada) sob os auspícios das Nações Unidas, Jan Morris apresenta-nos um livro que é um misto de história e literatura de viagens.

Como é habitual na autora, é um livro sobre um lugar e, sendo esse lugar Trieste, este é um livro particular, tal como a própria cidade, resultado da mistura de três culturas – eslava, latina e germânica – que marca a sua diferença, tornando-a única.

Situada entre o mar Adriático e a Eslovénia, a apenas duas horas de Veneza, esta cidade portuária compensa a quase ausência de monumentos (tendo como referência o habitual padrão italiano) com uma imensa lista de escritores que aqui nasceram ou por cá passaram: o irlandês James Joyce (1882-1941) – que chegou em 1904 para lecionar inglês na Berlitz School, tendo ficado durante dez anos; o triestino Italo Svevo (1861-1928) – amigo de Joyce e a quem deve, de certa forma, a sua fama, já que o irlandês o convenceu a continuar a escrever e conseguiu que “A Consciência de Zeno” fosse publicado em França, onde Svevo foi considerado o Proust italiano; e Umberto Saba (1883-1957) – poeta e livreiro triestino.

Também Rainer Maria Rilke (1875-1926) – que viveu uns meses no Castelo Duíno, nos arredores da cidade, onde começou a série de poemas que viriam a ser publicadas como “As Elegias de Duíno”; o catalão Josep Pla (1897-1981); Boris Pahor (1913) – triestino pertencente à minoria eslovena, hoje com 107 anos; Claudio Magris (1939) – autor do célebre “Danúbio” e grande frequentador do Caffè San Marco, um dos cinco históricos cafés literários de Trieste (junto com o Tommaseo, Urbanis, Degli Specchi e Stella Polare); ou a escritora triestina campeã de vendas Susanna Tamaro (1957).

Uma cidade literária que encontrou em Jan Morris a sua biógrafa ideal.

Eis a sugestão de leitura desta semana da livraria Palavra de Viajante.

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