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Livro Verde: “O teletrabalho não pode, em nenhum caso, ser de recurso obrigatório”, defende CCP

No seu parecer à versão em consulta pública do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, que termina esta terça-feira, a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal defende que o teletrabalho deve ser objeto de negociação coletiva e a sua regulação deve ser ponderada e não basear-se na realidade resultante da pandemia.
22 Junho 2021, 18h10

A Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP) defende que o teletrabalho não pode ser imposto, deve ser objeto de negociação coletiva e a sua regulação deve ser ponderada e não basear-se na realidade resultante da pandemia. No parecer à versão em consulta pública do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, a que o Jornal Económico teve acesso, a confederação liderada por João Vieira Lopes realça que “o teletrabalho não pode, em nenhum caso, ser de recurso obrigatório” e volta a defender que o subsídio de refeição não deve manter-se em teletrabalho.

“Sobre a versão em consulta pública do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho, a mesma não reflete uma evolução positiva, face à versão inicial, que vá ao encontro das preocupações já expressas pela CCP”, defende esta confederação no parecer ao texto do Livro Verde em discussão pública até esta terça-feira, 22 de junho, documento com reflexões sobre os desafios futuros do trabalho e que foi apresentado pelo Governo na Concertação Social no final de março, servirá de base para a regulamentação de matérias laborais, como o trabalho à distância e o teletrabalho ou o trabalho nas plataformas digitais.

Continuam, no entender desta Confederação, a manter-se, em domínios como o teletrabalho, ou o trabalho em plataformas digitais, “linhas de Reflexão que não podem merecer a nossa concordância”. Por outro lado, acrescenta, várias das linhas de reflexão contidas no documento em análise, não têm um nível de concretização necessária que permita uma adequada apreciação.

Sobre o trabalho à distância e teletrabalho, a CCP sinaliza a necessidade de aprofundar e melhorar a regulação do teletrabalho nas suas diferentes dimensões, “densificando” esta matéria na legislação

No parecer, a CCP dá conta de que, sem prejuízo das inúmeras vantagens, para trabalhadores e empregadores, que o teletrabalho comporta, “deve ter-se presente que o mesmo não pode ser encarado como um substituto do trabalho presencial prestado nos termos tradicionais”, recordando que há atividades – em que sobressai a maioria das de comércio tradicional de rua e muitos dos serviços de proximidade ou outros como os de limpeza – em que a realização presencial “é insubstituível”.

A Confederação liderada por João Vieira Lopes realça que “o teletrabalho não pode, em nenhum caso, ser de recurso obrigatório”. “Não deve confundir-se uma situação de exceção, como a que temos vivido fruto do surto de doença, com a realidade desejável. O que teve de fazer-se fruto das circunstâncias excecionais não pode transformar-se em regra”, defende, realçando que “admitir que o teletrabalho possa ser imposto ao empregador não é sequer uma base de discussão aceitável”.

Alertas para a regulação

A Confederação do Comércio defende também que deve ser promovida a incorporação e regulação específica do teletrabalho na negociação coletiva e nos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, de modo a estimular disposições negociadas e adequadas a cada empresa e sector.

Para a CCP,  o “aprofundamento da negociação coletiva de trabalho e do âmbito da sua regulação é sempre de saudar”. Mas alerta que “não é, porém, aceitável que se imponha o recurso individual ao teletrabalho, ainda que por via da contratação coletiva”.

A CCP, que foi o único parceiro social que a 28 de abril apresentou uma posição escrita sobre esta questão na reunião de concertação social, reafirma agora que “a densificação da regulação legal de um instituto já razoavelmente previsto no Código do Trabalho só é de empreender se comportar alguma vantagem na clarificação do regime”.

“Uma regulação legal muito pormenorizada, além de não favorecer a margem de atuação da contratação coletiva de trabalho, só confunde os destinatários”, frisa no seu parecer datado de 18 de junho.

Segundo a CCP, “não deve nunca empreender-se na regulação legal” em resposta a “uma realidade premente”, realçando que “a atual conjuntura de doença pandémica e a resposta à mesma aconselha que se dê tempo para uma regulação ponderada e meditada”.

A CCP considera ainda que a combinação entre trabalho presencial e trabalho à distância “pode perfeitamente desenvolver-se com o atual quadro de regulação laboral”. Sugere aqui “densificar, em particular, as possibilidades e modalidades de adoção de modelos híbridos que combinem trabalho presencial e trabalho à distância no quadro da relação de trabalho, numa ótica de equilíbrio na promoção das oportunidades e mitigação dos riscos do teletrabalho”. E alerta: “se o que se pretende é impor o teletrabalho em situações não excecionais como a que atravessamos, tal constitui um atentado à autonomia de gestão das empresas e dos seus recursos humanos pelos seus titulares”.

CCP quer pôr fim a subsídio de refeição

Já no que respeita aos custos que os trabalhadores em teletrabalho assumem, o Livro Verde prevê afastar o acréscimo de custos do teletrabalho para os trabalhadores, nomeadamente em matéria de instalação, manutenção e pagamento de despesas relativas aos instrumentos de trabalho utilizados.

Nesta matéria, a CCP volta a defender que “antes de imputar ao empregador empresário a generalidade dos custos do teletrabalho, é imprescindível delimitar o que são custos absolutamente inerentes ao facto de o trabalhador se encontrar em teletrabalho e os custos que sempre suportaria nas suas instalações (maxime em sua casa)”. Esta Confederação destaca aqui que “um exemplo flagrante é dado pela opção do legislador por considerar sempre devido ao trabalhador o subsídio de refeição a pagar pelo empregador, quando é manifesto que o trabalhador em teletrabalho não suporta acréscimo de custos com a sua alimentação”.

Para a confederação liderada por João Vieira Lopes, o texto do Livro Verde em discussão pública “é tudo menos claro” quanto ao que sejam os custos acrescidos para os trabalhadores em consequência da situação de teletrabalho. Para a CCP, há custos fixos que todo o cidadão suporta na sua residência ou outra instalação própria que, defende, “não são imputáveis, nem direta nem indiretamente, à circunstância de se encontrar em teletrabalho”.

A CCP defende que “antes de se atribuir a responsabilidade por despesas suportadas pelo trabalhador em teletrabalho nas suas instalações, é indispensável, em nome da verdade e da justiça, que se demarquem bem os vários custos”.

Por outro lado, acrescenta, uma eventual compensação por custos suportados pelo trabalhador terá de ter um tratamento fiscal adequado. “Deve, ainda, ter em conta a redução de despesas que esta situação comporta, sob pena de se introduzir uma flagrante injustiça entre trabalhadores em regime presencial e trabalhadores em teletrabalho”, explica.

As centrais sindicais têm defendido que as empresas devem compensar os trabalhadores pelo aumento dos custos, incluindo de consumíveis, por estarem a trabalhar em casa, o que não é bem visto pelas empresas.

O Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho foi apresentado pelo Governo aos parceiros sociais em 31 de março.

Segundo o documento que será a base para a regulamentação de novas formas de trabalho, as situações em que o trabalhador pode optar pelo teletrabalho, independentemente de acordo com o empregador, devem ser alargadas, e abranger a Administração Pública.

Os autores defendem que a legislação deve “alargar as situações em que o trabalhador tem direito a teletrabalho independentemente de acordo com o empregador, em modalidade de teletrabalho total ou parcial”, sendo que a medida deve ter em conta nomeadamente situações “no âmbito da promoção da conciliação entre trabalho e vida pessoal e familiar” e “em caso de trabalhador com deficiência ou incapacidade”.

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