Manuel Serrão era um dos ‘4 Kings’ que tinham como objetivo o desvio de fundos europeus para proveito próprio, segundo as suspeitas do Ministério Público (MP) na Operação Maestro.
Para isso, o empresário e três outros elementos (António Souza-Cardoso, Paulo Vaz e Paulo Nunes de Almeida) usaram uma teia de empresas geridas ou detidas por si para “captação em proveito próprio dos montantes disponibilizados pelos fundos europeus”, segundo o despacho de indiciação a que o JE teve acesso.
Reuniam-se presencialmente, pelo menos, uma vez por ano, com encontros no Sheraton no Porto (onde Manuel Serrão vivia), no restaurante Habitat – Terra e Fogo, também na invicta, ou em Madrid. Destes quatro, dois são arguidos, à exceção Paulo Vaz e de Paulo Nunes de Almeida, que morreu em 2019.
Nos encontros, discutem “as atividades dos Kings, a sua organização e reestruturação, as operações cofinanciadas a que cada uma das associações se candidata, as ações dessas operações que podem contribuir para o Fundo 4K, libertando valores monetários, quais os montantes que podem resultar para o mesmo, qual dos Kings procede à gestão, em determinado momento, do Fundo 4K e como são distribuídos os lucros pelos seus membros”, pode-se ler no documento.
“Fazem-no com vista a garantir a continuidade da obtenção de fundos comunitários para as associações que dirigem e, mediatamente, para as empresas que controlam, para o Fundo 4K e para os seus membros”. acrescenta.
O MP conclui: “Quiseram assim os arguidos obter, pelo menos, a quantia global de 39,3 milhões de euros, apesar de saberem que a mesma não lhes era devida e que agiam contra os interesses financeiros da União Europeia”.
Os arguidos eram “conhecedores das regras e procedimentos que presidiam à candidatura, atribuição, execução e pagamento de verbas atribuídas no âmbito de operações cofinanciadas por fundos europeus, decidiram captar, em proveito próprio, os fundos públicos assim atribuídos” à Selectiva Moda (detida por Manuel Serrão), à AGAVI – Associação Portuguesa para a Promoção da Gastronomia e Vinhos, à Associação Têxtil de Portugal (ATP) e à AEP – Associação Empresarial de Portugal.
O desvio dos fundos “deixou as autoridades impossibilitadas de utilizar tais recursos financeiros noutros projetos”, escrevem os Procuradores da República: David Aguilar, Celeste Pera e Joana César de Campos, que consideram que os arguidos “desconsideraram” os “interesses públicos”.
Mas não impediram outros projetos de terem acesso a fundos, como também obtiveram “benefícios económicos indevidos em sede de IRC e IVA à custa da defraudação do património do Estado português”.
“Mais quiseram os arguidos ocultar à Administração Fiscal, pelo menos, parte dos rendimentos por si auferidos e detidos na respetiva esfera económica de modo a não serem devidamente tributados em sede de IRS”, pode-se ler.
As faturas falsas foram cruciais neste esquema com os arguidos tendo a colaboração de terceiros, com quem mantinham relações comerciais, para elaborar “documentação fictícia com relevância fiscal que se traduziu na emissão de faturas a que não corresponderam serviços efetivos ou à sobrevalorização dos serviços prestados com o escopo de obter os cofinanciamentos públicos no contexto das operações cofinanciadas por fundos europeus”.
O MP detalha que para “melhor desfrutarem das vantagens económicas” deste esquema e para “dissiparem-nas na economia legítima”, os arguidos fizeram circular uma grande quantidade de dinheiro nas suas contas: Manuel Serrão movimentou 33,5 milhões de euros numa conta sua no BPI entre 2015 e 2024. Noutra conta do BPI, da mãe do empresário, mas a que este tinha autorização de acesso, foram movimentados 26 milhões de euros; noutra conta da mãe do empresário foram movimentados 1,4 milhões de euros; numa conta de António Branco Silva foram movimentados 12,7 milhões de euros.
Manuel Serrão indiciado de 16 crimes na Operação Maestro
Na Operação Maestro, Manuel Serrão é indiciado pelo MP de 16 crimes. Quinze deles em coautoria material com António Souza-Cardoso, que liderou a Associação de Jovens Empresários, e o cunhado António Branco Silva: 12 correspondem ao crime de fraude na obtenção de subsídio, um crime de associação criminosa, um crime de branqueamento de capitais e um crime de fraude fiscal. O MP indicia ainda o empresário portuense, em autoria material, na forma consumada e em concurso com os anteriores ilícitos, da prática do crime de recebimento indevido de vantagem.
Já a Associação Seletiva Moda, que entre 2015 e 2023 faturou mais de 90 milhões de euros, é responsável penalmente pela prática de 10 crimes de fraude na obtenção de subsídio, um crime de branqueamento de capitais e um crime de fraude fiscal.
A No Less, entidade fornecedoras da Seletiva Moda nas operações cofinanciadas sob investigação, é indiciada por 11 crimes de fraude na obtenção de subsídio, um crime de branqueamento de capitais e um crime de fraude fiscal. Entre 2015 e 2023, a No Less faturou, no total, 11,6 milhões de euros, dos quais 2,3milhões (19,97%) à Seletiva Moda.
A outra empresa arguida é a House of Project-Business Consulting (HOP), controlada por António Souza-Cardoso, que é responsável penalmente por nove crimes de fraude na obtenção de subsídio, um crime de branqueamento de capitais e um crime de fraude fiscal. Entre 2015 e 2022, a HOP faturou, no total, 8,4 milhões, dos quais 4,2 milhões (50,65%) à Seletiva Moda.
O “Correio da Manhã” revelou esta semana que a auditoria aos fundos europeus pagos à Selectiva Moda não encontrou rasto de 26 milhões de euros que deviam ter sido transferidos para mil PME, não existindo provas que o dinheiro tenha sido transferido.
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