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Mark Rutte: um ‘Flying Dutchman’ à frente da NATO

Não será propriamente um fantasma, mas o neerlandês vai ter de lidar com o fantasma do regresso da guerra ao continente europeu.
Mark Rutte
26 Junho 2024, 15h13

Em plena campanha eleitoral nos Países Baixos, algures no passado mês de novembro, Mark Rutte, na altura ainda primeiro-ministro – que já saberia que não iria ser eleito pela simples razão de não concorrer – aparece sisudo ao lado do seu homólogo israelita Benjamin Netanyahu. Era a prova de que os analistas precisavam: Rutte estava ativamente empenhado em conseguir o lugar de secretário-geral da NATO, em substituição do norueguês Jens Stoltenberg – que, dizem os meios que se dizem normalmente bem informados, estava à época interessado em dirigir o banco central do seu país.

Rutte, um desses políticos frugais que tenta fugir ao ‘diz que disse’ tão particular das bandalheiras dos países do sul, nunca chegou a negar o seu interesse. Mas negou que não ter negado não foi uma decisão acertada: afirmou entretanto que “foi um erro” infantil ter sinalizado a sua vontade. É que as simulações e os enredos alternativos em que os países do sul são especialistas contaminou o debate político europeu – o que fez com que todos os restantes candidatos passassem a conhecer pelo menos um dos alvos a abater. “Depois de anos como político, ainda se cometem erros. E o meu erro foi que ter falado sobre uma possível mudança para secretário-geral da NATO, e não tenho certeza absoluta se isso iria acontecer. O que eu disse era obviamente o que eu queria dizer, mas não deveria tê-lo dito”, afirmou algures em Berlin numa altura em que a sua eleição ainda estava por fechar.

Para além de um eventual erro de sinceridade, é possível que Rutte, dizem os analistas, também não tenha a nacionalidade certa. Neste tempo de guerra com a Rússia, a NATO parecia estar mais inclinada para optar por um político que tenha razões adicionais para ser um guerreiro. Ou, dito de outra forma: à aliança parecia ter chegado o tempo para ser comandada por um político oriundo de um dos estados bálticos, Estónia, Letónia ou Lituânia, que estão logo atrás da linha da frente da guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Qualquer político vindo daí teria todas as razões do mundo para ser radicalmente a favor de qualquer endurecimento da resposta da NATO ao conflito.

Por outro lado, dizem outros analistas, Mark Rutte podia ter a nacionalidade certa. É que, afirmam, colocar um ‘báltico’ à frente da aliança é, para todos os efeitos, ‘espicaçar’ ainda mais o sentimento anti-europeu de Moscovo – o que podia ser erro grave a prazo, numa altura em que o ocidente em geral e os Estados Unidos em particular começam a fazer contas ao custo exorbitante da guerra. Um secretário-geral oriundo dos países bálticos poderia ser levado a insistir no apoio; ao contrário, um ‘frugal’ pode compreender melhor qualquer ‘downsising’ a que seja necessário proceder em termos de financiamento. Até porque, vale a pena recordar, os Países Baixos enquanto liderados por Mark Rutte nunca chegaram a atingir os 2% do PIB em investimentos na área da defesa.

A lista dos potenciais próximos secretários-gerais incluía a primeira-ministra da Estónia, Kaja Kallas (entretanto escolhida para Alta Representante da EU para as Relações com o Exterior), e a ministra dos Negócios Estrangeiros da Letónia, Krisjānis Kariņs.

Rutte acabou por ter uma campanha com poucos solavancos, sempre ‘levado ao colo’ pelo norueguês que irá substituir – e nem o episódio da Hungria, mais um, teve força suficiente para retirar o neerlandês do lugar que tanto quere há mais de meio ano. O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, ainda disse que não iria apoiar Mark Rutte – mas, como o resto dos europeus já perceberam, o problema não era suficientemente difícil para não se resolver com um cheque.

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