Um corte das taxas de juro na zona euro no primeiro semestre do próximo ano é esperada pelo mercado, mas a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, não quer baixar a guarda e procura refrear as expectativas.
Depois de 10 subidas consecutivas das taxas de juro diretoras, o banco central manteve inalterada o custo dos empréstimos nas duas últimas reuniões, o que somando à redução da inflação e aos dados de crescimento levam os mercados a esperar que 2024 traga um corte.
No entanto, a presidente do BCE não quer declarar ainda vitória no controlo da inflação, tendo defendido hoje que os decisores não devem ficar complacentes após a recente queda no ritmo do aumento dos preços e afastou qualquer discussão no Conselho de Governadores de uma descida nas taxas.
“O topo das taxas de juro está visto. Aliás basta observar as Euribor para perceber isso mesmo, com a referência a 12 meses a ser a mais baixa já há algumas semanas”, assinala o presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros, Filipe Garcia, em declarações à Lusa.
O economista recorda que o facto de Isabel Schnabel, um dos membros mais conservadores do BCE, “ter, há poucos dias, “capitulado” ao reconhecer a evolução positiva da inflação” mostra que “a opinião do BCE já está a mudar”.
“Na conferência de imprensa de Lagarde, percebeu-se isso mesmo, de que o BCE não quer dar o braço a torcer, mudando o discurso mais devagar”, considera.
Filipe Garcia explica que o mercado desconta cortes de cerca de 150 pontos em 2024, com o primeiro a ocorrer em março ou abril, ou seja, seis ou sete meses desde a última subida.
“No entanto, creio que os bancos centrais em geral, incluindo o BCE, serão algo renitentes em baixar tanto e tão depressa quanto as previsões dos mercados pois quererão ver os efeitos quer das subidas que foram efetuadas, quer dos primeiros cortes e terão receio de uma segunda vaga inflacionista”, prevê.
Depois do ritmo de subida das taxas de juro mais rápida da história da zona euro, o economista sénior do Banco Carregosa Paulo Rosa, em declarações à Lusa, destaca que o mercado monetário antecipa cinco descidas de 25 pontos base cada até à reunião de 27 de outubro do próximo ano, “sendo de 65% a probabilidade de o primeiro corte de 25 pontos base acontecer já na segunda reunião do ano, a 07 de março de 2024, dando início a um novo ciclo de baixa das taxas de juro”.
A trajetória descendente da inflação tem sustentado a convicção do mercado e o BCE reviu hoje em baixa as previsões do Índice Harmonizado de Preços no Consumidor (IHPC) para 5,4% em 2023 e 2,7% em 2024, quando em setembro apontava para uma taxa de 5,6% em 2023 e de 3,2% em 2024.
O BCE prevê ainda um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de, em média, 0,6% em 2023 para 0,8% em 2024 e 1,5% em 2025 e 2026.
O diretor executivo da ActivTrades Europe, Ricardo Evangelista, em declarações à Lusa, salienta que os responsáveis do BCE “têm insistido num discurso mais ‘hawkish’ (restritivo), não assumindo que o próximo movimento será um corte”.
“No entanto, é isto precisamente que os mercados financeiros têm vindo a descontar, numa dinâmica que se reflete no enfraquecimento do euro face a outras das principais divisas como o dólar e a libra”, refere.
Para o analista, o primeiro corte deverá ocorrer durante o segundo trimestre do próximo ano e ser de 25 pontos base.
“Para além deste horizonte, será difícil prever outros desenvolvimentos, dependendo dos dados que forem divulgados, sobretudo da inflação, do crescimento da economia, e do emprego e salários”, elenca.
Por outro lado, o analista da XTB Henrique Tomé, em declarações à Lusa, considera que a trajetória dos juros continuará a depender muito da evolução dos indicadores económicos, apontando que a taxa de inflação subjacente, que exclui as categorias mais voláteis como a alimentação e a energia, “continua muito acima do desejado”.
“Se a inflação continuar a dar sinais de abrandamento, acreditamos que não haja espaço para novos aumentos dos juros, uma vez que a atividade económica na Europa, sobretudo na Alemanha, está bastante fragilizada. Não obstante, falar-se de descidas dos juros no próximo ano, parece pouco provável, embora, mais uma vez, dependa da evolução dos indicadores económicos”, prevê.
A posição de Lagarde contrasta com a do presidente da Reserva Federal norte-americana, Jerome Powell, que sinalizou na quarta-feira que o corte das taxas de juro é um tema de reflexão.
“Lagarde tentou afastar a ideia de cortes no curto prazo. Não foi tão explícita quanto Powell ontem [quarta-feira] em relação a cortes em 2024, mas percebe-se mal o motivo para tal porque a situação económica na zona euro é pior e a inflação mais baixa”, refere.
A taxa de juro do BCE aplicável às operações principais de refinanciamento e as taxas de juro aplicáveis à facilidade permanente de cedência de liquidez e à facilidade permanente de depósito situam-se em 4,50%, 4,75% e 4,00%, respetivamente.
Depois de anos de taxas em mínimos históricos, o BCE subiu pela primeira vez em 11 anos os juros em julho de 2022, num total de 450 pontos base até ao último aumento em setembro.
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