Certamente que poucos são os que ainda se lembram de Carlos Carvalhas e muito menos ainda que foi ele quem após a Revolução de Abril apontou esta brutalidade: em cada 100 Escudos o Estado Novo gastava 60 na Guerra Colonial. Mais de metade do Orçamento ia para alimentar um conflito que o curso da História há muito havia determinado não só impossível de vencer, como também ser moralmente indefensável.
A pergunta que se tem que fazer é esta: como conseguiam então viver os portugueses, como equilibrava o país as suas contas?! Não era certamente com os recursos das Colónias. A máxima salazarista de 1961 «para Angola, rapidamente e em força» limitou-se ao esforço militar porque, na verdade, a nossa soberania continuava a ser o que dela diziam os ingleses aquando do mapa cor-de-rosa, velhas e abandonadas fortalezas.
E muito menos foram os pequenos pinotes de crescimento económico e social que Portugal lá foi conseguindo com o Corporativismo do Fascismo. Em 1974, digam o que disserem, continuávamos a ser um país ainda em muito quase medieval, que sobrevivia, como durante todo o século XIX, com recurso às generosas remessas dos emigrantes. E assim continuou até 1986, data da entrada na “Europa”.
O dinheiro daqueles que tiveram de abandonar a sua terra e passar por tudo e mais alguma coisa para tentar viver com o mínimo de dignidade, muito mais do que alcançar a fortuna, era o que mantinha o país vivo e a aguentar-se. O dinheiro do suor incansável dos que foram para o Brasil, Venezuela, África do Sul, França, para falar dos países que mais emigrantes portugueses receberam, equilibrava os gastos do Estado como ajudava as famílias que tinham ficado para trás e continuam, inexoravelmente, na mesma miséria de sempre.
Na Madeira, uma das zonas do país, em que mais gente emigrava, esta realidade era notória. Penso que não há um madeirense ou porto-santense que não tenham família emigrada. E penso que ninguém pode negar quão importantes foram para a agora tão falada economia local. Os “cabeiros” (África do Sul) e os “miras” quando vinham de visita traziam de tudo, desde dinheiro, a roupas, e gastavam como se o mundo fosse acabar no dia seguinte. E quando regressavam de vez investiam, comprando e construindo casas, montando pequenos negócios. Além do mais, sejamos honestos, que todos passamos por isso, pelo menos os que têm de 45 para cima, as filhas animavam a malta nos arraiais e não só…
Mas o que me interessa mesmo aqui escrever é a minha incompreensão pela “xenofobia” que vou vendo e ouvindo com o regresso de ex-emigrantes e dos seus filhos à Madeira e Porto Santo, quase como se fossem perigosos talibãs ou vikings, que vêm destruir e roubar o que temos, como se não fosse o nosso dever acolher o sangue do nosso sangue e, sobretudo, quem tanto, no passado, nos ajudou.
Ainda para mais, estamos com uma sociedade envelhecida e com um grande deficit de Natalidade, em que, ainda por cima, os mais novos se aburguesaram e estupidificaram e a muitos lhes falta o que Michelle Mafesoli (quem não sabe a quem me refiro que procure, leia e aprenda qualquer coisa, que ainda vai muito a tempo), definiu como pulsão de viver e fazer.
Muito honestamente, vejo estes regressos não como um problema mas oportunidade. Obviamente que tem os seus custos, mas creio que estamos mais bem preparados do que estávamos em 74 para o regresso dos “Retornados” e que, no final, sairemos, todos e a todos os níveis a ganhar nem que seja preciso fazer o que tanto diziam os “miras” e que tanto gozávamos: mira, se não roda, vai de arrasto!
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