Moçambique vai criar um fundo soberano para gerir as receitas futuras do gás natural.
O estado moçambicano vai canalizar 40% das receitas totais de petróleo e de gás para este fundo nos primeiros 15 anos, para depois começar a alocar 50% das receitas, revela hoje a “Bloomberg”, que teve acesso ao projeto-lei.
Numa versão anterior, de 2020, deste fundo, o objetivo era dividir as receitas em partes iguais pelo governo moçambicano e pelo fundo nos primeiros 20 anos em funcionamento. Depois, esta fatia iria subir para os 80%.
O projeto-lei vai ser submetido ao parlamento moçambicano no final deste ano, segundo o ministério das Finanças.
O maior fundo soberano do mundo é o da Noruega – Norges Bank – que gere mais de um bilião de dólares de ativos e detém o equivalente a 1,5% de todas as cotadas no mundo. Este fundo gere as receitas obtidas com a exploração de petróleo da Noruega, sendo tutelado pelo governo e o parlamento norueguês. Em 2019, este fundo renunciou aos investimentos no sector petrolífero.
Como vai funcionar o fundo soberano de Moçambique?
O fundo vai ficar proibido de fazer investimentos em petróleo e em gás natural; se as receitas anuais ficarem abaixo do estimado, o Estado vai ter de entrar com o restante dinheiro; o banco central vai gerir o fundo através de uma unidade autónoma e pode contratar gestores externos; o Banco de Moçambique vai ganhar uma comissão de gestão que não pode exceder os 0,1% do capital do fundo e deve ser aprovada pelo ministro das Finanças; o ministério das Finanças deve nomear auditores independentes para inspecionar as contas do fundo.
As receitas vão começar a entrar nos cofres públicos moçambicanos só a partir de 2024.
O país lusófono tem vários projetos com o objetivo de passar a exportar gás natural. Moçambique é um dos países com as maiores reservas mundiais de petróleo. O país tem as terceiras maiores reservas provadas de gás natural de África somente atrás da Argélia e da Nigéria, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE).
Vários projetos no norte de Moçambique estão suspensos devido aos ataques do Estado Islâmico.
Moçambique pode vir a encaixar 96 mil milhões de dólares (98,2 mil milhões de euros) nas próximas décadas em receitas obtidas com a exploração de gás natural dos projetos da TotalEnergies e da ExxonMobil.
Já o projeto da italiana Eni, mais pequeno, deverá entrar em produção nas próximas semanas.
A Galp tem uma participação de 10% na promissora Área 4 na bacia de Rovuma, no norte do país, cujos operadores são os norte-americanos da ExxonMobil, os italianos da Eni e os chineses da CNPC. Mas este projeto tem conhecido vários atrasos devido à pandemia da Covid-19, o financiamento e o sataques de grupos terroristas islâmicos. Segundo uma análise divulgada recentemente pela consultora Rystad Energy, neste momento, a Exxonmobil está a finalizar o projeto antes de submeter o plano de desenvolvimento às autoridades moçambicanas.
“Sines tem potencial para ligação especial com gás natural de Moçambique”
O ministro português da Economia considera que a ambição moçambicana no gás natural pode vir a ser positiva para Sines e Portugal.
“Penso que o projeto de Moçambique é absolutamente decisivo e tem condições para avançar. Isto significa atenuar a dependência que temos da Rússia e haver um reequilíbrio no fornecimento de gás natural”, disse António Costa Silva ao JE no início de setembro, por ocasião da visita do primeiro-ministro ao país lusófono.
“A meu ver, Portugal tem alguma experiência nessa área e no mercado de GNL [gás natural liquefeito, em estado líquido para ser transportado mais facilmente] e pode cooperar com Moçambique para diversificar as fontes de abastecimento para toda a bacia atlântica. Moçambique está a olhar muito para a Índia, China e Pacífico, que são grandes consumidores, mas quando temos a ExxonMobil e a Total como operadores, muito provavelmente parte das cargas vem para o Atlântico”, afirma o ministro que também é um especialista na área da energia, fruto da sua carreira de décadas na indústria petrolífera como presidente da Partex.
António Costa Silva considera que o gás moçambicano pode ser importante para tornar Sines num porto dedicado ao transbordo de gás natural: os grandes navios metaneiros vindos dos países produtores em todo o mundo descarregam em Sines; o gás é então transferido para navios mais pequenos que seguem depois para os países do norte da Europa, mais dependentes de gás russo e cujos portos já estão congestionados com grandes navios.
“Se conseguirmos estabelecer em Sines um pólo importante para abastecer a Europa, provavelmente essas ligações fazem todo o sentido e reforçariam o potencial de Sines com ligação especial a Moçambique”, defende.
O ministro da Economia considera que o gás moçambicano “seria absolutamente fulcral para Portugal”, se Portugal conseguir “por Sines na Europa”. “Estamos a fazer todos os esforços para isso. Agora, a questão é fazer funcionar a componente comercial. Já estamos em contacto com os importadores alemães, polacos e dos países Bálticos; se se propiciar, coloca Sines no mapa”.
Conforme explica ao JE, “há um padrão do funcionamento dos navios metaneiros: se forem todos ao mesmo tempo para o norte da Europa não vai funcionar porque os portos já estão congestionados. A UE importa da Rússia 55 mil milhões de metros cúbicos de gás por ano, isso significa cerca de 1.400 a 1.500 navios que de repente terão de ir para o norte da Europa”.
“Sines com a história do transbordo pode contribuir para a estabilização das rotas mundiais e depois fazer essas ligações para todo o lado. Muitos desses importadores já perceberam isso e vamos ver no que resulta. Temos de lutar para pôr isso no terreno”, sublinha.
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