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Moody’s: Já nem o investimento é um entrave à subida do ‘rating’

Confiante na economia, redução da dívida e estabilidade política, a Moody’s poderá usar a retoma do investimento para justificar uma melhoria na notação. Em abril, Portugal deverá completar a saída do lixo.
  • Cristina Bernardo
11 Fevereiro 2018, 18h37

O investimento era a peça que faltava no puzzle da recuperação económica de Portugal. Após avanços e recuos, a agência de notação financeira Moody’s está, pela primeira vez desde a crise, confiante que a tendência de crescimento do investimento é sustentável e pode dar o empurrão que faltava para o rating do país sair do ‘lixo’.

“Vimos a economia entrar numa fase de recuperação, mas é muito importante para nós o investimento, que era o aspeto que faltava numa fase inicial e está a começar a contribuir para a recuperação”, explicou Evan Wohlmann, vice-presidente e analista sénior de dívida soberana da Moody’s, em entrevista ao Jornal Económico, à margem do encontro anual da agência, em Lisboa.

O investimento já tinha aumentado em 2015, mas o ano seguinte – marcado pela incerteza – assistiu a uma queda, que fez a agência duvidar. Em 2017, houve nova retoma e desta vez as condições são diferentes. Segundo Wohlmann, condições de financiamento mais favoráveis, abrangência do investimento a setores como maquinaria e equipamento além da clássica construção, grandes projetos de infraestruturas e energia, bem como a capacidade de absorção de um pacote de financiamento europeu, na ordem dos 2% do PIB por ano, são os principais impulsionadores para que a tendência se mantenha.

“Desta vez estamos mais confiantes que o investimento não vai cair novamente”, disse o analista. “É muito importante porque vemos os condutores do crescimento a alargarem-se, o que tem impacto na resiliência da trajetória futura de crescimento”.

Para este ano, a Moody’s aponta para uma desaceleração do investimento, por efeitos de base (“houve uma aceleração significativa porque 2016 tinha sido muito fraco”, explica). No entanto, continuará a contribuir positivamente para o crescimento, sobre o qual a agência está confiante.

“Temos um outlook positivo sobre a economia portuguesa, com base numa série de melhorias económicas e orçamentais, como se viu em setembro”, disse Wohlmann, referindo-se à última revisão do rating da República. Na altura, a Moody’s passou a perspetiva para positiva, de estável, mas manteve rating no nível Ba1, ou seja, em grau especulativo. Em abril há uma nova avaliação e a expetativa é que a Moody’s dê finalmente o passo seguinte e coloque Portugal em grau de investimento, seguindo as pisadas das outras duas maiores agências de notação financeira, Fitch e Standard and Poor’s.

A ajudar à ideia que Portugal irá sair do ‘lixo’ está a posição otimista da Moody’s sobre a política orçamental nacional, que “excedeu as expetativas, particularmente em 2016” e conseguiu tirar o país do Procedimento por Défice Excessivo. Até o elevado endividamento público – aspeto apontado por todas as agências de rating como o principal problema do país – poderá não ser um entrave ao upgrade.

“Observamos melhorias na estrutura do perfil da dívida, que reduz os juros pagos pelo governo através da extensão da maturidade da dívida, mas também através da redução dos custos com essa mesma dívida”, aponta o vice-presidente da Moody’s, notando que a maturidade média da dívida portuguesa passou para oito anos, de cerca de seis anos, em 2012.

A agência voltou a elogiar os reembolsos antecipados ao Fundo Monetário Internacional (FMI), uma estratégia com a qual o Governo conseguiu pagar 83% da dívida ao fundo, incluindo a tranche mais caro do empréstimo de 26,3 mil milhões de euros. Este ano, a Moody’s considera que Portugal irá cortar o rácio da dívida face ao PIB em seis pontos percentuais face aos valores de 2016. Ou seja, para 124%, contra 130%.

“O que procuramos para fazermos o upgrade do rating é a confirmação de que estas melhorias económicas e orçamentais são sustentáveis”, acrescentou, concretizando que está a olhar para um horizonte entre três e cinco anos.

Incerteza italiana

Portugal não beneficiou apenas de políticas internas, mas em grande parte do contexto externo. A Moody’s nota que o programa de compra de ativos da zona euro implementado pelo Banco Central Europeu (BCE) durante a crise teve um papel preponderante na diminuição dos custos associados à dívida portuguesa. Portugal foi, segundo a agência, o segundo país mais beneficiado em termos de descida dos juros das obrigações benchmark, que poderiam estar 140 pontos base acima dos atuais 2%, não fosse o apoio monetário.

O crescimento económico global, em especial da zona euro, foi também um fator impulsionador e deverá continuar a ser. “Vemos a retoma da economia a continuar, com um crescimento estável. Até os países mais atrasados estão a acelerar”, afirmou Wohlmann, apontando para um crescimento do PIB da zona euro de 2%, em 2018, com a performance de Portugal a ficar “ligeiramente abaixo” desse valor.

No entanto, há riscos para a região, a começar por fatores políticos. As eleições em Itália são o maior fator de incerteza, dada a possibilidade de um parlamento sem maioria, mas não o único. A agência está a olhar para as negociações do Brexit, cujo impacto no crescimento da União Europeia espera que se intensifique, enquanto a tensão política em Espanha devido à Catalunha continua elevada. Os desenvolvimentos recentes para a formação de governo na Alemanha parecem estar a afastar a incerteza, mas a Moody’s vai esperar antes de dar o impasse como terminado.

Em Portugal, Wohlmann garante que não é a composição do Parlamento que importa, mas as políticas que implementa. “O que temos visto em termos de políticas desde o final de 2015, quando o Governo foi formado, é um compromisso em manter um orçamento relativamente prudente, apesar das pressões para aumentar a despesas em áreas como os salários ou as pensões. Isso apoia a nossa posição de um outlook positivo sobre a prudência orçamental no futuro. Em termos de riscos, penso que teríamos de ver mudanças substanciais na abordagem à política orçamental, dado o elevado endividamento do Governo, em particular o fim do compromisso de manter um orçamento prudente e a consolidação orçamental com um défice abaixo de 3% do PIB, para que fosse negativo para o rating”, disse.

Se em termos políticos o risco de Portugal é reduzido em comparação com outros países europeus, o mesmo não se pode dizer sobre o problema estrutural do envelhecimento da população.

“Mais de 60% dos países avaliados pela Moody’s estão a envelhecer e os países da UE são os que enfrentam maiores problemas estruturais”, explicou. A previsão da agência é que Portugal seja um dos países mais envelhecidos do bloco, com a população com mais de 65 anos a atingir os 23%, em 2020, os 27%, em 2030 e os 36% em 2050.

Para já, é apenas um alerta sobre a tendência, mas a agência tinha já referido que vai começar a dar mais importância às pressões do envelhecimento populacional nas avaliações de crédito. O impacto de gastos com pensões e saúde nos orçamentos dos países europeu vai ser uma das questões que poderá condicionar o futuro.

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