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“Não estamos a considerar qualquer aumento de capital em nenhum dos cenários”, diz Miguel Maya

“O BCP presta contas aos seus acionistas, e por isso olhamos com rigor para essas avaliações e questionamos os seus pressupostos”, disse o CEO do Millennium quando questionado sobre a existência de grandes diferenças no valor dos fundos de reestruturação da ECS no book value do BCP face aos outros bancos (novobanco e CGD).
  • Miguel Maya
    Miguel A. Lopes/Lusa
28 Outubro 2021, 08h10

“Não estamos a considerar qualquer aumento de capital em nenhum dos cenários que prevemos para a evolução do Banco Comercial Português”, disse o presidente executivo do Millennium BCP na conferência de imprensa de apresentação dos resultados do terceiro trimestre. Também não anteveem vender ativos, garantiu o banqueiro.

“Houve geração orgânica de capital e não temos nenhuma intenção de fazer um aumento de capital”, disse o presidente executivo que frisou que o “BCP tem muita disciplina na gestão do capital”.

Miguel Maya foi questionado sobre o valor em balanço dos ativos dos fundos de reestruturação e da grande diferença que existe entre o valor contabilístico desses ativos no BCP e nos outros bancos concorrentes, nomeadamente no novobanco e na CGD. Essa diferença de valorização dos fundos de reestruturação originou, por exemplo, que sete ativos dos fundos geridos pela ECS Capital, atualmente em processo de venda, tivessem sido retirados do portfólio.

O CEO do BCP explicou que as avaliações dos ativos dos fundos “são feitas por auditores independentes das sociedades gestoras” e “nós não temos nenhuma interferência nas sociedades gestoras”.

“Houve alguns bancos que foram objeto de recapitalização pública, e que tinham os incentivos para poderem ir além da avaliação da sociedade gestora. Podiam stressar mais porque podiam pedir dinheiro aos contribuintes portugueses e não tinham um custo por isso. Naturalmente se puserem o ativo a zero, nos anos seguintes podem registar enormes mais-valias. O BCP presta contas aos seus acionistas, olhamos com rigor para essas avaliações e questionamos os pressupostos dessas avaliações”, disse o CEO do banco.

“O BCP venderá ou não [os fundos da ECS] se considerar que o valor oferecido é consistente, porque nós não fazemos vendas em saldos, porque temos de respeitar o dinheiro dos nossos acionistas. Se for uma operação que destrói capital e se considerarmos que o valor dos ativos é superior ao montante da oferta, não vendemos”, disse Miguel Maya lembrando que já houve ativos stressados “que recusámos vender (em pacote) e depois vendemos por um valor superior”.

As participações em fundos de reestruturação empresarial no BCP somavam um valor de 789 milhões de euros em setembro de 2021 o que compara com 850 milhões em setembro do ano passado, segundo a apresentação de contas. Portanto houve uma redução de -7,2%. “O saldo em fundos de reestruturação empresarial desceu 7,2% para 789 milhões em setembro de 2021. O crédito inicial nestes fundos totaliza 2.006 milhões, pelo que as imparidades totais (no crédito inicial e nos fundos) correspondem a uma cobertura de 61%”, diz o BCP.

Sobre o capital, o BCP reportou um rácio total pro-forma de 15,3% (fully implemented) em setembro de 2021, acima dos requisitos SREP (Supervisory Review and Evaluation Process). Um buffer de 2pp entre o rácio de capital total pro-forma e os requisitos SREP, não considerando a utilização das reservas de conservação e O-SII (reserva para outras instituições de importância sistémica que é um dos instrumentos macroprudenciais de que o Banco de Portugal dispõe para mitigar a acumulação de riscos sistémicos); e um buffer de 5,1 pontos percentuais considerando a utilização das reservas de conservação e O-SII.

O BCP revelou um rácio de capital CET1 pro-forma de 12% (fully implemented) em setembro e um buffer de 0,9 mil milhões acima do nível em que existem restrições ao montante máximo distribuível de resultados (MDA), de acordo com a regulamentação bancária, diz o banco na apresentação de resultados.

Sobre o banco na Polónia, questionado sobre se o facto de o Millennium Bank consumir toda a rentabilidade em provisões para litigância por causa dos créditos concedidos em francos suíços até 2008, não faz dele mais uma liability do que um ativo, Miguel Maya disse que “não há soluções simples para o caso da Polónia”.

“Em 2008 deixámos de conceder crédito à habitação em francos suíços. Até 2018 não houve nenhum problema porque todos os processos em tribunal foram ganhos genericamente pelo Millennium Bank. Mas em 2018 houve uma alteração que se repercutiu na forma como o poder judicial polaco se passou a posicionar perante a atividade económica, e de repente passámos a perder todos os processos em Tribunal, mas sem que nos seja dito quais são as consequências para o banco”, disse o presidente do Millennium BCP.

Recorde-se que nesta altura ocorre uma decisão histórica do Tribunal Constitucional da Polónia que provoca o risco de saída do país do bloco europeu.

“Temos de gerir o franchising do banco e a atividade do Millennium Bank de forma muito prudente, que é o que a nossa equipe local tem feito”, disse Miguel Maya.

“Não sabemos quando é que o problema está acabado. É um tema de grande complexidade”, disse ainda.

Miguel Bragança, CFO do BCP, explicou por sua vez, que o Millennium Bank na Polónia é cotado e “apesar das provisões constituídas, a cotação do banco reagiu muito bem, o mercado e os investidores percebem que o que está por detrás é uma situação de legacy e conseguem ver para além disto, de ver a capacidade do banco de gerar valor. Isto é um problema fechado no tempo que terá obviamente ainda impactos futuros”.

“Em 2008 a carteira de crédito hipotecário em francos suíços representava cerca de 55% e hoje é de 12,6%. Isto mostra que a situação tem vindo a ser gerida e digerida”, disse Miguel Bragança.

Sobre a venda de carteiras de malparado, numa altura em que o BCP tem no mercado a carteira Lúcia de 63 milhões de euros de crédito vencido (NPL) e 47 milhões de imóveis recebidos em dação, Miguel Maya não foi muito explícito, limitando-se a dizer que é uma atividade recorrente dos bancos.

“A venda de carteiras NPE foi de 238 milhões, os foreclosed assets (dações em cumprimento de crédito) foram de 138 milhões. Portanto, não é o último portfólio que vamos vender, porque vamos continuar a produzir crédito non-performing uma vez que é impossível ter risco zero nas operações. Nós, no nosso plano, queremos atingir os 50 bp de custo do risco e por isso vamos continuar a colocar carteiras em mercado”, disse o CEO do BCP.

Na apresentação sobre o detalhe da evolução dos NPE (Non-performing exposures) verifica-se que em 2021 até ao fim de setembro o BCP vendeu 238 milhões de euros em malparado.

Depois fez write-offs de crédito vencido no montante de 208 milhões de euros e acabou com um saldo final de NPE de 1.931 milhões de euros.

Os NPE (ativos improdutivos) em Portugal totalizam 1,9 mil milhões no final de setembro de 2021, descendo 0,8 mil milhões face a setembro de 2020 e 0,4 mil milhões desde o final de 2020. A redução face a setembro de 2020 resulta de entradas líquidas de 0,01 mil milhões, de 0,2 mil milhões de write-offs e de vendas de 0,6 mil milhões.

O decréscimo de NPE face a setembro de 2020 é atribuível a reduções de 0,5 mil milhões dos NPL a mais de 90 dias e de 0,3 mil milhões dos outros NPE, refere a apresentação do banco.

O banco destaca o reforço de cobertura de NPE por imparidades que passou de 61% para 69% num ano.

O rácio de NPE sobre o total da carteira de crédito ficou abaixo dos 5% em setembro, em 4,9%.

 

Moratórias não preocupam tanto Miguel Maya como o impacto do custo da energia no processo produtivo

“As moratórias não são nenhuma bomba relógio. Não estamos, face ao diagnóstico temos à data de hoje, preocupados com a evolução do crédito vencido resultante das moratórias que foram concedidas. Preocupa-nos cada caso concreto, mas não vamos empurrar com barriga as situações”.

“Estamos mais preocupados com aquilo que podem ser os efeitos em algumas empresas dos aumentos dos combustíveis, dos custos da energia e dos problemas nas cadeia de valor. São problema que não têm a ver com a pandemia diretamente, mas têm a ver com perturbações que foram causadas”, disse Miguel Maya esta quarta-feira na conferência de apresentação dos resultados trimestrais.

“Estamos obviamente atentos. Estar preocupado não quer dizer que haja um problema, quer dizer que carece de especial atenção”, frisou o banqueiro.

“Não estamos a analisar nenhuma aquisição de bancos, nem estamos a competir com o Novo Banco em nenhuma operação em que o banco [liderado por António Ramalho] possa estar interessado”, disse o CEO do BCP.

Questionado sobre a utilidade da Linha Retomar – a linha do Governo de apoio à recuperação económica – Miguel Maya disse que “não ficámos à espera da solução do Governo, temos um acordo com o FEI e temos soluções próprias e iremos utilizar para cada caso as soluções mais adequadas e naturalmente também disponibilizaremos a solução encontrada pelo Governo”, disse o responsável pelo Millennium BCP.

No entanto o CEO do BCP aproveitou para revelar que, depois de falar com o Ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, percebeu que o leasing está incluído no programa Retomar. Trata-se de uma linha com garantia do Estado a 25% (que tem a dimensão de mil milhões de euros) e que é destinada às operações de crédito em moratória de empresas viáveis, que desenvolvem atividade nos setores mais afetados pela pandemia de Covid-19.

Esta medida de apoio é feita através de três mecanismos:  reestruturação da totalidade dos empréstimos com moratória, com aumento da maturidade das operações e período de carência; refinanciamento parcial da totalidade das operações de crédito com moratória; e empréstimo adicional  para fazer face a necessidades de liquidez.

 

Não haverá dividendos relativos a 2020

Os acionistas do BCP vão ter de continuar à espera de dividendos, “porque com a incerteza agravada pela crise das matérias-primas e também o tema da Polónia”, a administração do banco “não tem intenção de propor ao Conselho e posteriormente à Assembleia Geral o pagamento de dividendos relativamente aos resultados de 2020”.

Nos números divulgados destaque para o rácio de capital total de 15,2% (15,3% em base pro forma) e o rácio de capital CET1 de 11,8% (pro forma de 12%), acima dos requisitos regulamentares de 13,31% e 8,83%, respetivamente.

O BCP reportou que reforçou as imparidades e provisões para 726,1 milhões de euros (+31,9%), das quais 264 milhões são imparidades para crédito; 313,5 milhões de euros são as provisões para riscos legais com os créditos que foram concedidos em francos suíços no banco polaco detido em 50,1% pelo banco em Portugal; por fim 148,5 milhões são imparidades para outros ativos.

O Millennium BCP disse ainda que o contributo das operações internacionais para o resultado consolidado foi negativo. Por causa, evidentemente, do resultado negativo de 181.2 milhões de euros do Millennium Bank na Polónia. No geral os bancos no estrangeiro pesaram negativamente em  -55,7 milhões de euros no resultado consolidado. O que compara com 54,4 milhões positivos no período homólogo.

Recorde-se que em Portugal apenas, o BCP viu os lucros subirem de 91,9 milhões para 115,2 milhões num ano.

O BCP anunciou esta quarta-feira uma queda dos resultados líquidos consolidados de 59,3% para 59,5 milhões de euros. Este resultado consolidado inclui provisões de 313,5 milhões para riscos legais associados a créditos em francos suíços na Polónia e contribuições obrigatórias para o setor bancário em Portugal de 56,2 milhões. Excluindo custos de ajustamento do quadro de pessoal em Portugal de 87,6 milhões, o resultado operacional core do Grupo atingiu 938,7 milhões, correspondendo a um crescimento de 8,3%.

Os proveitos core aumentaram 3,1%, com crescimento de 1,3% da margem financeira e de 7,2% das comissões, impulsionadas pelo crescimento de 9,3% das comissões relacionadas com mercados. Os custos operacionais recorrentes reduzem-se 2,7%.

As imparidades e provisões totalizaram 726,1 milhões (+31,9% face a setembro de 2020).

Sobre as metas para 2024 incluídas no plano estratégico, o BCP quer ter um ROE de 10% (em setembro foi de 1,4%); um rácio de eficiência de 40% (está em 50%); um custo do risco em 0,50% está em 0,60%; um rácio de NPE abaixo de 4%. Quer também ter mais de 65% de clientes mobile (em setembro eram 55%); o banco espera ainda um crescimento de 12% de clientes de elevado envolvimento; e quer ter uma média de rating ESG (ambiente, governance e social) acima de 80%.

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