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Centralização dos direitos televisivos: Luís Vilar acredita que clubes pequenos vão ser beneficiados

Luís Vilar acredita que com a centralização dos direitos televisivos os clubes pequenos “vão ter capacidade de exportar o seu produto além-fronteiras”.
1 Março 2021, 07h50

Depois de vários anos em debate, a centralização dos direitos televisivos dos jogos da I e II Ligas de futebol foi aprovada pelo Governo na passada quinta-feira, 25 de fevereiro e entrará em vigor a partir da temporada desportiva de 2028/2029.

Uma decisão considerada “revolucionária” pelo Executivo e como “um dia histórico” para a Liga de Clubes liderada por Pedro Proença. Contudo, é necessário definir o melhor modelo de partilha dos valores envolvidos no negócio em si, de forma a que nenhum dos clubes venha a ser prejudicado.

Em entrevista ao Jornal Económico (JE), Luís Vilar, Pró-Reitor da Universidade Europeia de Lisboa, defende que as maiores dificuldades neste processo vão passar pelo modelo de partilha entre os clubes e acredita que as equipas mais pequenas poderão tirar maiores benefícios na exportação de valores para os mercados internacionais.

Esta é a derradeira oportunidade para o futebol português aumentar as suas receitas e ao mesmo tempo criar mais competitividade entre os clubes?

Não é a derradeira oportunidade para aumentar as receitas porque, como em todos os sectores, os modelos de negócio estão em constante evolução (de uma forma não linear). Contudo, é obvio para todos que existe um desequilíbrio competitivo enorme entre os clubes da 1ª liga em Portugal. Basta compararmos com as restantes ligas europeias e verificar que só um terço das nossas equipas têm uma diferença de golos positiva. É importante percebermos dois aspetos fundamentais: a maior fonte de receita dos clubes é proveniente dos direitos de transmissão televisiva, sendo que nos grandes é de 35/40% do total da receita, e que à medida que descemos na tabela classificativa ela é de 80/90% do total de receitas; outro aspeto é que os pequenos recebem 15 vezes menos que os grandes. Além de promover-se um jogo defensivo e de baixa intensidade, promove uma subserviência muito grande dos pequenos face aos grandes em matéria de política desportiva (em sede de assembleia geral da Liga de Portugal).

Quais serão as principais dificuldades entre os clubes para negociarem a distribuição dos valores?

Obviamente o modelo de partilha. As diferenças de interesse dos clubes: enquanto os grandes querem continuar a ser dominadores, os pequenos querem ter maior capacidade de competir com eles. Em última instância a atual diferença de 15 vezes poderá manter-se, desde que todos os clubes estejam de acordo, algo que me parece impensável. Na Premier League o modelo de partilha é 50% igual para todos, 25% em função de classificação e 25% em função de audiências. Em Espanha já é um modelo mais desequilibrado. Quer-me parecer que vai haver muita pressão dos grandes para que as audiências tenham mais peso e o montante igual menos peso. A boa noticia é que se não tiverem todos os clubes de acordo, vai ser o Governo a decidir de forma unilateral, e aí será seguramente equilibrado.

Critérios como a história dos clubes, o seu peso enquanto marca não poderão ser factores que influenciem este processo de negociação?

De forma indireta, sim. A verdade é que tem de ser dada uma métrica à variável ‘história’ dos clubes. Se calhar chamar-lhe-ia dimensão histórica, medida em métricas de mobilização de fãs e adeptos. Ou seja, audiências. O valor da marca mede exatamente o mesmo, isto é, a capacidade de estabelecer pontos de interação com o consumidor. Daí que considere que audiências deva ser uma das variáveis principais.

Poderão aos clubes portugueses aproximarem-se de alguma forma dos principais emblemas europeus ou por outro lado, criar um fosso ainda maior a nível interno?

Isto irá permitir encurtar o fosso interno. A premissa que eu pessoalmente discuto mais é se os três grandes vão perder competitiva internacional. A literatura diz que sim, mas eu acho que não. A 1ª liga vai incrementar a sua intensidade e qualidade de jogo, e os nossos representantes lá fora vão competir com outro andamento. Hoje em dia é angustiante ver a falta de intensidade que as equipas portuguesas têm comparativamente a equipas estrangeiras.

Como ficam as negociações dos valores contratuais com as operadoras? Será possível igualar ou ultrapassar as verbas já envolvidas?

Em termos absolutos não sabemos como o mercado vai estar daqui a 7 anos. Se a negociação fosse hoje seguramente o montante para todos seria menor. O que a experiência de 34 ligas profissionais na europa com modelos centralizados há 15 anos para cá é que o montante é maior para todos os clubes. Tanto assim é, que nunca hoje nenhuma centralização a ser revertida. A própria lei da oferta e da procura explica que assim seja: deixam de existir os atuais 18 produtos à venda para 4 compradores, e passa a existir apenas 1 produto à venda para os mesmos 4 compradores. A grande vantagem é que vamos negociar muito mais do que jogos de futebol. Centralizando a comunicação, irão ser criados um conjunto de subprodutos como rubricas de antevisão da jornada e a reportagem no balneário de valor acrescentado. A negociação vai ser passar a ser conduzida por uma entidade forte e capaz, não estando refém do associativismo desportivo e necessidades financeiras urgentes. Pela primeira vez os clubes pequenos vão ter capacidade de exportar o seu produto além-fronteiras. Não me espanta porém que e grande beneficiado venha a ser o primeiro dos não grandes. Em Espanha o Atlético Madrid ganhou outra dimensão competitiva, e prevejo que o mesmo venha a acontecer com o SC Braga e Vitória SC. Não obstante, os atuais contratos celebrados são para se manter salvo se os clubes não quiserem, sendo que quem já adiantou receita por intermédio de factoring nos próximos anos vai ver a sua receita de direitos de transmissão televisiva reduzir drasticamente, pois esse dinheiro já foi consumido. Depois de tantas críticas dos clubes sobre a inexistência de um organismo político forte no Desporto, teve de ser a Secretaria de Estado da Juventude e do Desporto a obrigar à evolução da indústria.

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