Numa época de grandes e constantes mudanças, em todas as esferas da nossa existência, o que nos exige estarmos preparados para enfrentar transformações cada vez maiores, mais rápidas, mais violentas e traumáticas, associadas a um ambiente de grande incerteza e a um clima de competitividade crescente que nos impõem todo o tipo de exigências e riscos pessoais, o objetivo de desenvolver “Talentos” é o tema chave dentro de qualquer tipo de organização.
O quotidiano escolar, em Portugal, revela-nos um ensino massificado direcionado para a aquisição de conhecimentos em detrimento do fomento de atitudes/valores e do desenvolvimento de competências. Importa questionar o ensino ao nível das conceções, das opções curriculares e das práticas pedagógicas. Neste sentido, verificamos uma disparidade entre o discurso educativo dos documentos, as diretivas oficiais e as práticas dominantes na sala de aula, devendo-se privilegiar um processo de ensino-aprendizagem baseado na perspetiva de metodologias ativas, experimentais e que possibilitem maior autonomia aos estudantes.
As crianças encontram-se monitorizadas por pais e professores, não lhes sendo dada a possibilidade de brincarem na rua ou em contacto com a natureza. Considero mesmo que estas crianças se encontram com transtorno por deficit de natureza, apresentando desde muito cedo doenças caracterizadas por esta sociedade pós-moderna, como a depressão infantil, o stress, o deficit de atenção, a hiperatividade, a ansiedade, que são fruto de rotinas de “crianças adultas”.
Desde 1950, na Dinamarca, e posteriormente, nas décadas de 60 e 70, na Alemanha, Noruega, Suécia e Inglaterra, que as crianças começaram a ter contacto diário com a natureza, na grande maioria das vezes desafiando temperaturas de -10º a -20º graus centígrados. Nos dias de hoje, existem, na Europa central e Escandinávia, na América do Norte e Ásia Central, escolas na natureza, no ensino pré-escolar e primário.
Portugal, com o melhor clima da Europa, demonstra que, neste aspeto, tem quase tudo por fazer dado que as nossas crianças do pré-escolar e do 1.º ciclo, além de terem provas nacionais, estão confinadas a quatro paredes e a obedecer a um adulto que lhes impõe um grau de liberdade praticamente inexistente.
A escola tem de estar obrigatoriamente enquadrada com as necessidades deste século e não de costas voltadas para esta realidade, pelo que urge apostar na natureza como aula, porque aí se trabalham competências e habilidades fundamentais para um desenvolvimento equilibrado das crianças, tais como:
A criatividade, que está implícita à aprendizagem na natureza, porque não existem brinquedos pré-fabricados e as crianças são convidadas a produzir os seus próprios instrumentos de jogo, com os materiais aí existentes, sejam eles paus, pedras, pinhas, plantas ou frutas. Estas condições estimulam a criação das suas próprias ideias, regras e histórias, alimentam a sua fantasia e exercitam ao máximo a sua imaginação.
A concentração é desenvolvida ao limite, porque o facto de estarem numa zona de exploração obriga-as a trabalhar esta habilidade de maneira quase espontânea. Estando em contacto com a natureza, estão sempre a observar fenómenos que lhes são desconhecidos e que lhes despertam a curiosidade, além de que isso provoca um efeito estruturante e que perdura no tempo.
A responsabilidade é uma das competências que desenvolvem de forma direta e perfeitamente natural, porque as crianças não são monitorizadas, andam ao seu ritmo a explorar as suas habilidades, competências e a criar as suas próprias ferramentas sociais e emocionais.
A resolução de conflitos é algo que é praticamente inexistente, porque estão habituadas a trabalhar em equipa, a partilhar instrumentos de atividade, a estarem motivados nas tarefas a realizar, por isso os professores não usam de grande intervenção tendo sempre como foco soluções para a resolução de situações pontuais.
A psicomotricidade é desenvolvida sem que se apercebam porque todos os dias se movem em terrenos heterogéneos que lhes permite fortalecer os grupos musculares e terem um maior controlo sobre o seu corpo, melhorando de forma muito significativa a motricidade fina e motricidade grossa.
A obesidade é considerada como uma epidemia do século XXI; em Portugal, 28,5% das crianças entre os 2 e os 10 anos têm excesso de peso, entre as quais 12,7% são obesas, de acordo com os resultados do mais recente estudo divulgado pela Associação Portuguesa Contra a Obesidade Infantil, que analisou uma amostra de 17.698 crianças, em idade escolar, no ano letivo 2016-2017, oriundas das sete unidades territoriais portuguesas (NUTS II). A natureza tem um papel muito importante no que diz respeito à prevenção da obesidade infantil, porque as crianças andam em constante movimento ao ar livre, produzem os seus próprios alimentos e adquirem uma consciência sobre a importância ou não de cada alimento.
Numa perspetiva médica, o contacto com a natureza reforça o sistema imunológico e diminui a predisposição das doenças infetocontagiosas. A exposição à luz solar estimula a produção de vitamina D, o que ajuda a fortalecer o sistema imunitário.
A relação com a natureza promove experiências reais, onde conhecem o seu envolvimento de maneira vivencial, aprendendo como funciona a natureza a respeitá-la e a tratar dela com sentido de pertença, porque se encontram todos os dias e ambas vivenciam tempos mágicos.
Defendo a implementação de escolas de ensino pré-escolar e do 1º ciclo na natureza, através de um formato de aprendizagem experiencial, definido à medida e à velocidade de cada um, onde as crianças desenvolvem capacidades motoras, sociais e emocionais que os marcam no seu crescimento, no presente e no futuro, e onde certamente começam a desenvolver os seus talentos.
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