O Grupo Banque Populaire – Caisse d’Épargne (BPCE) anunciou que assinou um acordo para a compra do Novobanco, uma operação que deverá ficar fechada até junho de 2026. O grupo bancário francês é uma cooperativa e é liderado por Nicolas Namias. O CEO do BPCE aceitou ser entrevistado pelo Jornal Económico para a rubrica “Decisor da semana”, da edição que sai nas bancas à sexta-feira. O JE publica na integra a entrevista.
Foram 18 perguntas, na resposta, as mais focadas do negócio como segmentos de crédito, ou banca de investimento, o CEO explicou que ainda é muito cedo para falar no assunto.
Antes uma breve apresentação do grupo BPCE. É o segundo maior grupo bancário de França, com 100 mil colaboradores e 35 milhões de clientes. Embora a sua rede de banca de retalho esteja concentrada principalmente em França, o grupo tem uma presença global em mais de 50 países através de serviços financeiros especializados, serviços bancários corporativos e de investimento, e gestão de ativos.
De acordo com a própria apresentação do banco, o grupo ocupa uma posição de destaque em França como principal financiador das PME e do setor público. De uma forma mais abrangente, detém a segunda maior quota de mercado em termos de financiamento, representando 22% do mercado em todos os segmentos de clientes. Além disso, é o quarto maior grupo bancário da zona euro em termos de ativo líquido.
O BPCE está presente em Portugal há mais de 30 anos, onde emprega um total de cerca de três mil colaboradores, através do hub de expertise do Porto (sob a marca Natixis) que foi inaugurado em 2017, e onde se encontram diversas funções de suporte de valor acrescentado. O centro conta com mais de 2.500 colaboradores que trabalham em todos os negócios/funções de apoio do BPCE.
Mas também a através do crédito ao consumo com a presença da Oney no país através da sua subsidiária local (360 colaboradores) e a participação do Banco Primus, banco de financiamento automóvel.
Em França, o BPCE (através da Caisse d’Epargne Ile de France) opera o Banque BCP, que serve clientes da comunidade portuguesa em França.
Nicolas Namias, CEO do grupo, apresentou recentemente a estratégia “Visão 2030” para o BPCE e a compra do Novobanco insere-se nessa estratégia.
A aquisição do Novobanco em Portugal insere-se na estratégia do BPCE, conhecida como Visão 2030, que assenta no crescimento em França e no estrangeiro?
O nosso plano estratégico, divulgado há um ano, previa o nosso crescimento em três círculos: França, Europa e o resto do mundo. Claramente, a aquisição do Novobanco irá reforçar a nossa presença na Europa e está perfeitamente alinhada com a nossa ambição de crescer simultaneamente nestas três áreas geográficas.
Esta iniciativa reflete também o nosso desejo de ter uma presença real no financiamento da economia, onde quer que operemos. A dimensão e a solidez do Novobanco, que é o quarto maior banco comercial português, com uma quota de mercado de 9% em clientes particulares e de 14% em clientes empresariais, estão em linha com esta ambição.
Porque escolheram o Novobanco? O mercado português oferece vantagens para o BPCE?
Portugal apresenta um ambiente económico favorável que incentiva a inovação e proporciona uma estrutura segura para os investidores. Portugal destaca-se pelo dinamismo da sua economia e dos seus empreendedores, bem como pelas suas perspetivas económicas positivas a médio prazo. O BPCE tem demonstrado o seu compromisso com Portugal ao longo de muitos anos, investindo ativamente na sua economia e empregando atualmente mais de três mil colaboradores no país. A aquisição do Novobanco representa um passo em frente, permitindo ao BPCE operar através de uma vasta rede bancária de retalho. Com esta aquisição, passaremos a ter mais de sete mil colaboradores em Portugal.
O Novobanco é um banco de elevado desempenho em Portugal, com uma quota de mercado significativa e uma forte rentabilidade, com uma Retorno sobre o Capital Próprio Tangível (RoTE) superior a 20%. A qualidade intrínseca deste banco e a sua presença em Portugal foram fatores-chave que impulsionaram o nosso interesse. Com o Novobanco pretendemos tornar-nos um parceiro essencial para a economia portuguesa, em particular para as suas pequenas e médias empresas e famílias.
Em suma, optámos por investir num banco de sucesso, num país que consolidou as suas finanças públicas e que conta agora com fundamentos muito sólidos. E, por último, mas não menos importante, partilhamos o mesmo ADN: financiar a economia, financiar empresas e apoiar os seus clientes.
O mercado bancário português é semelhante ou muito diferente do mercado francês?
Há mais de dois séculos que o BPCE demonstra a sua capacidade de apoiar o desenvolvimento da economia francesa, onde detém uma quota de mercado de quase 22% (em termos de crédito – outstanding loans). Com a aquisição do Novobanco, o BPCE pretende partilhar os mesmos valores para a economia portuguesa, para os particulares e para as empresas, o de ser um parceiro económico de confiança, comprometido com o longo prazo e o mais próximo possível das necessidades dos seus clientes. Além disso, a economia francesa é financiada a uma taxa fixa, enquanto a proporção de taxas variáveis é maior em Portugal.
A Lone Star afirmou que existem “fortes complementaridades” entre o Novobanco e o BPCE. De que complementaridades estamos a falar?
Com esta operação, os clientes do Novobanco beneficiarão da expertise, dos serviços e das inovações que o BPCE oferece atualmente aos clientes dos Banques Populaires e Caisses d’Epargne, bem como a terceiros.
Por exemplo, os clientes particulares poderão aceder a uma vasta gama de soluções e, no financiamento empresarial, o Groupe BPCE, o principal parceiro francês para pequenas e médias empresas, utilizará a sua expertise para fornecer aos clientes do Novobanco um apoio melhorado para o seu crescimento.
Fora de França, em que países está presente o BPCE? Até agora, a internacionalização era feita apenas através do Natixis, certo? O que mudou?
O BPCE tem tido uma presença internacional através de diversas atividades e marcas. A mais conhecida é a Natixis, a marca utilizada para a banca corporativa e de investimento, bem como para a gestão de ativos. Operamos também a nível global com a BPCE Equipment Solutions na área de leasing e diversas marcas especializadas. Com o lançamento do BPCE ES, o BPCE tem agora acesso a novos mercados na Europa.
A mudança fundamental para nós é a expansão para a banca de retalho na Europa, particularmente através da aquisição de uma significativa quota de mercado de retalho através do Novobanco, que nos posiciona como o quarto maior player em Portugal. Este movimento estratégico visa estabelecer rapidamente uma posição competitiva sólida numa importante economia da Zona Euro. Dada a nossa dimensão, pretendemos investir a níveis suficientemente substanciais para ter impacto no nosso mix de negócios.
O BPCE opera como uma organização mutualista, com acionistas compostos por bancos regionais (14 Banques Populaires e 15 Caisses d’Epargne) que são propriedade dos seus clientes. De que forma esta estrutura mutualista vos diferencia de outras instituições bancárias e de que forma esta organização é vantajosa?
Ao termos os nossos bancos regionais propriedade dos seus clientes, garantimos com eles uma comunidade de interesses, o que nos obriga a ter plenamente em conta as suas expectativas. Este modelo promove a confiança e a lealdade, permitindo-nos focar nas relações de longo prazo e no crescimento sustentável, em vez dos lucros de curto prazo, que podem ser o foco das instituições cotadas no mercado de capitais.
Será por ser um grupo mútuo de cooperativas que o BPCE tem como estratégia não abrir o capital do Novobanco em bolsa?
O nosso modelo cooperativo proporciona-nos um acesso suficiente a capital, reduzindo a necessidade de depender do mercado bolsista para sustentar o nosso crescimento.
Sendo o Novobanco um banco de retalho, como podem existir sinergias com o BPCE? Que sinergias estão implícitas no preço oferecido por 100% do Novobanco?
O nosso objetivo não é obter sinergias de custos, uma vez que não possuímos outra rede bancária de retalho em Portugal. Em vez disso, procuramos obter sinergias de receitas, alavancando a vasta experiência do BPCE em benefício dos clientes do Novobanco.
O Groupe BPCE inclui uma rede de 14 Banque Populaires e 15 Caisses d’Epargne, dois bancos do Groupe BPCE que continuam a operar de forma autónoma, e até competitiva, sob marcas separadas. É este o modelo que vai seguir ao comprar o Novobanco?
Em França, temos duas marcas multicentenárias por motivos históricos. A situação é diferente em Portugal, onde o nosso foco estará no desenvolvimento da marca Novobanco.
Qual o objetivo estratégico do Novobanco? Digamos que, daqui a 10 anos, onde espera que esteja o Novobanco em termos de quota de mercado em Portugal? Qual a projeção em termos de rendibilidade (ROE ou ROTE)?
Como já dissemos, podemos confirmar que este é um projeto de desenvolvimento para o banco. De resto é muito cedo para comentar estes temas neste momento.
O Grupo BPCE vai criar mais HUBs em Portugal, para além do centro de desenvolvimento tecnológico da Natixis no Porto?
Desde 2017, a abertura de um centro de especialização multiempresarial no Porto aprofundou os nossos laços locais e o nosso objetivo é dar continuidade a este desenvolvimento.
Quais serão os primeiros passos a dar após a conclusão da aquisição do Novobanco?
Estamos focados em finalizar a transação nos próximos meses. É muito cedo para discutir os próximos passos.
Enquanto CEO do Grupo BPCE, quanto tempo pretende passar em Portugal após a conclusão da aquisição?
As equipas responsáveis pelo projeto trabalharão em estreita colaboração com todas as partes interessadas (stakeholders) relevantes em Portugal. Pessoalmente, tenciono passar algum tempo em Portugal para supervisionar o projeto e aprofundar o meu conhecimento da dinâmica do mercado, embora não tenha definido um calendário específico para as minhas visitas.
Afirmou que iria manter a atual Comissão Executiva do Novobanco. Não é tradição nomear representantes do BPCE nos bancos adquiridos?
Mark Bourke, o CEO, e a administração executiva têm feito um excelente trabalho nos últimos anos. Assim sendo, contamos com o empenho desta grande equipa, bem como com o empenho de todos os colaboradores do Novobanco, que compreenderão o interesse de ter um acionista de longo prazo dedicado ao crescimento do banco. É claro que trabalharemos, tanto na administração como na supervisão, para garantir o nível adequado de controlo, integração e alinhamento com o BPCE.
Qual é o seu comentário sobre o relatório Draghi, que defende maiores empresas europeias (incluindo os bancos) capazes de concorrer com as suas congéneres americanas e chinesas?
Partilhamos a visão de que instituições europeias fortes e bem capitalizadas são cruciais para a competitividade global. A aquisição do Novobanco é um passo estratégico para reforçar a nossa posição na Europa. Sendo já um importante player no setor bancário local em França, graças às redes bancárias Banque Populaire e Caisse d’Epargne, o BPCE tornar-se-á um player no setor da banca de retalho na Europa com a aquisição do Novobanco e participará ativamente no financiamento da economia portuguesa.
Qual a citação que mais o inspira?
Não se trata tanto de uma citação, mas sim da convicção de que é importante combinar duas abordagens nos negócios: ser ousado o suficiente para “sonhar alto”, porque os sonhos são poderosos, e ser preciso na execução, porque o verdadeiro poder reside na arte da “execução”. Em suma, defendo a combinação dos “poderes do sonho e da execução”, que inspirou o nosso plano estratégico “Visão 2030”.
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