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“Nunca fui contactado [pelo BdP]” após alertas de “situações de excepção”, diz ex-ROC da CGD

A nova comissão de inquérito à Caixa está a ouvir nesta terça-feira, 2 de abril, o antigo Revisor Oficial de Contas (ROC) do banco responsável pelos alertas para o risco de “fraudes e erros” e que foram ignorados pelo Banco de Portugal e pelo Ministério das Finanças. Manuel de Oliveira Rego diz que apesar de terem sido sinalizadas “situações de excepção” em relatórios enviados ao supervisor, nunca recebeu qualquer contacto por parte desta entidade.
  • Caixa Geral de Depósitos
2 Abril 2019, 17h06

Manuel de Oliveira Rego, responsável pela sociedade de Revisores Oficiais de Contas (ROC), Oliveira Rego e Associados, que fiscalizou as contas da Caixa Geral de Depósitos (CGD) até 2016,  assegura que o Banco de Portugal (BdP) nunca contactou aquele órgão de fiscalização na sequência de alertas para o risco de “fraudes e erros” na concessão de crédito, que surgiram em 2007, e que apontavam para “situações de excepção” que foram comunicadas ao supervisor em relatórios anuais.

“Diretamente nunca foi contactado. Depois soube por interposta pessoa que, nos últimos anos, [o BdP] contactou a administração da Caixa relativamente a algumas situações de excepção”, disse Manuel de Oliveira Rego, em resposta à deputada centrista, Cecília Meireles, sobre se o supervisor alguma vez contactou o antigo ROC que foi o responsável por aqueles alertas.

A deputada do CDS-PP pretendeu ainda saber qual foi “a interposta pessoa” que deu a informação ao antigo ROC sobre os contatos posteriores entre o supervisor e a administração da CGD na sequência das situações de excepção que foram assinalados nos relatórios enviados anualmente ao BdP por aquele órgão de fiscalização externa, mas a resposta surgiu com um “não me lembro”. De imediato ouviram-se gargalhadas dos deputados, pois, momentos antes, Manuel de Oliveira Rego tinha assegurado que “aqui não há falta de memórias”, porque a sua  sociedade de ROC fez o seu trabalho. Uma garantia em referência ao controlo das normas internas que não eram cumpridas na concessão de crédito e que foram identificadas no relatório de auditoria da EY à gestão da Caixa entre 2000 e 2015, período em que os créditos ruinosos geraram perdas superiores a 1,6 mil milhões de euros.

Depois do arranque das audições com a auditora EY, o actual e antigo governador do Banco de Portugal, Carlos Costa e Vítor Constâncio, é a vez nesta terça-feira, 2 de abril, de o antigo ROC da CGD, ir ao Parlamento, após divulgação de relatório à gestão da Caixa entre 2000 e 2015, que concluiu por negócios ruinosos que geraram perdas superiores a 1,6 mil milhões devido, nomeadamente, a decisões pouco fundamentadas na concessão de crédito.

Manuel de Oliveira Rego está a ser ouvido pelos deputados na sequência de alertas deste responsável para “risco de fraude” na CGD durante sete anos que foram dados por aquele responsável pela fiscalização das contas do banco público.

É sobre estes alertas que foram ignorados pelo regulador, banco e tutela, que a nova CPI está hoje Oliveira Rego como do ex-membro de órgão de fiscalização da CGD que, em 2007, avisou para o risco de “fraudes e erros” sem serem detectados devido a “limitações” no controlo interno em áreas como a concessão de crédito, tal como revelado pelo Jornal Económico na edição de 1 de fevereiro.

Foi sobre estes alertas de riscos de fraudes que a deputada do CDS-PP, Cecília Meireles, questionou o ex-ROC sobre a acção do Banco de Portugal. Isto porque, o risco de fraudes e erros na gestão da CGD já tinha sido identificado pelo órgão de fiscalização do banco desde de 2007, mas os alertas não tiveram a devida atenção e acompanhamento do supervisor e dos sucessivos governos até 2014, de acordo com os relatórios e contas do banco do Estado.

 

ROC diz que alertas foram enviados ao BdP

Na notícia do JE de 1 de fevereiro, Oliveira Rego, responsável pela SROC da Caixa até 2015, foi questionado pelo nosso jornal sobre se houve alguma resposta em concreto da administração do banco após o alerta que fez para o risco de “fraudes e erros” sem serem detetados. Em resposta, o responsável limitou-se a avançar que a sua opinião era comunicada anualmente ao órgão fiscalizador do banco e ao BdP.

“No âmbito das suas atribuições, a nossa sociedade comunicava ao Conselho Fiscal e ao Banco de Portugal, anualmente e até ao dia 30 de junho, a sua opinião sobre o Sistema de Controlo Interno da entidade fiscalizada”, afirmou ao JE Oliveira Rego. Este responsável  recusou-se a esclarecer que “situações de excepção” foram detectadas. A este respeito afirma apenas: “o conteúdo da nossa opinião destinava-se àquelas entidades, é confidencial, e só elas poderão fazer utilização do mesmo”.

O JE sabe, porém, que os alertas do ROC incidiram sobre os circuitos de controlo interno e procedimentos de operações relacionadas com a análise de risco, nomeadamente a concessão de crédito. A este respeito, fonte próxima ao processo assegura: ”não existiam circuitos com fiabilidade necessária para evitar, por exemplo, créditos ruinosos, como aqueles assinalados na auditoria da EY”.

Já sobre o alerta do ROC, fonte oficial do BdP  remeteu o JE para “o aviso 5/2008 do supervisor que reforçou as exigências para o SCI”.

Foi em 2007 que o ROC da Caixa, Oliveira Rego, alertou para  o  risco de “fraudes ou erros” poderem ocorrer sem serem detectados devido às limitações do sistema de controlo interno (SCI) do banco público nas áreas de gestão de risco, compliance e auditoria interna.

Este alerta surgiu na administração da Caixa liderada por Carlos Santos Ferreira que ao Jornal Económico recusou qualquer comentário. O aviso do ROC acabou também por não merecer a devida atenção do governo da altura, chefiado por José Sócrates e pelo Banco de Portugal (BdP), então liderado por Vítor Constâncio. Neste caso, apesar de instruções do supervisor, em 2008, para reforço do SCI, no final de 2015 permaneciam ainda falhas nos procedimentos internos do banco que se traduziram num aumento grave da exposição da CGD ao risco, tal como a EY assinalou na auditoria  à gestão da Caixa.

O aviso do ROC terá ainda caído em saco roto na  administração da Caixa ao não se ter traduzido em medidas concretas que resolvessem as deficiências de controlo, nomeadamente nos procedimentos de concessão de crédito, detectadas em 2007. Após esta data, seguiram-se sete anos de recomendações à CGD para melhorar e acompanhar a evolução do controlo interno.

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