Nuno Cortesão é CEO e cofundador da Zharta, uma startup portuguesa que permite pedir empréstimos de criptomoedas, dando como garantia NFT, solucionando, assim, um problema de liquidez no mercado dos ativos digitais.
Que oportunidade é que identificaram para a criação da Zharta?
Nós identificamos um problema grande no mercado dos ativos digitais. Os ativos digitais, como os NFT, são não fungíveis e, como tal, quando um utilizador precisa de liquidez, ou precisa de uma solução rápida para conseguir ter exposição a outros ativos, fica bastante limitado e não tem acesso a capital. Nós criámos uma solução que permite aos utilizadores pedir um empréstimo utilizando um NFT como colateral e partilhando o risco futuro com um conjunto de lenders, que ajudam a providenciar o capital à pessoa que está com a necessidade.
Os empréstimos são instantâneos…
Estes empréstimos são instantâneos, dentro dos limites de blockchain. O empréstimo, do início ao fim, pode demorar dois minutos, mas não tem limites ao nível financeiro. Nós só fazemos empréstimos com criptomoedas, somos 100% não custodiais. O utilizador pode conseguir um empréstimo com um valor bastante avultado se tiver um ativo que tenha um valor intrínseco suficiente para suportar esse empréstimo.
Como é que funciona a plataforma?
A plataforma é muito virada à experiência do utilizador. O utilizador já tem que ter alguns conhecimentos de como funcionam as tecnologias de blockchain e de Web3 e tem que ter uma wallet. Depois, basta conectar-se à nossa plataforma, liga a wallet e consegue selecionar o valor do empréstimo que vai necessitar. Basicamente, ou seleciona os ativos e depois escolhe o valor, ou pode selecionar o valor diretamente e nós ajudamos a selecionar quais é que são os melhores ativos.
O utilizador tem total capacidade para fazer a personalização e, se os ativos forem sólidos, recebe o empréstimo na hora. Depois, tem um período para pagar o empréstimo. Chegando ao fim do término do empréstimo, se não tiver pago, o ativo é arrestado e acaba por ser vendido, para ajudar a criar uma eficiência de capital no sistema. Como a maior parte dos utilizadores paga os seus empréstimos, também há aqui um grau de colaterização alto. Trata-se de uma experiência bastante fluída.
Neste momento, o utilizador deposita o ativo num smart contract e o ativo fica quase num modelo de stake até ser efetuado o pagamento.
A rede que suportamos agora é a Ethereum, mas vamos claramente ser multi-chain.
Como referiu, os acordos são feitos através de smart contracts…
Sim, a solução é 100% não custodial. Tivemos três fases de teste com utilizadores reais, estamos agora na última versão e já temos a solução em mainnet. A rede que suportamos é a Ethereum, mas no futuro vamos claramente ser multi-chain. Já fizemos uma primeira auditoria e estamos a fechar a segunda, para assegurar que todo o sistema está battle-tested.
Do lado dos NFT, que coleções é que são compatíveis?
Estamos a focar-nos em ativos que são nativos digitais e também nas coleções de maior interesse, onde existem as comunidades mais aguerridas e os maiores múltiplos de liquidez. Neste momento, estamos a suportar Bored Ape Kennel Club, Mutant Apes, VeeFriends, Cool Cats, Pudgy Penguins, Hashmasks e World of Women e, brevemente, Bored Apes e Crypto Punks.
Estamos a falar de um nicho de mercado, mas no futuro chegará ao mercado de massas, com a proliferação do metaverso, do gaming e mesmo depois com a tokenização dos sistemas financeiros.
Qual é o vosso modelo de negócio?
Neste momento, tiramos uma comissão de 25% da taxa de juro, se o empréstimo for bem sucedido. Isto está também associado ao desempenho das lending pools e à capacidade com que se conseguem fazer os empréstimos que geram valor para quem empresta, mas que também criam uma oferta justa para quem está a pedir emprestado.
Em que fase de desenvolvimento é que está a plataforma?
Tivemos uma fase de desenvolvimento de testes, chegámos agora a mainnet e já temos o capital inicial para começar a fazer os primeiros empréstimos. Já fizemos alguns empréstimos com utilizadores reais para testar o sistema end-to-end em produção. Agora, estamos a começar a criar uma solução e funcionalidades viradas para as necessidades dos utilizadores.
Estamos a trabalhar muito com a nossa comunidade para perceber exatamente o que é que as pessoas precisam neste espaço. Estamos a falar de um nicho de mercado que tem necessidades específicas, mas no futuro chegará ao mercado de massas, com a proliferação do metaverso, do gaming e depois com a tokenização dos sistemas financeiros.
Nesta fase, estamos a perceber quais são as necessidades dos clientes iniciais e a criar as funcionalidades que são necessárias para resolver os seus problemas do ponto de vista de negócio.
E em termos de parceiros, pretendem criar parcerias também com instituições?
Ao nível de parceiros estamos a ter bastantes conversas com players da área da Web3, o que é também fruto do background dos fundadores. Trabalhamos em blockchain desde 2016 e, por isso, temos bastantes ligações tanto do lado corporativo, como do lado mais Web3 e startups.
Estamos a criar parcerias porque faz sentido. O mercado é muito emergente, há necessidades nascentes e há uma necessidade de colaboração. Até porque o ethos da blockchain e da Web3 é a criação de sistemas interoperáveis, que são facilmente transacionáveis. Ou seja, “money legos“, um sistema onde os vários smart contracts de diferentes empresas de diferentes DAO conseguem colaborar de forma sinergética para gerar valor para a comunidade e para criar ferramentas que sirvam os propósitos do ecossistema.
Este é um mercado que se move muito rápido, que necessita de decisões muito executivas e que necessita de uma capacidade e de uma vontade de arriscar. A banca tradicional tem que trazer essa resposta para conseguir integrar-se de forma sustentável e orgânica no mercado.
Pretendem colaborar também com instituições mais tradicionais?
Sim, estamos mais do que disponíveis para trabalhar com instituições tradicionais. Ao nível dos empréstimos, temos já algum capital de retalho, temos capital institucional.
Com a banca, por exemplo?
A minha opinião pessoal é que este é um tema ainda muito nascente. Há muita vontade de explorar porque um dos negócios mais relevante na banca é a área de empréstimos. Faz-nos todo o sentido colaborar com a banca.
Sendo bastante prático, este é um mercado que se move muito rápido, que necessita de decisões muito executivas e que necessita de uma capacidade e de uma vontade de arriscar. A banca tradicional tem que trazer essa resposta para conseguir integrar-se de forma sustentável e orgânica no mercado, porque senão vai ser sempre lenta em relação à competição internacional e a outros players que se estão a mexer neste espaço.
No entanto, temos todo o prazer em perceber quais é que são as necessidades da banca tradicional, para que também possamos abrir, expôr e criar as ferramentas para que possam trabalhar e explorar esse espaço.
Nós ganhámos o prémio do Banco de Portugal, no ano passado. Foi um processo muito interessante, no qual tivemos a possibilidade de estar perto dos reguladores, de perceber se o nosso modelo de negócio se enquadra nos modelos vigentes, e de perceber como é que se vão explorar estas novas fronteiras do mundo digital, que trazem respostas que não era possíveis há um conjunto de anos.
Em que mercados é que a Zharta vai estar disponível?
Neste momento, estamos a focar principalmente nos Estados Unidos e na Europa, porque é onde existem mais utilizadores do nosso espaço. No entanto, vemos com bons olhos o resto do globo. O nosso produto é 100% e altamente internacional, não tem barreiras. Sabemos que a Ásia é também um epicentro com muito interesse.
Depois entramos para a vertente mais social e mais sustentável. Estes sistemas têm muito menos barreiras de entrada para o retalho. Existem quase três mil milhões de pessoas que não têm contas bancárias. Por exemplo, nas Filipinas há o maior polo de utilizadores de Axie Infinity, que é um videojogo muito conhecido, com um modelo play to earn.
Claramente, vão surgir mercados emergentes de utilizadores que, como são colocados fora dos ecossistemas tradicionais, olham para estas novas tecnologias como uma maneira de conseguirem digitalizar-se e integrar-se no ecossistema. Teremos a nossa pegada, colaborando para ajudar ao banking the unbanked, que faz parte da missão e do ethos da Web3.
Quanto é que já captaram e quem são os vossos principais investidores?
Captámos no último ano 4,3 milhões de dólares. Os nossos investidores são um conjunto de players mais tradicionais e de players do espaço Web3. O nosso principal investor foi o Greenfield One, que é um dos maiores fundos de investimento em Web3 e finanças descentralizadas na Europa. Tivemos também a portuguesa Shilling, a Possible Ventures e a SpaceShipDao.
Toda uma nova camada de finanças está a emergir e vai, claramente, alimentar a economia do próximo século.
De que forma é que os empréstimos da Zharta podem ajudar também os desenvolvimentos no metaverso?
O metaverso, neste momento, tem um crescimento previsto de até 10 biliões de dólares para os próximos dez anos. Os utilizadores que compram este tipo de ativos não têm acesso a capital quando precisam de alavancar estes ativos para responder às suas necessidades de curto prazo. Este tipo de soluções cria todo um espectro de opções para que eles se consigam financiar, adquirir outros ativos, ou tirar alguma parte do capital do mundo digital para investir no mundo físico. Ou seja, cria uma panóplia de opções que não eram possíveis, porque ainda não havia players a servir este mercado.
Nós já temos alguma competição, este é um espaço bastante nascente, mas com muito interesse. Até a própria infraestrutura à volta tem muitos players a aparecer, não só na parte de empréstimos, como na parte de seguros e na parte de modelos secundários de empréstimos. Toda uma nova camada de finanças está a emergir e vai claramente alimentar a economia do próximo século.
Entrevista original publicada em SuperToast by INSTINCT.
Também disponível em Newsletter e Podcast.
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