Portugal viveu os últimos meses mergulhado no drama dos incêndios florestais. Foi um choque violento para todos nós a intensidade e dimensão dos fogos, a extensão das áreas ardidas, as centenas de casas destruídas, as múltiplas empresas cujas instalações desapareceram e, sobretudo, a morte dos nossos concidadãos.

Apesar dos muitos debates, artigos e relatórios julgo que, porventura pela primeira vez, não fomos invadidos por especialistas e soluções que tudo resolvem em poucas semanas. A dimensão da tragédia calou o atrevimento da ignorância.

Há, no entanto, uma dimensão que, ao que julgo, não tem sido abordada e que se prende, exactamente, com as Empresas Familiares.

De facto, a propriedade rústica do centro e norte de Portugal foi, até aos anos 60 do século XX, o suporte de muitos milhares de empresas familiares que tinham como objecto a exploração agrícola e florestal. Não assumiam essa designação, mas os Agricultores ou Lavradores de então não eram outra coisa.

A verdade é que a realidade económica do final dos anos 50 e início dos anos 60, isto é, a pobreza generalizada nos nossos campos e a total ausência de rentabilidade, levaram à falência de facto a quase totalidade dessas empresas familiares.

O apelo de salários regulares nos serviços e nas indústrias e o consequente acesso às vantagens do modo de vida urbano, a inevitabilidade salvadora da dignidade humana da emigração europeia, foram, efectivamente, a “salvação” para muitos Lavradores- Empresários e para os seus empregados.

Empresas falidas e a fuga dos empresários e dos trabalhadores tiveram a óbvia consequência – abandono progressivo do mundo rural e, principalmente, abandono da propriedade rústica enquanto activo capaz de gerar algum tipo de rendimento.

As plantações de eucaliptos iniciadas na década de 70, ou as de pinheiros, não tinham, não têm, genericamente, a lógica empresarial de outrora. Antes assumem uma perspectiva de um quase investimento financeiro de pouca complexidade.

Acontece que nos últimos anos tem ocorrido um certo “regresso ao campo” e, mais uma vez, num modelo de organização empresarial de natureza familiar. E este modelo deve, do ponto de vista das políticas públicas, merecer um forte estímulo e apoio.

De facto, se o objectivo do país for somente o de criar explorações agrícolas ou florestais, qualquer tipo de empresa é adequado. Se quisermos, a par da criação de explorações agrícolas ou florestais, ocupar o nosso território, dar-lhe vida e sustentabilidade, dar continuidade à actividade económica, então as empresas familiares terão um papel decisivo e único.

E esta não é, ou não é só, uma questão económica. É principalmente uma questão essencial de soberania que impõe a cada povo, e a cada Estado, a obrigação de ocupar o seu território.

É bom que todos nos lembremos disto agora que se vai discutir o Orçamento do Estado.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.