Moçambique começa 2026 retomando os megaprojetos de gás natural da TotalEnergies e ExxonMobil, que totalizam 50 mil milhões de dólares e prometem colocar o país entre os maiores produtores, após a suspensão devido aos ataques em Cabo Delgado.
O avanço dos megaprojetos de gás no norte, já com as duas petrolíferas a terem levantado as cláusulas de ‘força maior’, promete uma revolução económica, mas antes o país ainda tem de gerir a pressão pública do provável julgamento do político Venâncio Mondlane, por alegados crimes cometidos durante os protestos pós-eleitorais, incitamento à desobediência coletiva e instigação ao terrorismo.
Após assumir o lugar como membro do Conselho do Estado, face aos resultados eleitorais que deram vitória a Daniel Chapo com 65,17% dos votos nas eleições gerais de outubro, seguindo-se Venâncio Mondlane, com 24%, o político avançou que quer ver levantada a imunidade conferida como Conselheiro do Estado e quer ir a tribunal para se defender.
Para o analista e sociólogo Jaibo Mucufo, um provável julgamento do político, líder da oposição na rua, visa enfraquecer o ex-candidato presidencial, que assume claros objetivos nas eleições autárquicas de 2028 e gerais de 2029.
“Acredito que seria um julgamento jurídico, mas com um condão político para trazer à mesa discussões de possíveis acordos políticos e a possibilidade de um perdão”, disse.
Neste sentido, Mucufo prevê um “tumulto” social assim que for anunciado o julgamento, referindo que há um risco de este evento “dar maior visibilidade ao político”, que o pode usar para assumir a posição de “vítima” e convocar apoio popular.
O analista entende que o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo, no poder desde 1975) vai usar o julgamento como “termómetro” para medir o nível de apoio popular de Venâncio e começar a projetar um futuro cenário político.
O sociólogo e analista João Feijó entende que um provável julgamento a Venâncio “vai colocar em causa a imagem do país”, incluindo atrasar investimentos: “Tenho dúvidas que aceitem ir a votos com ele, acredito que mais cedo ou tarde vão jogar a carta, vão tentar bloquear a candidatura, mas não sei se existe um consenso dentro da Frelimo sobre como gerir a situação de Venâncio, visto que ele tem a população, que está disposta a ir à rua por ele”.
“Essa carta pode vir ser jogada com o aproximar de eleições para que ele fique com um cadastro que não lhe possibilite concorrer e desta forma limitá-lo”, acrescenta João Feijó.
Para Jaibo Mucufo, o diálogo político, assinado em 05 de março, que exclui Mondlane e o seu recente partido, Anamala, vai continuar em 2026, mas “não vai produzir resultados concretos” devido à politização do processo, dirigido por Edson Macuacua, um “membro sénior do partido no poder”, e que prevê dois anos para várias reformas, incluindo revisão da Constituição e das leis eleitorais.
Enquanto isso, no norte, os projetos de gás retomam, mas os ataques terroristas que os condicionaram nos últimos anos persistem.
Jaibo Mucufo entende que a retoma desses megaprojetos desencadeou uma “demonstração de força” pelos terroristas, que estão a intensificar esses ataques, incluindo com registo de mortes na província de Nampula, que faz fronteira com Cabo Delgado.
“Hoje há essa discussão também de ganhos a nível local, mas em Palma, Mocímboa, não há capacidade de constituir uma empresa que forneça serviços à Total, então é aí onde deve haver força do Estado para fazer que esses ganhos se façam sentir. Mas não vejo grandes ganhos para a população local”, acrescentou o sociólogo.
Também para Feijó, o avanço da ExxonMobil não se vai traduzir na criação de empregos locais, referindo que grande parte do investimento é em tecnologia fabricada no exterior.
A provável intensificação de ataques, diz Mucufo, vai criar “aproveitamentos”, com o surgimento de outros grupos criminosos naquelas regiões.
Para Feijó, os ataques nas três províncias vão continuar. “A liderança daquele grupo continua intacta, os miúdos que estão lá foram raptados para integrar as fileiras do terrorismo, são crianças traumatizadas que estão lá e estão a usar estratégia que lhes permite proteção da população”.
Moçambique espera continuar a receber apoio da União Europeia no combate ao terrorismo, quando esta organização anunciou, em 2024, a adaptação dos objetivos estratégicos da anterior Missão de Formação Militar da UE em Moçambique (EUTM-MOZ), que transitou, em 01 de setembro do mesmo ano, do modelo de treino para um de assistência.
Apesar de a missão terminar no próximo ano, o académico Mucufo prevê a continuação do apoio da UE, que tem interesses na exploração dos recursos em Cabo Delgado.
“Acredito que vão continuar presentes, com o seu modelo de apoio, há interesses maiores. Mas o modelo de apoio devia ser diferente, com o país a exigir tecnologia militar”, concluiu.
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