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Respostas Rápidas: por que razões Trump quebrou as tréguas comerciais com a China?

No domingo, Trump recorreu ao Twitter para, unilateralmente, acabar com as tréguas comerciais, anunciando mais tarifas às exportações chinesas. O presidente dos EUA, além de querer reduzir o défice comercial com a China, quer forçar a sua posição, fazendo com que os chineses aceitem aumentar os níveis de proteção dos direitos de autor. Mas há quem defenda que o protelar da incerteza poderá constituir um trunfo político para Trump usar nas presidenciais de 2020.
7 Maio 2019, 07h42

A política “a América Primeiro” (“America First”) levou o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, a tomar medidas protecionistas, não só para a promover o emprego e a produção de bens (e serviços) norte-americanos, mas também para reduzir o défice comercial que os EUA têm com determinados países, nomeadamente a União Europeia (UE) e a China.

Em relação à China, Trump passou das ameaças para a ação quando, em 2018, aumentou as tarifas aduaneiras às importações norte-americanas de uma série de produtos chineses. Mas, em dezembro, depois da última cimeira do G-20, em Buenos Aires, a capital argentina, Trump e o seu homólogo chinês, Xi Jiping, acordaram um período de tréguas de três meses, no qual as duas maiores economias do mundo iriam encetar negociações com vista a um acordo comercial até ao dia 31 de março.

No domingo, Trump recorreu ao Twitter para, unilateralmente, acabar com as tréguas comerciais, anunciando mais tarifas às exportações chinesas, e colocou os mercados em polvorosa, assistindo-se a um selloff das principais bolsas norte-americanas.

O que anunciou Donald Trump no Twitter?

Em dois tweets, Trump anunciou que os Estados Unidos vão aumentar de 10% para 25% as tarifas aplicadas às importações de determinados produtos chineses, no valor de 200 mil milhões de dólares, a partir de sexta-feira. Além disso, “brevemente”, a administração Trump vai aumentar para 25% as tarifas a outro grupo de importações de produtos chineses, no valor de 325 mil milhões de dólares, que estão isentos de taxa aduaneira.

Além disso, o presidente dos EUA chamou a atenção para o contributo destas medidas protecionistas na economia, uma vez que têm sido “parcialmente responsáveis” pelo bom momento económico.

Trump realçou ainda que economia norte-americana não foi prejudicada porque o aumento das tarifas às importações de produtos chineses têm tido “impacto pequeno no custo do produto”. O presidente norte-americano referiu ainda que o processo negocial continua, “mas muito devagar”.

Por que razões Trump quebrou as tréguas comerciais?

A economia chinesa, apesar de ser uma economia de mercado aberta, é controlada centralmente pelo Partido Comunista chinês. Assim, o tecido empresarial chinês tem de comportar-se segundo as linhas estratégicas delineadas pelo partido.

Por um lado, as economias ocidentais têm denunciado que as empresas chinesas tendem a violar os direitos de propriedade intelectual, o que dificulta a concorrência das empresas estrangeiras no maior mercado do mundo, nomeadamente ao nível da tecnologia, setor no qual os chineses são acusados de copiar know-how. Por outro lado, as empresas chinesas podem ser obrigadas a divulgar segredos ao Partido Comunista chinês, que, além disso, ainda detém participações importantes em diversas empresas chinesas. Em Portugal, são conhecidos os casos da China Three Gorges, acionista da EDP, ou da State Grid, acionista da REN.

Além de querer reduzir o défice comercial que os EUA têm com a China, Trump quer que os chineses fiquem de acordo sobre certas concessões que potencialmente poderão transformar o sistema económico chinês –  como a garantia pelo zelo dos direitos de propriedade intelectual -, algo que tem batido na resistência chinesa.

Os analistas do Commerzbank, até se mostraram confiantes na celeridade de um acordo comercial se a China aceitasse aquelas concessões, mas “os tweets de Trump demonstram que tal poderá não estar a acontecer”. E salientaram que,”presumivelmente, os EUA estão a tentar reorientar as relações comerciais, o que pressupõe uma transformação fundamental do sistema económico chinês, por exemplo, nas áreas de proteção legal e na importância de empresas estatais. A China não está preparada para isto”.

O que pretende Donald Trump com o aumento das tarifas a partir de sexta-feira?

Em termos puramente económicos, Trump pretende reduzir o défice comercial que os EUA têm com a China. Os analistas do Commerzbank referem que, apesar do défice comercial norte-americano com a China ter vindo a aumentar desde o ano 2000, aumentou para quase 420 mil milhões de dólares, desde que Donald Trump foi empossado. Isto corresponde a um aumento de 20% em relação a 2016, um ano antes de Trump se tornar presidente.

Na dimensão política, os analistas do Bankinter referem que este colete de forças contra a China poderá ser um trunfo eleitoral para as presidenciais norte-americanas em 2020. Isto porque, argumentam, “Trump deseja chegar às eleições de novembro de 2020 com este assunto por resolver para beneficiar a sua probabilidade de ser reeleito”, o que significa que as tensões comerciais com a China podem perdurar.

Como reagiram as bolsas mundiais?

Os três principais índices norte-americanos abriram a sessão de segunda-feira com perdas na casa dos 1,5%, que se alastraram para a Europa, embora a recuperação nos EUA tenha feito com que as praças europeias escapassem aos mínimos da sessão.

Pedro Lino considera que os chineses “estão a fazer tudo por tudo” para alcançarem um acordo. “Sinal disso é que é não cancelaram a ronda negocial desta semana” e isso tem aliviado o sentimento dos investidores, com o S&P 500, o Nasdaq e o Dow Jones a recuperarem ao longo da sessão, tal como aconteceu com as congéneres europeias.  Ainda assim, na segunda-feira, o S&P 500 desvalorizou 0,45%, para 2.932,52 pontos, o Nasdaq perdeu 0,66%, para 7.794,09 pontos; e o Dow Jones cedeu 0,25%, para 26.438,48 pontos.

A verdade é que os mercados têm subido quase de forma ininterrupta na última década, explicou o analista, Pedro Lino, da DIF Broker, uma corretora. “Não temos recessão económica e os bancos centrais continuam a estimular a economia”, disse.

Resta, pois, saber interpretar os tweets de Donald Trump e a queda dos três principais índices norte-americanos, especialmente depois de o presidente da Reserva Federal norte-americana ter falado na mitigação dos riscos externos para a economia norte-americana, nomeadamente as negociações comerciais entre os EUA e a China.

Pedro Lino referiu que, perante a incerteza, “os investidores estão a realizar mais-valias”, isto é, “parte dos portfólios estão a transformar-se em liquidez”. Ou seja, os investidores estão a ser cautelosos, preferindo vender com ganhos do que esperar e segurar os títulos perante a incerteza em torno da guerra comercial.

O analista frisou que, em face das quedas registadas segunda-feira, não se pode falar em correção. “Uma queda de 2% [próxima do que se verificou no início da sessão] é significativa porque é rara e, desde que Trump assumiu a presidência, os mercados bolsistas subiram 30%”.

Quais as tarifas já em vigor nos EUA?

Desde que começou a guerra comercial com a China, a administração Trump já aumentou as tarifas às importações de determinados produtos. Em junho de 2018, o Executivo norte-americano impôs tarifas de 25% em produtos chineses do setor tecnológico no valor de 50 mil milhões de dólares. A medida abrangeu as importações de automóveis, comunicações, robótica e o setor aeroespacial.

Seguiu-se o aumento para 10% – com a ameaça de outro aumento para 25% – sobre as tarifas às importações de produtos alimentares, materiais de construção, alarmes e até peças para bicicletas, no valor de 200 mil milhões de dólares.

Como em qualquer guerra, a China retaliou e aumentou as tarifas às importações de certos produtos norte-americanos no valor de 110 mil milhões de dólares, incluindo rebentos de soja, automóveis, produtos alimentícios, malas de viagem e eletrónica.

Depois da China, a Europa?

Os analistas do Commerzbank lembram que Donald Trump também tem a União Europeia (UE) debaixo de olho, porque também considera que o défice comercial que os EUA têm com a UE é injusto, nomeadamente no setor automóvel alemão. No ano passado, o Departamento de Comércio dos EUA preparou um relatório no qual alertou Trump para o facto de as importações de automóveis europeus constituírem uma ameaça à segurança nacional dos EUA.

O presidente dos EUA tem até meio deste mês para se pronunciar e, caso concorde com a opinião do Departamento de Comércio, poderá impor tarifas às importações de automóveis europeus. “Os europeus devem preparar-se para Trump permanecer verdadeiro à sua auto-análise de “Homem das Tarifas'”, alertam os analistas do Commerzbank.

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