Um cidadão do mundo exercita “silêncio” na galeria lisboeta Vera Cortês. Conhecido pela forma como afronta e dialoga com os espaços onde intervém, Carlos Bunga fez do cartão e de tintas coloridas materiais de eleição. Traça arquiteturas dentro de outra arquitetura e tem vindo, paulatinamente, a introduzir nas suas intervenções objetos quotidianos, como mesas, cadeiras, camas. Tece odes usando madeira, cartão, chapa de mdf, tecido repudiado, redes que trazem a sua história silenciosa para dentro do ‘universo Bunga’.
No caso de “Silence”, as cores foram preteridas, pela primeira vez, pelo preto. Será essa a cor do medo? Chamando à colação Carlos Drummond de Andrade, e o seu poema “O Medo”, dele retiramos umas breves estrofes: “Em verdade temos medo. / Nascemos escuro. / Nossas existências são poucas: / Carteiro, ditador, soldado. / E fomos educados para o medo / Cheiramos flores de medo / De medo, vermelhos rios / vadeamos.
Aqui não temos “vermelhos rios”. Temos pinturas encerradas em caixas de madeira ou cartão, a rasar o chão, que lembram plantas de casa, nuns casos, ou celas de prisão em duas delas, pois não vislumbramos saída. E também pinturas aplicadas sobre tecidos. Será um luto pelo planeta, perante a avalancha de guerras, de irracionalismo, de catástrofes a que chamam naturais mas que são resultado da ação humana…? Proposta para pararmos, refletirmos, repensarmos caminhos?
No texto de Agnaldo Farias (Faculdade da Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo), que acompanha a exposição, este questiona: “Mas não foi sempre assim? Segundo Jorge Luis Borges, Frank Kermode, autores dedicados a repassar as literaturas escatológicas, todos os tempos são ruins, todos vaticinam e vaticinavam o final dos tempos”.
Não temos a ousadia de ler o pensamento do artista, mas quiçá o terrível silêncio de Carlos Bunga nesta exposição seja, afinal, extremamente ruidoso, incómodo, ensurdecedor.
“Silence” pode ser vista na Galeria Vera Cortês, Lisboa, até 31 de outubro.
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