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OE/17: Bruxelas e Governo com diferença de 945 milhões de euros nas contas

Falta informação que permita a Bruxelas perceber na totalidade as contas do Governo. Lisboa tem até amanhã ao fim do dia para enviar mais detalhes.
Cristina Bernardo
26 Outubro 2016, 16h25

Entre os resultados prometidos pelo Governo no Orçamento do Estado para 2017 e da Comissão Europeia sobre as medidas para lá chegar, há neste momento um buraco de cerca de 945 milhões de euros. É esse ajustamento que Bruxelas quer ver melhor explicado, sabe o Jornal Económico.

Parece déjà vu, mas não é. No Orçamento de 2016, a Comissão e o Governo tiveram mesmo fortes diferenças em relação às medidas de ajustamento nele inscritas, com o executivo comunitário a rejeitar algumas das propostas de Lisboa, ou a duvidar do valor das mesmas. Agora, o cenário é diferente: não é que Bruxelas duvide das medidas, quer é ter mais informação sobre as mesmas, para perceber como se chega às metas prometidas.

O Governo comprometeu-se a atingir um défice de 1,6% do PIB no próximo ano, complementado com um ajustamento estrutural – o esforço de consolidação descontado do efeito do ciclo económico – de 0,6% do PIB. Para lá chegar, conta sobretudo com o efeito do crescimento económico e da inflação (903 milhões), com as garantias estatais do BPP (450 milhões) e dividendos do Banco de Portugal (303 milhões).

À Comissão, o que interessa mais é mesmo o ajustamento estrutural. Houve até uma recomendação específica a Portugal, para reduzir os 0,6 pontos percentuais no próximo ano. E o que é dito na carta enviada para Lisboa não é que não se acredite nas medidas para lá chegar, mas sim que falta informação para perceber se as contas batem certo.

Posto de outra forma: o Executivo prometeu um ajustamento estrutural na ordem dos 1.135 milhões de euros, mas a informação que chegou a Bruxelas só permite à Comissão ver um ajustamento de 190 milhões. Contas feitas, há uma “pequena” diferença de 945 milhões.

O Governo tem até amanhã ao fim do dia para enviar mais informação a Bruxelas, que permita fazer uma análise a fundo das medidas de consolidação e o seu impacto.

Orçamento não parece estar em risco

A relação entre Bruxelas e Lisboa foi melhorando ao longo do ano, depois do episódio do Orçamento de 2016. Houve uma construção de bases de confiança, que tem sido referida por ambos os lados e que permitiu discutir o OE/17 de outra forma.

Talvez por isso, o Governo esteja tão confiante de que o documento vai acabar por ter luz verde. O ministro das Finanças, Mário Centeno, o secretário de Estado do Tesouro, Ricardo Mourinho Félix, e o secretário de Estado do Orçamento, João Leão, têm repetido a mensagem de que praticamente não há hipótese de o OE vir devolvido.

Ao Jornal Económico, fonte comunitária explica que, de facto, a situação é diferente este ano, algo que é visível na carta, onde desta vez é pedida mais informação, ao invés de mais medidas. A aprovação do Orçamento não parece, por isso, estar em causa, até porque Bruxelas acredita que a informação que vai receber do Executivo português irá permitir perceber os impactos das medidas de consolidação e o resultado do ajustamento estrutural.

No entanto, a mesma fonte lembra que o processo de avaliação e aprovação dos orçamentos mantém-se o mesmo, ou seja, a Comissão não aprovou nada previamente e precisa de ter toda a informação necessária, que mostre que as contas batem certo. Até porque a Comissão precisa ter bases sustentadas para recomendar ao Eurogrupo – que tem mostrado uma posição menos flexível em matéria orçamental – a aprovação do documento.

Queixas de falta de informação são tranversais

A Comissão Europeia é apenas a mais recente das queixosas sobre a falta de informação no OE/17.

Esta semana, o PSD – primeiro – e a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) – depois) – também se queixaram que o documento tem falhas de informação, nomeadamente ao nível do valor das receitas por imposto e das contribuições sociais. Além disso, a UTAO critica o Governo por ter decidido comparar as previsões de receitas e despesas em 2017 com as previsões para 2016, ao invés de as comparar com a execução real.

É que a execução do ano está a ir totalmente ao lado do que foram as previsões do OE/16, com as receitas a crescer abaixo do esperado e a despesa ligeiramente acima – está a ser contida com um apertão no investimento que não tinha sido programado.

Bruxelas parece partilhar a mesma visão, já que, na carta enviada a Lisboa, pede detalhes sobre as premissas que sustentam a previsão de receitas para o próximo ano em termos dos vários impostos, das transferências e das contribuições sociais. Além disso, apela também a que Portugal envie “informação actualizada sobre a execução em 2016”, bem como mais detalhes sobre os pagamentos que deverão ser recebidos ao abrigo do perdão fiscal este ano.

No caso do perdão fiscal, aliás, não é ainda certo que a Comissão aceite a ideia de que as prestações do mesmo sejam consideradas como receita estrutural. Algo que, a acontecer, poderá não ser um grande problema, tendo em conta a dimensão das mesmas e a ideia de que Bruxelas pode deixar passar uma ou outra décima a menos. No entanto, antes sequer de avaliar isso, o executivo comunitário precisa de outras informações que lhe permitam perceber as contas de Lisboa.

 

 

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