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OE2020 traz agravamento nas taxas de IMI e IMT

Especialistas defendem que as novas medidas do Orçamento a serem aprovadas, na prática, redundam “em apenas mais dinheiro para o Estado”. Adiamento do englobamento considerado como positivo.
9 Fevereiro 2020, 12h00

O Orçamento do Estado para 2020 (OE2020) trouxe alterações para o setor imobiliário que não foram bem acolhidas junto do setor. O agravamento do Imposto Muncipal sobre Imóveis (IMI) e do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onorosas de Imóveis (IMT) são apontados como prejudiciais pelos analistas consultados pelo Jornal Económico.

A proposta do OE2020, introduz um agravamento do IMI para os edifícios em ruínas e terrenos em zonas de pressão urbanística. Atualmente, a taxa oscila entre os 0,2% e os 0,5%, mas o Executivo pretende multiplicar por seis, aumentando em 10% em cada um dos anos seguintes até atingir o máximo de 12 vezes sobre a taxa atual.

“Embora pareça fazer algum sentido, principalmente em relação aos prédios devolutos, esta é uma medida excessiva e que terá pouco impacto no objetivo pretendido. Aliás, usar a fiscalidade de forma negativa – através da penalização da tributação – nunca foi uma forma eficiente de regular qualquer mercado. Se o objetivo for dinamizar imóveis devolutos ou em ruína, crie-se políticas fiscais promotoras da reabilitação urbana”, defende Armando M. Oliveira, advogado especialista em direito fiscal da Aventino & Associados.

Inês Pereira de Melo, advogada em matéria fiscal da Carlos Pinto de Abreu & Associados, explica que as zonas de pressão urbana são definidas por uma procura de imóveis muito superior à oferta, “ou na qual esta é desajustada à realidade financeira da maior parte das famílias, com valores muito mais elevados que aqueles que o comum cidadão pode pagar” e que “o prédio devoluto ou imóvel desocupado em situação aferida através da inexistência de contratos de serviços básicos (como água e luz) ou do consumo mínimo destes serviços”. Para a especialista, esta medida não representa mais do que uma punição aos proprietários de imóveis desocupados.

“Não será, pois, o agravamento do IMI que fará com que os referidos imóveis sejam colocados no mercado de arrendamento”, realça. “Ainda que a intenção do Governo seja fomentar o arrendamento, parece-me que não será atacando e onerando a propriedade privada dos contribuintes que o conseguirá, já que a maior parte dos proprietários apenas não arrenda os imóveis por falta de confiança na legislação que regula o arrendamento, sempre a mudar e para pior, ou por falta de verbas para realizar obras necessárias, até porque não há incentivos e apoios”, refere.

Vanessa de Sousa Mendes, docente no Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa (ISCAL) e fiscalista, e Carlos Nunes, professor adjunto no ISCAL e advogado, explicam os diferentes efeitos que a medida terá nas grandes cidades e no interior do país.

“Imaginemos um prédio em ruínas na zona das Avenidas Novas em Lisboa, como existem. O Valor Patrimonial Tributário (VPT) desse prédio deverá ter como base uma aquisição com um tempo muito longo e ainda que alvo de atualização, por via oficiosa, encontra-se muito abaixo do preço de mercado”, exemplificam, salientando que o aumento do IMI neste caso será “perfeitamente irrelevante para o efeito pretendido”, já que o agravamento “é consumido e incorporado no diferencial do mercado”.

Por outro lado, para um prédio em ruína/devoluto no interior do país terá um investimento superior ao valor do mercado e “não é o gravame fiscal que fará mudar de ideias”. “Podemos multiplicar os casos, mas estes ilustram a situação nas suas duas vertentes. Assim, e embora a intenção, declarada, seja boa, na prática, redunda, apenas, em mais dinheiro para o Estado, a verificar-se”, acrescenta.

 

Agravamento do IMT “é apenas mais dinheiro para o Estado”
Outra das medidas introduzidas pelo OE2020 é a implementação de uma nova taxa de Imposto Municipal Sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT), com um agravamento da taxa de 6% para 7,5% na aquisição de prédios urbanos destinados à habitação num valor superior a um milhão de euros.

Para imóveis cujo valor se fixe entre os 574.323 euros e um milhão de euros será aplicada a taxa única de 6%.

Para Vanessa de Sousa Mendes, docente no Instituto Superior de Contabilidade e Administração de Lisboa (ISCAL) e fiscalista, e Carlos Nunes, professor adjunto no ISCAL e advogado, a medida traduz-se apenas por “mais dinheiro”, considerando que Portugal é quem sai mais prejudicado, dado que “transmite o que não se quer transmitir, de molde algum, que é a falta de estabilidade fiscal”.

“O investimento estrangeiro em imobiliário é tão digno de proteção como outro qualquer, num Estado de Direito”, dizem, acrescentando que “a manutenção da taxa, ou de taxas, em geral, é sempre um sinal de um Orçamento são e de uma estrutura fiscal que transmite confiança”.

Apesar de não ter integrado as propostas do OE2020, o englobamento dos rendimentos prediais é uma medida que poderá estar no horizonte desta legislatura. Antes da entrega da proposta no Orçamento, num debate quinzenal em outubro, António Costa sinalizou a intenção de avançar com o englobamento no caso dos rendimentos prediais, que atualmente beneficiam de uma taxa de 28%, com a faculdade dos proprietários optarem ou não pelo englobamento, caso seja mais vantajoso em termos fiscais. Neste quadro, os rendimentos que atualmente são tributados acima dos 28% serão penalizados com um agravamento da fatura fiscal.

“Seria mais um erro. A expetativa era que esta fosse uma das medidas implementadas com o Orçamento de Estado para 2020, mas tal inteligentemente não sucedeu. Por enquanto, os contribuintes continuam a poder escolher a forma como pretendem que os rendimentos prediais e de capitais sejam tributados: através do englobamento ou através da aplicação de uma taxa de tributação autónoma”, sublinha a fiscalista Inês Pereira de Melo.

Para Armando M. Oliveira “dificilmente a medida será aprovada pelo parlamento”.

“Se este Governo se mantiver em função durante toda a legislatura será, parece-nos, com base em muitas cedências à esquerda. Neste pressuposto esta será, sem grande margem para dúvidas, uma das medidas impostas pela esquerda para a aprovação de um dos orçamentos da presente legislatura”, justificou.

 

Englobamento pode trazer “agravamento brutal de impostos”
No caso desta medida avançar Vanessa de Sousa Mendes e Carlos Nunes referem que o impacto para os senhorios terá apenas um sentido: “pagar mais imposto”.

“Para os portugueses detentores de capital aplicado, seja em empresas (lucro), seja em meios financeiros (juros e outros) talvez o impacto ainda seja mais significativo, dada a diferença da taxa especial prevista face às taxas gerais/escalões aplicáveis, pelo que, inevitavelmente, irão pagar mais”, assinalam. “Uma vez mais, pode garantir mais receita a curto prazo, mas altera, de forma profunda, o planeamento financeiro dos investidores, que podem decidir por outros países com maior estabilidade fiscal”, concluem.

Por sua vez, Inês Pereira de Melo considera que a ser aprovada “será sempre uma medida polémica e profundamente injusta”.
“O englobamento parece garantir a justiça fiscal, eliminando a diferença existente entre os rendimentos do trabalho e os outros tipos de rendimentos, diminuindo as desigualdades entre aqueles que apenas obtêm rendimentos do trabalho e os que obtêm rendimentos de outras categorias (prediais ou de capitais)”, refere.

No entanto, a fiscalista realça que a medida “esquece a fiscalidade já existente” e pode trazer um “agravamento brutal de impostos para muitos contribuintes que já pagaram ou pagam impostos sobre o património imobiliário como o IMT e o IMI”.
Para Armando M. Oliveira será necessário introduzir medidas para compensar o impacto desta eventual alteração.

“Sem medidas que possam de alguma forma mitigar o impacto desta opção, irá traduzir-se no habitual – um aumento significativo da carga fiscal num mercado que está em alta. Sendo que os principais prejudicados serão os “pequenos” proprietários sem estrutura empresarial”, explica o fiscalista. “Irá existir um agravamento sensível e injusto de impostos para muitos portugueses. Para qualquer contribuinte cujo rendimento colectável anual, depois de feitas as deduções específicas e abatimentos, seja superior a 10.732 euos, a taxa a aplicar será de 28,5%, já superior à taxa de 28% da tributação autónoma. O mesmo se dirá relativamente aos contribuintes com rendimentos mais elevados, uma vez que a taxa de IRS aplicável poderá ir até aos 48%, a que acrescerão os impostos indiretos”, conclui.

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