Em inúmeros sectores de actividade, Portugal tem sido notícia pelos índices reveladores de desenvolvimento acelerado. A nossa identidade e originalidade conquistam a apreciação dos demais povos deste mundo, provocando a justificada exaltação do nosso orgulho nacional e portugalidade.

Temos vindo a destacar-nos em quase todas as áreas de afirmação criativa. Lisboa e Porto são apenas as faces mais visiveis de um melting pot criativo que abrange todo o país. Da inovação tecnológica às artes, passando pelo empreendedorismo, os portugueses apresentam ao mundo novos conceitos, ideais e inspirações, sempre imbuídos deste tão peculiar modo de ser português, deste nosso espírito de sã convivência e tolerância fraterna donde resulta uma identidade original e autêntica, que para muitos constitui até o paradigma da futura sociedade global.

E como é que a nossa indústria publicitária, por excelência uma das mais criativas e que vive muito do talento que brota na sociedade, obtém apenas oito singelos prémios em 185 participações na edição 2017 do festival Cannes Lions (sete short-list e um Bronze)? É que Cannes é mesmo um festival de prémios: 4.464, distribuídos por 25 categorias, ou seja, o melhor de Portugal em Cannes devia ser mesmo muito fraquinho para conquistar tão pouco!

Será por falta de talento na indústria publicitária em Portugal? Será que não temos bons criativos, capazes de competir à escala global? Será que são imunes à fonte de inspiração que actualmente este país é? Ou será que estão fora da corrente criativa que o está a energizar?

Ah, o problema são os clientes! – dizem uns. Ah, o problema são os budgets! – dizem outros. Cannes não interessa para nada! – dizem ainda outros. Demasiadas desculpas medíocres, que denunciam o que um verdadeiro talento nunca pode ser.

Recuso-me a acreditar que os criativos em Portugal valem apenas oito singelos prémios no festival que mais premeia a melhor criatividade e talento desta indústria em todo o mundo. Recuso-me a acreditar que neste domínio somos apenas “fraquinhos” (mesmo apesar do que por cá se vê “on” e “off-line” o poder confirmar…). Não, não acredito que tenhamos menos talento nesta indústria do que aquele que exibimos em tantas outras.

Acredito é que falta mais coragem do que talento, há mais medo do que paixão, demasiados “neoliberais” e menos idealistas. Que há pouca auto-estima e demasiados “gajos importantes”. Que é escassa a imaginação e exagerada a tontice. Que há pouca vergonha e demasiada arrogância, muitas colunas, mas poucas vertebrais.

O medo tolhe e inibe. O caos liberta e sem liberdade não há criatividade. Há que combater o medo, lutar pela liberdade de criar, acreditar conseguir fazer melhor, ter coragem para ser diferente e gerar novas ordens. Cada um tem de o fazer, primeiro na sua mente, depois no seu trabalho, na sua agência, junto dos seus clientes, etc. Nunca a comunicação e a criatividade foram tão importantes como elementos diferenciadores, pois nunca produtos/serviços foram tão similares e ausentes de atributos físicos/racionais que os diferenciassem. Nunca, por isso, o talento criativo foi tão precioso para esta indústria e contudo nunca houve por cá tão pouca exibição do mesmo. Apenas parece haver medo e resignação…

Os criativos e esta indústria em Portugal merecem e valem muito mais do que estes oito heróicos mas “envergonhados” prémios em Cannes – temos todos de acreditar e lutar por isso!

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.