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OPA chinesa à EDP corre risco de ficar na mesa de Donald Trump

O comité de investimento estrangeiro dos EUA pode aprovar a compra dos ativos pela China Three Gorges. Mas em qualquer caso de dúvida é o presidente que decide em função da segurança nacional.
  • Presidente chinês, Xi Jinping, e governante norte-americano, Donald Trump, conversam durante evento em Pequim, em 2017
24 Março 2019, 09h00

“Continuamos a progredir com todos os requisitos regulatórios…  em discussões com reguladores em várias jurisdições”. Tem sido esta a resposta recorrente da China Three Gorges (CTG) às perguntas do JE sobre o status quo das condições prévias ao lançamento da oferta pública de aquisição (OPA)_da EDP.

A escassos dias de uma importante apresentação pelo board da EDP aos investidores sobre a estratégia da empresa nos próximos anos (ver texto ao lado), o suspense mantém-se:_quando será dado o próximo passo numa oferta lançada em maio do ano passado?

O foco tem estado na notificação que a CTG planeia registar na Direção Geral da Concorrência (DG Comp) da Comissão Europeia. A previsão é que, tal como a comissária Margrethe Verstager sinalizou no ano passado, a DG_Comp deverá passar a ‘batata quente’ para  a Direção Geral da Energia. Nessa sede, deverão ser levantadas questões sobre a incompatibilidade da oferta com a participação de outras empresas estatais chinesas no setor da energia em Portugal.

Guardião da segurança nacional

No labirinto regulatório que a CTG tem de percorrer, Bruxelas não vai ser o único obstáculo a ultrapassar. No outro lado do Atlântico, e em tempo de tensões sino-americanas, a análise da oferta poderá mesmo chegar ao número 1600 da Pennsylvania Avenue, em Washington, e mais especificamente à secretária do presidente Donald Trump.

Na longa lista de autoridades às quais a CTG_vai ter de pedir aprovação antes de registar a OPA_em Lisboa, além das europeias, sobressai uma norte-americana. O Comité de Investimento Estrangeiro dos Estados Unidos (Committee on Foreign Investment in the United States, CFIUS).

Este poderoso organismo tem como principal função analisar algumas transações que envolvem investimento externo nos EUA_“para determinar o impacto na segurança nacional”. Composto pelos líderes dos principais órgãos executivos da administração Trump, incluindo os departamentos do tesouro, da justiça, da energia, da homeland security ou dos negócios estrangeiros, o comité viu os seus poderes reforçados no ano passado. As novas regras que o CFIUS_pode aplicar não são específicas em relação aos países de origem dos investidores, mas foram vistas como mais um passo na tentativa de os Estados Unidos impedirem empresas chinesas de terem acesso aos segredos tecnológicos norte-americanos.

O_CFIUS_não lida, no entanto,  só com tecnologia e vai ser a primeira porta à qual a CTG_vai ter de bater numa OPA_em que um dos grandes atrativos são, precisamente, os atraivos nas renováveis da EDP nos EUA.

O processo pode começar pela entrega de um draft notice para verificar se os documentos estão completos ou diretamente com uma notificação formal. O staff chairperson do CFIUS_analisa se o processo está completo e envia-o para os restantes membros do comité. A_análise pode durar até 45 dias. Se o comité decidir que a transação não apresenta riscos à segurança nacional a transação é aprovada.

Esta é, contudo, a única situação em que o CFIUS_pode tomar a decisão sozinho, em todos os outros casos tem de passar a análise para o presidente.

Rejeição tem de ter apoio do presidente

A seção 800 dos regulamentos da Departamento do Tesouro sobre fusões, aquisições e takeovers por estrangeiros é clara. A decisão final fica nas mãos do presidente dos EUA se o CFIUS_recomendar a suspensão ou a proibição da transação, ou se o comité não conseguir chegar a uma decisão sobre a recomendação. Mesmo sem estes cenários, o CFIUS_pode simplesmente pedir ao presidente para tomar uma decisão. Em qualquer destes casos, Donald Trump teria 15 dias para comunicar o veredito.

Entre os 11 fatores que o chefe de Governo tem de ter em consideração, os dois últimos da lista deverão ser os mais importantes se a OPA_da CTG_chegar às mãos de Trump. O penúltimo refere “a projeção a longo prazo das necessidades dos EUA_em termos de fontes de energia e outros recursos e materiais críticos”, enquanto o último permite ao presidente determinar qualquer outro fator relevante.

Questionada  pelo JE, fonte oficial do Departamento do Tesouro respondeu que, por lei, processos que possam ter sido registados com o CFIUS_não podem ser divulgados ao público. “Desse modo, o Departamento não comenta informação relativa a casos específicos do CFIUS, incluindo se certas partes entregaram ou não notificações para análise”.

A_Embaixada dos Estados Unidos em Lisboa também rejeitou comentar. No entanto, durante uma visita a Lisboa em dezembro, Roland de Marcellus, vice-secretário-adjunto do Departamento de Estado dos EUA para Finanças Internacionais e Desenvolvimento, questionado pelo “Expresso” sobre se os investimentos chineses na EDP são uma preocupação para os EUA, disse que a administração norte-americana recomenda uma “vigilância reforçada sempre que as empresas que adquirem sejam detidas ou controladas por um Governo estrangeiro, ou afiliadas”. Principalmente, “quando os investidores estrangeiros beneficiam de acesso a subsídios estatais que lhes dão uma vantagem desleal face aos concorrentes comerciais, ou quando estão a agir com base em motivações estratégicas e não de natureza comercial”.

Além do CFIUS, a CTG_terá também de obter a autorização nos EUA da Federal Energy Regulatory Commission. Até ao momento, a única aprovação foi dada pelo Conselho Administrativo da Defesa Económica do Brasil. No mesmo país, a Agência Nacional de Energia Elétrica Brasileira referiu ao JE_que foi informada pela EDP sobre a OPA_em maio de 2018, mas adiantou que “não foi apresentado até ao momento um pedido formal de anuência prévia referente aos eventuais efeitos da operação”.

Artigo publicado na edição nº1979 de 8 de março do Jornal Económico

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