Após 243 dias em análise, em Maio de 2016, a Comissão Europeia (“Comissão”) proibiu a operação de concentração pela qual a Hutchison 3G UK Investments Ltd (“Three UK”), se proponha adquirir a Telefónica Europe Plc. (“O2”), resultando numa entidade que combinaria a Three UK e a O2, e que daria origem a uma nova liderança, com cerca de 40% de quota no mercado das telecomunicações móveis no Reino Unido, onde passariam de quatro a três operadores.

Tradicional e tipicamente, o sector das telecomunicações surgiu de situações de monopólio, paradigma que sofreu profundas alterações nas últimas décadas. No Reino Unido, à semelhança do que acontece noutros Estados-membros (EM), e um pouco por todo o mundo, o sector das telecomunicações móveis é relativamente concentrado sem que isso seja necessariamente problemático. Caso a operação em causa tivesse sido implementada, a estrutura de mercado apresentaria ainda dois concorrentes relevantes, a Vodafone, e a Everything Everywhere (uma unidade de negócio da British Telecom).

A Comissária Margrethe Vestager tomou posse como responsável pela DG Concorrência em Novembro de 2014, e a proibição em causa foi a sua primeira. Se considerarmos apenas o sector das telecomunicações, esta terá sido a segunda proibição Europeia em 25 anos. No mandato do seu antecessor, Joaquín Almunia, temas idênticos tiveram desfechos distintos.

Destacamos três operações no mesmo sector, que também implicaram a passagem de quatro a três operadores, e tiveram luz verde da DG Concorrência. Essas operações (H3G/Orange Áustria; H3G Ireland/O2; e Telefónica Deutschland/E-plus) foram aprovadas por via da apresentação de compromissos, i.e. remédios que limitam os termos da implementação da transacção e que visam assegurar soluções para as preocupações ou para os entraves identificados à concorrência efectiva, actual ou potencial.

No caso Three UK / O2, entre outros aspectos, a Comissão entendeu que a operação suscitaria efeitos (anti-concorrenciais) unilaterais – aumento de preços – no mercado retalhista, bem como uma limitação das opções dos consumidores em consequência da redução do número de operadores presente no mercado.

O Tribunal Geral da UE veio agora dar razão ao então comprador, rejeitando as conclusões da análise da Comissão. Em particular, declarou que a avaliação da Comissão sobre esses efeitos unilaterais padece de vários erros de direito e de apreciação. Neste particular, o Tribunal Geral recorda que as normas de concorrência visam proteger o processo competitivo, e que o simples efeito de redução das pressões concorrenciais sobre os outros concorrentes não é, em princípio, por si só, suficiente para demonstrar um entrave significativo a uma concorrência efectiva.

Adicionalmente, e no que toca ao argumento da Comissão de que a Three UK constituía uma “força concorrencial importante”, o Tribunal Geral afirma tratar-se de mais um erro de análise, ou seja, que aquela qualificação não se encontra evidenciada ou substanciada.

Também no que se refere a outros argumentos da Comissão, e.g. matérias relacionadas com os acordos de partilha de rede e de infra-estrutura de rede móvel, não ficou demonstrado – declara o Tribunal Geral – que se suscitariam questões jusconcorrenciais relevantes.

Em Portugal, de dimensão relativa comparável, existem três operadores de telecomunicações móveis – tantos quanto existiriam no Reino Unido num cenário pós-operação –, e cuja intensidade competitiva tem beneficiado os consumidores, podendo servir de exemplo vivo na demonstração de alguns dos lapsos de análise da Comissão no caso Three UK / O2.

A decisão da Comissão pode agora ser revertida, o que já não acontece com os seus efeitos práticos face a uma transacção que terá tido os seus timings e contexto em 2016, o que suscita outro tema de relevo: compensação às empresas pelos danos causados por uma decisão ilegal da Comissão. A este propósito, tenha-se presente o processo C-440/07P Comissão c Schneider, também no contexto de controlo de operações de concentração, e pelo qual em 2010 o Tribunal de Justiça declarou o direito da Schneider a uma compensação, por parte da Comissão, por determinadas perdas no âmbito da responsabilidade extracontratual das instituições da UE.