A procuradora do processo Fizz quer a abertura de um inquérito autónomo Daniel Proença de Carvalho e Carlos Silva pela alegada participação do advogado português e banqueiro angolano no caso de corrupção que envolve o ex-procurador Orlando Figueira, e o ex-vice-presidente de Angola, Manuel Vicente. Para o efeito, Leonor Machado entregou um requerimento no Tribunal judicial da Comarca de Lisboa, onde pede a extração de uma certidão a remeter para o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) para que Proença de Carvalho e o ex-presidente do Banco Privado Atlântico (BPA ) sejam investigados pelos indícios de crimes de corrupção, branqueamento e falso depoimento.
No requerimento que deu entrada nos tribunais, no passado sábado 25 de maio, a que o Jornal Económico teve acesso, a procuradora do julgamento (MP), responsável pelo processo Fizz, aponta factos dados como provados no acórdão que condenou o ex-procurador do MP Orlando Figueira e o advogado Paulo Amaral Blanco. Ao longo de mais de 30 páginas, a procuradora Leonor Machado sinaliza as ligações de ambos ao presidente do BPA Carlos Silva, uma das testemunhas do julgamento e que agora poderá vir a ser investigado por corrupção e branqueamento de capitais. E recorda uma escuta telefónica em que Orlando Figueira pede a Proença de Carvalho para o representar no processo.
Ao juiz do Tribunal, a procuradora pede que seja autorizada a extracção de certidão para remeter ao DCIAP “a fim de se proceder a diligências, com vista a averiguar da eventual prática de crimes de corrupção activa e/ou branqueamento de capitais, configurando-se ainda a hipótese do cometimento de crime de falso depoimento por Proença de Carvalho”.
O MP considera que no julgamento foi produzida prova testemunhal e documental que, conjugada com a prova existente nos autos, demonstra, de forma indiciária o envolvimento de Carlos Silva na elaboração dos contratos de Orlando Figueira e Manuel António Costa, administrador da empresa Primagest que pertencia a Carlos Silva.
Segundo o MP, as inquirições de Proença de Carvalho e do advogado Paulo Sá e Cunha, que chegou a ser o advogado de defesa do arguido Orlando Figueira, “afiguram-se essenciais” para o esclarecimento dos factos no que se refere ao envolvimento do banqueiro luso-angolano Carlos Silva.
Recorde-se que a procuradora do MP no julgamento, pediu que o primeiro defensor do arguido Orlando Figueira fosse arrolado como testemunha, alegando ser essencial a sua inquirição após as declarações do ex-procurador. A acusação considerou que, das declarações do arguido, se pode depreender haver um elo de ligação entre o banqueiro Carlos Silva e o ex-vice-presidente de Angola Manuel Vicente, que o Ministério Público acredita ter corrompido o ex-procurador Orlando Figueira com 760 mil euros. Orlando Figueira disse em julgamento que se reuniu com Paulo Sá e Cunha e com o advogado Daniel Proença de Carvalho em setembro de 2017 e que foi Carlos Silva, por intermédio de Proença de Carvalho, quem pagou os honorários do seu primeiro defensor.
Para a procuradora Leonor Machado as ligações entre Carlos Silva e Vicente eram “suficientemente estreitas para que o banqueiro angolano actuasse no seu interesse ou no interesse de outras individualidades com notoriedade em Angola”. E recorda que no decurso do o julgamento verificou-se que, efetivamente, Carlos Silva teve intervenção na contratação do ex-procurador do DCIAP Orlando Figueira para trabalhar para Angola, ou no fabrico do contrato celebrado entre Orlando Figueira e a empresa Primagest.
Segundo o MP, foi com esta empresa pertencente ao universo empresarial da Sonangol que o ex-procurador celebrou um contrato de trabalho fictício, em contrapartida de este ter arquivado processos que visavam Manuel Vicente, antigo presidente da Sonangol, cujo processo-crime foi separado do resto da Operação Fizz e foi enviado para Angola.
A procuradora recorda ainda que “no decurso do julgamento ficou claro que o Orlando Figueira prestou colaboração ao BPAE (BPAEuropa), quando já estava no exercício de funções no Compliance do BCP em 2013 e se encontra com Blanco a sugerir-lhe a compra de um parecer para o processo da ‘Edimo’”. O MP recorda “a factualidade referida por Paulo Blanco relativa a Carlos Silva fortalece os indícios (…) e que os contactos tidos podem ter tido como intuito facilitar a transferência de fundos para Orlando Figueira e a colocação do mesmo em posição profissional naqueles Bancos”.
Já no julgamento a procuradora do MP sinalizou “a relação de amizade e cumplicidade” entre Orlando Figueira e Paulo Blanco e que “não subsistem dúvidas” de que a empresa Portmill, que adquiriu apartamentos no Estoril, pertencia à A4, cujos sócios eram Manuel Vicente e o general Kopelipa.
Em dezembro do ano passado, o ex-procurador do MP Orlando Figueira foi condenado em dezembro a seis anos e oito meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva qualificada, branqueamento de capitais, violação do segredo de justiça e falsificação de documentos, condenando-o ainda a proibição de funções na magistratura durante cinco anos. Já o advogado Paulo Amaral Blanco a quatro anos e quatro meses de prisão com pena suspensa no âmbito do processo Fizz, tendo o tribunal considerado que foi coautor nos crimes de corrupção ativa, branqueamento de capitais e violação de segredo de justiça
Em relação ao empresário Armindo Pires, considerado “testa de ferro” de Manuel Vicente, o tribunal entendeu que “a conexão dos factos no processo não é abundante e que são insuficientes para lhe atribuírem os factos que lhe são imputados” pela acusação.
O processo Operação Fizz está relacionado com alegados pagamentos, de mais de 760 mil euros, do ex-vice-Presidente de Angola Manuel Vicente e a oferta de emprego a Orlando Figueira para ir trabalhar como assessor jurídico do Banco Privado Atlântico, em Angola, em contrapartida pelo arquivamento de inquéritos em que o também antigo presidente da Sonangol era visado, designadamente na aquisição de um imóvel de luxo no edifício Estoril-Sol, por 3,8 milhões de euros.
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