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Os muito discretos japoneses que salvaram Portugal do apagão

O país foi salvo do blackout pela central a gás mais antiga do país que é detida por esta empresa japonesa, a par da barragem da EDP de Castelo do Bode. Contrato atual vigorava até 2026, mas depois do bom trabalho, Governo anunciou o prolongamento do seu contrato e que quer manter central operacional até 2030.
30 Abril 2025, 07h30

A vida de todos os habitantes da Península Ibérica mudou em apenas cinco segundos na segunda-feira. Em apenas 5 segundos, colapsaram 15 gigawatts de produção de eletricidade em Espanha, 10 gigas solares e 3,3 gigas nucleares, tendo arrastado Portugal pelo meio.

No primeiro evento registado pelas 11h35 em Portugal na rede espanhola, o sistema aguentou e geriu a perda de produção elétrica. Mas, 1,5 segundos depois, novo evento e foi-se tudo abaixo em toda a rede de Portugal e Espanha.

Centrais solares na região da Andaluzia são as principais suspeitas. Novas centrais que se apressaram para começar a vender eletricidade e a rentabilizar o projeto, conforme apontou um promotor português.

Com o sistema totalmente em baixo, Espanha teve a ajuda dos vizinhos Marrocos e França para conseguir voltar a arrancar novamente com a produção de eletricidade e para o sistema arrancar com segurança total. Mas Portugal só tem um vizinho, e este estava em baixo, o que obrigou a acionar os mecanismos black start nas centrais do Castelo do Bode e da Tapada do Outeiro.

A primeira é a barragem da EDP localizada perto de Tomar no distrito de Santarém, com 160 megawatts. A segunda é uma central a gás natural junto ao rio Douro, em Gondomar, distrito do Porto, com 1 gigawatt de potência, uma gigante elétrica para a escala nacional.

Até esta semana, era praticamente desconhecida da maioria dos portugueses, mas é uma central chave para o norte do país e, como se pode comprovar agora, é crucial para todo o sistema elétrico nacional.

Esta central é determinante para assegurar a segurança de abastecimento de eletricidade no grande Porto e no norte do país, onde vivem mais de 3,5 milhões de portugueses e onde está concentrada uma parte importante da indústria nacional.

Mas quem são os japoneses da Marubeni? É uma empresa fundada há 167 anos com sede em Tóquio. Na realidade, é um conglomerado, operando em vários setores além do energético, incluindo os setores alimentares, agrícola, químico, financeiro, tecnologia, aeroespacial, infraestruturas, minérios, entre outros.

Uma das suas características é serem muito discretos, à boa maneira nipónica, evitando ao máximo a exposição pública ao longo dos 12 anos que se encontram no país.

Chegaram a Portugal em 2013 quando compraram 50% da Trustenergy à francesa Engie. Esta sociedade chegou a ser o segundo maior produtor de eletricidade do país, detendo as centrais a carvão, e de gás, do Pego, a par da Tapada do Outeiro e várias centrais eólicas.

Já em 2016, entraram no capital da Galp Gás Natural Distribuição comprando 22,5% da empresa que pertencia então à petrolífera a meias com a também nipónica Toho Gás. Em 2021, a Allianz Capital Partners comprou os restantes 75% à Galp e a empresa tornou-se então a Floene, com os sócios nipónicos ainda a bordo com 22,5%.

Mas o casamento franco-nipónico durou apenas 12 anos. No final de 2024, as duas empresas concluíram o divórcio com direito a separação de bens. A Engie ficou com a central a gás do Pego, enquanto a Marubeni ficou com a central a gás da Tapada do Outeiro. No total, separaram 3 gigas de capacidade de produção, incluindo ativos eólicos.

“Este incidente reforça o papel essencial da Central da Tapada do Outeiro na resiliência do sistema elétrico nacional, bem como o compromisso das suas equipas em assegurar a continuidade e a fiabilidade do fornecimento de energia aos portugueses”, disse a Turbogas na terça-feira depois do seu papel crucial para recuperar o país do apagão.

O Governo decidiu este ano prorrogar o contrato da central até 31 de março de 2026. “Esta prorrogação teve como principal objetivo garantir o tempo necessário para o lançamento e desenvolvimento do procedimento concursal relativo à capacidade da Central da Tapada do Outeiro após essa data. O concurso público será preparado no decorrer deste novo prazo”, disse ao JE o ministério do Ambiente e da Energia.

A Rua do Século destaca que esta central continua a não operar em mercado “funcionando como unidade de resguardo para garantir a segurança do abastecimento e assegurar a função de black start, conforme previsto no contrato. Aliás, esta necessidade foi acionada no dia 28 de abril de 2025″.

“O atual Governo, mesmo em gestão, continua a acompanhar o processo. Como referido pelo Primeiro-Ministro, foi já tomada a decisão de manter a função de black start da Central da Tapada do Outeiro até março de 2026, e estão a ser acionados os mecanismos necessários para que essa função possa ser prorrogada até 2030″, segundo o gabinete de Maria da Graça Carvalho.

A Tapada do Outeiro tem estado nas notícias ao longo dos últimos anos por diferentes razões. O seu Contrato de Aquisição de Energia (CAE) terminou, inicialmente, no final do primeiro trimestre de 2024, contando atualmente com 28 anos sendo a central a gás mais antiga do país.

Apesar do primeiro a gás ter tido lugar em dezembro de 1997, a entrada em serviço industrial teve lugar no final de 1999, tendo representado um investimento de 700 milhões de euros.

Em 2022, o então ministro do Ambiente Duarte Cordeiro anunciou que iria lançar um novo concurso para a licença de produção desta central.

O diretor-geral da Turbogás chegou a anunciar em novembro de 2022 que a companhia pretendia avançar para a produção de hidrogénio verde.

A 5 de julho de 2023, o então diretor-geral de Energia João Bernardo anunciou que o concurso seria lançado em breve. Mas nunca chegou a ser.

Em novembro de 2024, a então secretária de Estado da Energia, Maria João Pereira, disse que o Governo queria lançar o concurso público para a concessão da central termoelétrica da Tapada do Outeiro, em Gondomar até março de 2025, tendo sido alargado até 2026.

“Incidente reforça o papel essencial da Central da Tapada do Outeiro”

De desconhecida para a maioria dos portugueses para celebridade nacional. A central a gás natural da Tapada do Outeiro da Turbogas em Gondomar, distrito do Porto, foi uma das duas que assegurou o arranque do zero do sistema elétrico nacional, a par da barragem de Castelo de Bode, da EDP.

“Na sequência do apagão geral que atingiu o país na manhã de 28 de abril, a Central da Tapada do Outeiro concretizou ontem com sucesso o procedimento de arranque autónomo (“black start”) após ter sido instruída pelo gestor global do sistema (REN). Isto permitiu dar início ao processo de reposição da rede elétrica nacional, confirmando assim a sua relevância enquanto infraestrutura crítica para garantir a segurança e estabilidade do sistema elétrico, demonstrando, uma vez mais, a sua importância estratégica para o sistema energético do país”, disse hoje a Turbogas.

“Em resposta ao incidente registado a partir das 11h30 do dia 28 de abril, na rede elétrica ibérica, a Turbogás (empresa detida pelo grupo EML S.A.), mobilizou todos os seus recursos, de forma célere, demonstrando elevada competência técnica e uma forte capacidade de atuação em situações de elevada exigência e criticidade”, destacou a companhia.

Desta forma, a energética disse que “no âmbito dos acordos estabelecidos, a Central da Tapada do Outeiro continua a manter a mais elevada operacionalidade, com todos os esforços concentrados na estreita colaboração com a REN, contribuindo de forma decisiva para garantir a segurança e a reposição integral do sistema elétrico nacional, mesmo nas situações mais críticas como a ocorrida”.

Governo quer mais duas centrais elétricas com mecanismo ‘black start’

O Governo anunciou na terça-feira que quer mais duas centrais com mecanismo black start para reiniciar mais rapidamente o sistema elétrico depois de um  apagão: as barragens do Baixo Sabor, detida pelos franceses da Movhera, com 144 MW, e a do Alqueva, detida pela EDP, com 255 MW.

“Vamos aprofundar todo o procedimento com vista a concretizarmos a função de black start de mais centrais”, disse o primeiro-ministro Luís Montenegro.

“Se há ilação que podemos tirar é que a central da Tapada do Outeiro e de Castelo de Bode são insuficientes do ponto de vista da rapidez. É preciso um mecanismo que torne mais célere a capacidade de recuperação e superação de uma circunstância como vivemos ontem”, acrescentou em conferência de imprensa, congratulando a capacidade das duas centrais que ontem permitiram que o país voltasse à normalidade após o apagão.

Luís Montenegro também anunciou que o sistema de black start da Tapada do Outeiro vai ser prolongado de março de 2026 até março de 2030 para assegurar a segurança elétrica do país

O governante também anunciou que o Governo vai solicitar uma auditoria independente aos sistemas elétricos para apurar a origem da falha e anunciou a criação de uma comissão técnica independente para avaliar os “mecanismos de gestão e reação desta crise, da resiliência e recuperação do sistema elétrico, da resiliência das infraestruturas e serviços críticos e também ao funcionamento do sistema de proteção civil, de comunicações e da área da saúde”.

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