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Parlamento vai enviar transcrição da audição de Berardo para o MP

Vai ser pedido com “urgência” aos serviços do Parlamento a transcrição da audição de Joe Berardo que esteve na sexta-feira, 10 de maio, mais de cinco horas do Parlamento a responder aos deputados da comissão de inquérito à gestão da CGD. Objetivo: a Justiça avaliar se há matéria criminal relevante com base nas declarações do empresário madeirense.
16 Maio 2019, 07h46

O presidente da II Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos (CGD) e à Gestão do Banco quer enviar a transcrição da audição de Joe Berardo ao Ministério Público para a Justiça avaliar se há, ou não, matéria criminal relevante no âmbito da investigação em curso aos créditos ruinosos que foram concedidos pelo banco público.

“É minha intenção enviar para o Ministério Público o mais rapidamente possível a transcrição da audição de Joe Berardo para avaliar se há matéria [criminal] relevante”, revelou ao Jornal Económico, Luis Leite Ramos,  presidente da nova CPI à gestão da Caixa, criada após a divulgação do relatório de auditoria da EY à gestão da CGD, entre 2000 e 2015, que conclui por perdas de 1.647 milhões de euros devido à existência de vários créditos de valores elevados,  alguns dos quais concedidos pelo banco público de forma irregular e sem respeitar pareceres internos e em operações de risco. Só a Fundação Berardo tem uma dívida de 280 milhões de euros à Caixa Geral de Depósitos. Acrescentando o valor do outro crédito, perfaz um valor global de 333 milhões de euros, numa linha de até 350 milhões de euros, com imparidades já assumidas de 152 milhões de euros.

Segundo o deputado do PSD foi já pedido aos serviços do Parlamento, “com carácter de urgência” a transcrição da audição de Berardo que na passada sexta-feira, 10 de maio, esteve no Parlamento mais de cinco horas a responder a perguntas dos deputados.

Luis Leite Ramos sinaliza também que outras transcrições serão também consideradas urgentes para enviar para o Ministério Público, nomeadamente de devedores da Caixa, já ouvidos no Parlamento, que estejam envolvidos em processos judiciais. “Casos com processos na justiça são também prioritários,” realça o presidente da CPI à Caixa. À transcrição da audição de Joe Berardo a enviar para o Ministério Público poderá, assim, também juntar a de Diogo Gaspar Ferreira, ex-presidente da sociedade gestora do ‘resort’ de Vale do Lobo, empreendimento turístico que gerou perdas de quase 300 milhões de euros para a Caixa e que está na mira da justiça no âmbito da “Operação Marquês”.

A audição de Berardo é, porém, a primeira prioridade para o presidente da CPI à Caixa, onde na passada sexta-feira, 10 de maio, o empresário madeirenses fez várias declarações polémicas que geraram uma onda de choque e levou o primeiro-ministro a afirmar no debate quinzenal desta semana que  “o País está chocado com o desplante com que Joe Berardo respondeu no Parlamento”.

Algumas das frases levaram mesmo os deputados ao desespero e exasperação como foi o caso de “eu, pessoalmente ,não tenho dívidas” e “tenho tentado ajudar os bancos”, numa audição onde Joe Berardo fez questão de salientar não é dono de nada e que mudou estatutos da Associação Coleção Berardo (ACB), da dona das obras de arte em exposição no CCB, tirando poder a bancos credores que viram a sua posição diluída após um aumento de capital que teve lugar por iniciativa de Berardo e uma alteração de estatutos daquela Associação que passaram a não permitir a transmissão para terceiros dos títulos da ACB que foram dados como penhor à CGD, BCP e Novo Banco, sem a concordância do presidente desta entidade, o próprio Berardo.

Recorde-se que Joe Berardo está a ser alvo de um processo de execução sumária por parte destes três bancos com quem assinou um acordo de reestruturação de dívida em 2012, onde exigem um pagamento de dívidas que totalizam os 962 milhões. Tal como o Jornal Económico noticiou, os três bancos credores estão a tentar executar os penhores dos títulos da ACB, que é presidida por Berardo e detém a coleção de arte homónima, avaliada em  mais de 300 milhões de euros. Porém, o empresário madeirense garantiu no Parlamento que os bancos não conseguirão tomar o controlo da associação, porque a sua posição foi diluída.

“Ah-ah-ah”, exclamou Joe Berardo quando a deputada do CDS-PP Cecília Meireles lhe perguntou se os bancos estariam em maioria nas assembleias gerais caso executassem o penhor dos títulos.

Na sequência da audição a Berardo ficou ainda a saber-se que a Caixa não quis executar as ações do BCP que Berardo deu em garantia de dois empréstimos (até 350 milhões de euros) quando o seu valor começou a descer.

 

PS e BE pedem atenção do Ministério Público sobre Berardo

A iniciativa do presidente da CPI em enviar para o Ministério Público a transcrição da audição a Berardo, surge na semana em que os deputados João Paulo Correia (PS) e Mariana Mortágua (BE) pediram a atenção da Justiça, que tem um inquérito em curso aos créditos ruinosos da CGD desde Setembro de 2016, sobre a audição parlamentar ao empresário.

Em declarações à Lusa no parlamento, o vice-presidente da bancada parlamentar do PS disse nesta terça-feira, 14 de maio, esperar “que o Ministério Público atue” relativamente aos empréstimos concedidos ao empresário, especialmente “naquilo que diz respeito à Caixa, que é um banco público”, bem como na questão da Associação Coleção Berardo, que “merece o escrutínio da Assembleia [da República] e a investigação do MP”.

“Contamos que o MP tenha estado muito atento à audição da passada sexta-feira, e que essa audição tenha fornecido bons elementos para o MP continuar a desenvolver a sua investigação”, disse João Paulo Correia.

O responsável parlamentar do PS ressalvou, no entanto, que “o inquérito parlamentar não se pode substituir à Justiça e ao Ministério Público”.

A mesma ideia foi partilhada por Mariana Mortágua. Para a deputada bloquista a questão da Associação Coleção Berardo “é uma das matérias que é preciso investigar” de forma “aprofundada”, pois é um caso “em que são alterados os estatutos à revelia dos credores e em que há um aumento de capital sem comunicar aos credores”.

Segundo Joe Berardo, os títulos da ACB, que foram entregues aos bancos como garantia de empréstimos e que valiam 75% da associação, perderam valor num aumento de capital feito posteriormente, à revelia dos bancos credores.

Da audição de sexta-feira não se compreendeu quanto é que, de momento, os bancos credores detêm na ACB.

“Já houve um pedido para um reforço de informação sobre os estatutos e sobre todo este processo, para que seja enviado à comissão, e todas as conclusões da comissão serão enviadas ao MP e, portanto, eu penso que isto deve ter uma sequência ao nível do MP”, disse à Lusa Mariana Mortágua.

Já o PCP, pela voz do deputado Duarte Alves, sinalizou que “está a ponderar todos os instrumentos que estão à sua disposição”, mencionando ainda os documentos prestes a ser recebidos.

Pelo CDS-PP, a deputada Cecília Meireles centrou a sua declaração no requerimento feito pelo seu partido, que pediu “acesso aos documentos respeitantes à Associação Coleção Berardo, para perceber, afinal, qual é a situação da associação e qual é a situação da coleção”.

Sobre o Ministério Público, a deputada disse que é uma questão “para se ponderar na altura do relatório final” da comissão, uma vez que ainda estão a ser recebidos documentos.

Já pelo PSD, o deputado Duarte Marques também remeteu uma eventual comunicação ao Ministério Público para o relatório final, mas disse que “houve muitas dúvidas que foram confirmadas” na audição a Berardo.

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