Os bancos são precisos na economia mundial e Portugal não é exceção, pelo que não devem ser vistos como um mal menor. Não existe economia sem atividade bancária e é uma atividade fulcral para a sobrevivência das empresas e particulares, estando inteiramente ligada ao desenvolvimento da sociedade e da vida humana.

Os bancos são empresas e, como tal, devem gerar dinheiro, devem dar lucro. Dentro dos bancos há pessoas, iguais às que estão noutras empresas, que precisam de trabalhar e ver o seu trabalho remunerado com dignidade.

Todos nós somos clientes desses bancos, dessas empresas, somos servidos por essas pessoas e queremos ser tratados com qualidade e, neste caso, qualidade é quase sempre confiança. Como clientes de bancos queremos ver o nosso dinheiro seguro e rentabilizado e, por isso, é decisivo que o banco seja uma empresa credível, fiável, sustentável e longe de debilidades financeiras, como sucede em muitas empresas não financeiras.

Quando algo falha na relação entre um banco e o cliente, normalmente, quase sempre, desafortunadamente, tem a ver com uma perda material. Como um banco é uma empresa financeira, quando a relação com o cliente é de perda, esta perda é dinheiro.
Por isso devemos desejar que os bancos sejam empresas financeiramente saudáveis.

Estes bancos, e porque são em empresas, têm acionistas que recebem os seus lucros em forma de dividendos. E está certo porque são os acionistas que investiram na criação do banco e na sua manutenção, por vezes com novas injeções de capital. Portanto, nada de novo, ou seja, tudo igual a qualquer outra empresa que esteja no mercado.

Mas nem tudo é assim de pacífico quando olhamos as coisas como elas são.
Sem querer ser uma voz de protesto, confesso a minha indignidade perante a obscenidade de lucros sem qualquer paralelo com a riqueza da economia ou das pessoas. Apenas isso, enormes lucros dos bancos sem justificação de mercado.

Há pelo menos três bancos com lucros recorde em 2023. Um deles viu o seu lucro crescer em mais de 50% face a 2022. Este recorde de lucros em 2023, entre todos os bancos a operar em Portugal, pode ascender a cinco mil milhões de euros. Um recorde de riqueza ímpar, num período em que o clima social nacional é uma tormenta por causa do empobrecimento das pessoas trabalhadoras. Agoniante.

Ora bem, indo um pouco mais fundo.

Numa tomada de consciência, lembrar que, durante vários anos, a margem financeira dos bancos foi afetada por taxas de juro marginalmente positivas e que, na sua génese, a atividade bancária resulta de receber depósitos e conceder crédito, aplicando um spread entre taxas passivas e ativas. E se estes lucros resultassem das operações normais de crédito, tudo estaria perfeito, porque seria o enquadramento normal da banca. Seria o equilíbrio comercial entre a banca e as necessidades de investimento das empresas e particulares, não só saudável como recomendável.

Mas não é isso que está a ocorrer.

Por decisão unilateral do BCE e de todos os bancos centrais nacionais como o Banco de Portugal, foi imposta uma subida das “taxas de juro” a um nível tal que as empresas e pessoas, endividadas junto da banca, tiveram e ainda têm, de pagar brutais quantias em juros. Este aumento de juros a pagar é um dinheiro que vai direto para os lucros do banco. Direto. O que muitíssimo mais se paga de dinheiro pelo crédito vai direitinho para os acionistas dos bancos.

A minha indignação é sobre este cristalino e obsceno fluxo de dinheiro que, numa linguagem um pouco crua, parece “arrancar dinheiro aos clientes para o entregar diretamente aos acionistas dos bancos”. As relações entre as empresas e clientes não devem ter esta agoniante tensão!

Por fim, o inacreditável.

Por que não afetar parte destes lucros excessivos, em virtude de margens financeiras elevadíssimas entre as taxas que pagam e as que recebem, a fundos de sustentabilidade de todo o sistema bancário, ou à sustentabilidade da segurança social, ou à irradicação da fome em Portugal, ou outra iniciativa que nos fizesse sentir a sensatez do Homem?