Este perfil do líder do grupo Wagner foi publicado originalmente no Jornal Económico a 17 de fevereiro de 2023, com o título “O ex-presidiário amigo de Putin que lidera um temido exército de mercenários”. Volta a ser publicado num momento em que Yevgeny Prigozhin ameaça tomar Moscovo para derrubar Vladimir Putin.
Lidera o maior e mais temido exército de mercenários do mundo, com 50 mil operacionais somente na Ucrânia. Ogrupo Wagner tem provas dadas (e um historial de violência extrema, execuções sumárias e violações) na Síria, Ucrânia e uma dezena de países africanos. A sua atuação é à margem da lei tanto na Rússia como no exterior. A ascensão de Yevgeny Prigozhin começou a ser imparável a partir do momento em que se cruza com Vladimir Putin, a quem chama de “papá”, um sinal da proximidade entre os dois.
Esteve preso na sua juventude durante dez anos por pequenos assaltos na cidade de São Petersburgo. Quando saiu, começou a vender cachorros-quentes nas ruas da segunda maior cidade russa banhada pelo mar Báltico. Com a queda do regime comunista, tornou-se um empresário de restauração e fez amizade com Vladimir Putin. Tem feito fortuna com base em contratos estatais de fornecimento de comida.
E como é que um empresário de restauração surgiu a liderar um grupo de mercenários? A sua proximidade a Vladimir Putin foi crucial, segundo um perfil feito pelo “The Guardian”. A invasão russa da Crimeia em 2014 foi crucial para o surgimento do grupo Wagner. Perante o inegável envolvimento do exército russo na anexação, a criação de um grupo de mercenários controlado pelo Kremlin surgiu como essencial para Moscovo poder interferir noutros países, negando o envolvimento direto.
Apesar de proibidos por lei na Rússia, o país conta com vários exércitos privados além do Wagner que também operam na Ucrânia: o Patriot, do ministro da Defesa Sergei Shoigu; o Redut, do oligarca Gennady Timchenko; o da empresa gasista Gazprom; o do líder checheno Ramzan Kadyrov.
O historial do grupo Wagner serve de aviso aos seus adversários: na Síria, há um relato de um homem que foi decapitado e desmembrado, momento capturado em vídeo; um desertor do grupo na Ucrânia foi morto à martelada, também em vídeo; quem se recusa a cumprir ordens é abatido em frente aos seus camaradas de armas; três jornalistas russos que foram investigar o grupo na República Centro Africana foram assasinados.
Prigozhin rejeitou qualquer ligação ao Wagner durante anos, mas em setembro de 2022 caiu a máscara: surgiu em vídeo numa prisão russa a tentar recrutar presidiários para a Ucrânia. Em troca de seis meses na linha da frente, obtêm perdão de pena e uma recompensa financeira.
Na Rússia, retratam-no como um homem que gosta de se assumir contra as elites. “Ele apresenta-se como um defensor das massas, as classes mais baixas”, disse ao “Guardian” Marat Gabidullin, um ex-comandante que trabalhou diretamente com Prigozhin.
Oempresário é atualmente procurado pelo FBI pelo seu envolvimento na Ucrânia. Mas esta não é a primeira vez que está debaixo do foco das autoridades norte-americanas: em 2016 foi acusado de interferência eleitoral nas eleições norte-americanas, por estar por detrás de uma campanha no Facebook e no Twitter para favorecer Donald Trump, recorrendo a perfis falsos. Aacusação caiu, mas o ganhou notoriedade com o caso.
O empresário tem se mostrado cada vez mais em público através de vídeos: com a captura da cidade de Soledar pelo seu exército na Ucrânia, a primeira conquista russa desde o verão, disparou na direção do exército russo: Wagner “é provavelmente o exército mais experiente no mundo hoje em dia”. Noutra ocasião, surge no cockpit de um bombardeiro Su-24 a desafiar Volodymyr Zelensky para um duelo.
Tendo criticado publicamente generais do exército e no FSB, o sucessor do KGB, há quem esteja “furioso” com o empresário, considerando-o uma “ameaça à ordem constitucional”. “Ele tem este grande grupo militar não controlado pelo Estado, e depois da guerra vão querer a sua recompensa, incluindo a nível político”; disse ao jornal britânico uma fonte da elite política do país.
Oempresário começa a ser apontado como um possível sucessor do presidente russo. A analista política Samantha de Bendern destaca que na Rússia há quem considere que Prigozhin é retratado publicamente como um “papão” para avisar os russos: se Putin sair do poder, o país pode piorar, escreveu no “The Guardian”.
Mas o facto de um ex-presidiário liderar o maior exército mercenário do mundo significa que o Kremlin está a delegar oficialmente o uso da violência em criminosos, que, nos estados modernos, é usada exclusivamente pelo Estado. O poder pode subir à cabeça de Prigozhin, que começa a ter argumentos de peso para tentar suceder a Putin, incluindo um exército de descontentes e criminosos armados até aos dentes e com experiência de combate.
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