O relatório da Comissão Técnica Independente (CTI) para a análise dos incêndios que ocorreram entre 14 e 16 de outubro de 2017, entregue no dia 20 de março de 2018, contém várias referências ao eucalipto e ao pinheiro-bravo como espécies altamente inflamáveis, destacando-se como as que “mais arderam”. Sobretudo quando se trata de povoamentos puros com matos.
“A área florestal ardida em 2017 incidiu em quase 90% em florestas dominadas por duas espécies: pinheiro-bravo (49,6%) e eucalipto (38,5%), com valores bastante mais baixos para as florestas de carvalhos, castanheiros e outras folhosas (7,4%), pinheiro-manso e outras resinosas (3,5%) e valores muito mais reduzidos para sobreiro (0,6%) e azinheira (0,3%)”, salienta o relatório.
Mais, “as áreas dominadas por pinheiro-bravo e por eucalipto foram as que mais arderam percentualmente. No ano de 2017 arderam cerca de 8% das florestas portuguesas, mas arderam 17,4% das áreas de pinheiro-bravo, e 11,9% da área de eucaliptal. Os carvalhos, castanheiros e outras folhosas arderam em cerca de 6,3% enquanto as florestas dominadas por pinheiro-manso (2,0%) e sobretudo as de sobreiro e azinheira arderam numa percentagem muito baixa (0,2%)”.
Os peritos da CTI explicam que “as razões subjacentes às diferentes proporções ardidas por tipo de floresta estão de algum modo associadas às diferentes estruturas e tipos de combustíveis nas várias formações florestais”. Nesse sentido, alertam para o facto de que “os dois tipos florestais que mais ardem (pinheiro-bravo e eucaliptos) têm uma estrutura em que o material combustível (folhas e ramos finos) se distribui verticalmente por diversos estratos, constituindo como que escadas que conduzem às copas inflamáveis que potenciam a progressão do fogo. Esta estrutura em escadas mantém-se para os carvalhos e outras folhosas que, no entanto, por terem copas menos inflamáveis não facilitam tanto a progressão do incêndio”.
Ou seja, além de terem sido as espécies que “mais arderam”, o eucalipto e o pinheiro-bravo “têm uma estrutura” que potencia “a progressão do fogo”. Ao contrário dos carvalhos e outras folhosas que “por terem copas menos inflamáveis não facilitam tanto a progressão do incêndio”.
A importância da gestão de combustíveis
Por outro lado, o relatório também indica que, nos “mega-incêndios” de 15 de outubro, a “severidade do fogo” aumentou e diminuiu mediante a maior ou menor “representatividade” de matos e eucaliptal. “Os mega-incêndios de 15 de outubro seguem o eixo SW-NE de propagação, com impacto continuamente severo em território montanhoso e uniformemente ocupado por espaços florestais, ou área ardida fragmentada por solo agrícola ou urbano; os focos secundários resultantes de projeção constituíram um importante mecanismo de expansão do fogo, particularmente no segundo caso. Predominou o fogo de copas, especialmente em pinhais densos e baixos, atingindo-se velocidades de propagação superiores a 3 km/h em todos os casos estudados […]. As classes ‘Muito Elevada’ e ‘Extrema’ de severidade do fogo (impacto na vegetação) respondem por mais de metade da área ardida, aumentando e diminuindo com a maior representatividade de matos e eucaliptal, respetivamente”, apuraram os peritos.
Ou seja, a gestão de combustíveis tem um efeito relevante. “Para as formações florestais que mais ardem (pinheiro-bravo e eucalipto) também existem diferenças importantes nas proporções ardidas relacionadas com o facto de constituírem povoamentos puros ou mistos, nas qualidades das espécies em mistura e também com a existência ou não de mato”, sublinha o relatório.
“No que respeita ao eucalipto, com uma média global de 11,9% de área ardida, a grande maioria da área corresponde a povoamentos puros, com matos e sem matos, que têm comportamentos muito distintos: as áreas de eucaliptal puro com mato arderam numa percentagem de 14,6% em comparação com as áreas sem matos em que essa percentagem foi apenas de 6,0%. O efeito da gestão de combustíveis é aqui evidenciado de forma muito significativa”, conclui.
“Os povoamentos mistos parecem indicar também comportamentos diferentes”, acrescenta o relatório. “A constituição de povoamentos mistos com o pinheiro-bravo como espécie secundária parece ter favorecido a probabilidade de arder (15,5%), enquanto a mistura com espécies como o pinheiro-manso, outras resinosas, sobreiro ou azinheira parece diminuir essa probabilidade (3,6%) e a mistura com carvalhos, castanheiros ou outras folhosas (11,6%) parece não ser diferente da média geral (11,9%)”.
O mesmo se aplica ao pinheiro-bravo. “Em média a área de pinheiro-bravo ardida em 2017 correspondeu a 17,4% da área existente em 2010. Arderam 11,1% das áreas de povoamentos puros sem matos contra 19,6% de povoamentos puros com matos. Quanto aos povoamentos mistos o valor mais elevado é o da mistura com eucalipto (17,8%) e os valores só diminuem nos casos de povoamentos mistos com carvalhos, castanheiros ou outras folhosas (11,8%) e sobretudo quando se mistura com pinheiro-manso ou outras resinosas (7,8%). Outros povoamentos mistos com menor expressão são os de pinheiro-bravo com sobreiro e azinheira, que parecem corresponder a baixas percentagens de incêndio, e os que incluem acácias como espécies secundárias que parecem ter uma tendência de incremento da probabilidade de ocorrência de incêndio em floresta de pinheiro-bravo”.
[*] Artigo corrigido no dia 26 de março de 2018.
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