“Se nós não olharmos para a energia ‘lato sensu’, como uma oportunidade de desenvolvimento socioeconómico deste país, estamos a deitar fora a maior oportunidade que temos, se calhar, desde o ouro do Brasil”, avisou Pedro Amaral Jorge, presidente da Associação Portuguesa de Energias Renováveis (APREN), durante a conferência Revolução Energética em curso, organizada pelo Jornal Económico.
O responsável acredita — “sem ser muito optimista” — que, em 2035, este setor “valerá provavelmente 16% a 18% do PIB nacional” e alerta que “não olhar de uma forma clara e objetiva para tudo o que está a ser feito e que pode ainda ser feito” seria “negligente”. “Temos de evitar que isso aconteça”, conclui.
Pedro Amaral Jorge recorda ainda que a digitalização da economia, que implica cada vez mais inteligência artificial, dependerá muito da energia. “Sem eletrões, não há inteligência artificial. Sem eletrões, não há computação. Portanto, os eletrões têm de ser sustentáveis, mas também têm de ser competitivos, têm de ser baratos e têm de ser controlados do ponto de vista soberano”, afirma o presidente da APREN.
Licenciamentos, o problema de sempre
Pedro Amaral Jorge avisa que “ninguém vai investir em redes se não houver um compromisso claro de que esse consumo vai existir, para diluir o custo unitário das redes e o consumo final da energia”. A gestão económica deve servir “para simplificar”, nomeadamente no licenciamento para o consumo de eletricidade, defende.
“O que é que andamos a fazer para criar um ciclo económico virtuoso em Portugal, com base no seu diferencial, por ter indústrias renováveis e todo um ecossistema favorável? Muito pouco”, aponta. “Temos que fazer muito mais”. Portanto, “temos de simplificar os processos de licenciamento também para o consumo — não é só para a geração. Isto tem que andar de forma harmónica”, defende Pedro Jorge Amaral.
Mas depois vem “o problema do ovo e da galinha: vêm primeiro os consumidores de eletricidade ou a geração e as redes?”, questiona o presidente da APREN. O responsável afirma que tem de ser primeiro a geração e as redes, com o compromisso de que politicamente aceleramos a incorporação do consumo”. As empresas e as instituições têm um papel a desempenhar, mas “há aqui um papel de diplomacia económica, por parte do governo, que tem de ser feito — e que não está a ser feito — na integração do ambiente, da energia com a economia, mas também forçar a economia a olhar para fora”. Ou seja, “ver o que é que a Espanha está a fazer” e o que Portugal “está a perder em termos de competitividade” na relação com o país vizinho.
O resultado é que “não há uma articulação que se veja palpável na atração da parte do consumo elétrico renovável e simplificação desse processo. Acho que temos de olhar para os problemas e começar a endereçá-los”.
Já João Macedo, CEO da Akuo Portugal — a grande vencedora do concurso solar de 2019 — diz que os projetos na área da energia “necessariamente demoram tempo” e motivam “muitas queixas”, mas ressalva que “não é sempre mau” e que é necessário “algum otimismo”. Há casos “em que corre bem” e, por isso, “tem de se ter paciência, tem de se aprender também”.
“Luz vermelha” em alguns investimentos
O consultor Nuno Ribeiro da Silva, por sua vez, considera que “o balanço para trás é positivo” e lembra que “o processo de transição é muito complexo”, lembrando que “tem de haver uma articulação entre muitas variáveis”, nomeadamente as redes, a capacidade de armazenamento, o licenciamento, e a dinâmica entre a oferta e procura”.
Hoje, afirma, “isto é evidente que é absolutamente crítico”, porque “há uma dinâmica de oferta, nomeadamente com a instalação de capacidade solar, que tem picos de geração nas horas de sol e que, como estamos numa situação de mercado, os preços a que o investidor vende essa eletricidade no mercado grossista vêm para zero”. Portanto, “isto, obviamente, acende uma luz laranja e mesmo vermelha em alguns investimentos em grandes empresas”, por “não haver razoabilidade económica para prosseguir investimentos”.
O antigo líder da Endesa Portugal considera que “não tem havido dinâmica” no licenciamento de sistemas intensivos no consumo de eletricidade, “nomeadamente, agora com os data centers” — “o que implica também uma ponte muito funcional com o Ministério da Economia”, sublinha. “A ministra do Ambiente disse ainda há poucos dias que está com um portefólio de pedidos e de solicitações enormes”.
“E este é um aspecto crítico, porque, interessa-me mais que utilizemos a vantagem comparativa de termos possibilidade de oferecer às famílias e às empresas eletricidade barata do que propriamente exportar a eletricidade pelas linhas para a França ou para a Holanda”.
“As petrolíferas estão-se nas tintas para o que diz Trump”
Na conferência do JE, Nuno Ribeiro da Silva considerou ainda que “a vontade de Trump tem uma dinâmica marginal nas decisões energéticas”, porque “as petrolíferas estão-se nas tintas para o que diz Trump”. Ou seja, “se o petróleo está nos 60 dólares, nenhuma companhia vai investir em novas extrações”.
E nas renováveis “passa-se o mesmo: quer Trump goste ou não, o setor vai ter a sua dinâmica — a dinâmica das renováveis é imparável”, considera.
Já em relação à China, que “tem uma capacidade fotovoltaica que supera o resto do mundo”, e à Índia, que “também tem uma boa dinâmica”, o especialista nota que a aposta nas renováveis “não é um favor que estes países fazem aos compromissos ambientais”. Simplesmente, são necessários, nomeadamente por causa da poluição, afirma Nuno Ribeiro da Silva
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