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Restringir comércio com China é “vontade política” em conflito com mercados

A China detém abundante mão-de-obra especializada, serviços logísticos e infraestrutura altamente desenvolvidos, além de um mercado consumidor composto por 1,4 mil milhões de pessoas.
7 Setembro 2023, 08h09

A tentativa de reduzir dependências económicas e comerciais face à China por parte dos países ocidentais, que vêm ensaiando uma estratégia comum, “choca” com as forças de mercado e é “inerentemente política”, advertem empresários.

“Uma fragmentação [nos laços comerciais com a China] não está a ser impulsionada por motivos económicos. É tudo político”, disse Steve Hoffman, presidente executivo da Founders Space, uma das principais incubadoras e aceleradoras de ‘startups’ do mundo, com sede em São Francisco, na Califórnia, numa visita recente a Pequim.

“Em termos económicos não faz sentido nenhum”, observou à agência Lusa.

A estratégia de reduzir riscos no comércio com a China foi inicialmente delineada pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e, mais tarde, adoptada pela Administração norte-americana. Em maio passado, o grupo G7, que reúne as principais economias ocidentais, vincou aquele objetivo num comunicado conjunto.

Trata-se de uma moderação da retórica anterior, que apontava para a completa “dissociação” face à China. As empresas ocidentais podem fazer negócios com o país asiático, mas com algumas salvaguardas: vetar a venda de tecnologias críticas com potenciais utilizações militares e reduzir dependências nas cadeias de abastecimento.

No entanto, os custos, dificuldades e o choque entre os interesses das empresas e dos países constituem obstáculos à sua aplicação.

“Os Estados Unidos estão sob pressão das suas empresas: Microsoft, Apple ou Intel não querem reduzir a sua exposição à China”, apontou Steve Hoffman. Em causa, estão condições “muito difíceis de replicar” em outras partes do mundo, apontou.

A China detém abundante mão-de-obra especializada, serviços logísticos e infraestrutura altamente desenvolvidos, além de um mercado consumidor composto por 1,4 mil milhões de pessoas.

O país é, assim, em simultâneo, o maior produtor e principal mercado para os iPhones da norte-americana Apple. Várias outras marcas internacionais enfrentam igual dependência.

Apesar dos apelos dos governos ocidentais às empresas para que reduzam a sua presença no país, nos últimos meses, a gigante suíça de automação industrial ABB inaugurou em Xangai uma fábrica de robótica de última geração, num investimento avaliado em 150 milhões de dólares, e a fabricante automóvel alemã Volkswagen anunciou que vai adquirir uma participação de 4,99% da marca chinesa Xpeng por 630 milhões de euros, visando o desenvolvimento conjunto de veículos elétricos.

A fabricante automóvel alemã, cuja quase metade dos lucros globais provém do mercado chinês, anunciou também que vai investir mil milhões de euros na criação de um novo centro de inovação na China.

Fernando Colaço, um português que fundou uma empresa de ‘design’ e programação em Pequim, reconheceu à Lusa que há “forças políticas” que buscam afetar a parte empresarial, mas que a “força dos mercados” continua a ser “determinante”.

“A parte empresarial continua atenta à China”, explicou. “As empresas sabem que precisam da China e querem assegurar a sua posição no mercado chinês”.

Entre os maiores riscos de investir no país está a possibilidade de um conflito em Taiwan, que Pequim reclama como território chinês, apesar de funcionar como entidade política soberana. Uma invasão da ilha pela China é suscetível de desencadear um conflito que envolverá Estados Unidos, Japão e outros países da região.

No átrio do Hilton Beijing Capital Airport, um amplo espaço coberto em mármore, com colunas e painéis de madeira ornamentados em estilo chinês, Steve Hoffman, que começou a visitar a China em 2015, alertou para os perigos da “desglobalização”.

“Quando a interdependência é total, ninguém quer agitar as águas”, descreveu. “As tensões geopolíticas vão sempre existir”, notou. “Mas, se a tua economia depende dos outros, vai existir sempre muita pressão para não exacerbares essas tensões”.

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