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Shadow banking: Bancos são muito menos importantes para a concessão de crédito do que no passado

O reverso da medalha é uma explosão de empréstimos por fundos de obrigações e outros veículos de investimento que são frequentemente designados coletivamente por “bancos sombra”.
Michael Nagle/Bloomberg
2 Março 2024, 16h01

Os bancos são hoje muito menos importantes para a concessão de crédito do que costumavam ser porque há um conjunto de operações e intermediários financeiros que fornecem crédito em todo o sistema financeiro global de forma “informal”.

A expressão serve para categorizar o grupo de empresas intermediárias do segmento financeiro que não participa do sistema bancário tradicional. Ou seja, estão “à sombra” do sistema, por isso são designados de shadow banks.

É do conhecimento geral que as tecnologias financeiras, como a titularização, facilitam aos mercados a concessão de mais empréstimos e que as regulamentações mais onerosas tornam os empréstimos tradicionais muito mais complicados para os bancos. Entretanto, as pessoas estão a colocar cada vez mais dinheiro em fundos de investimento em vez de contas bancárias, revela um estudo da National Bureau of Economic Reserach, que se debruça sobre o mercado norte-americano.

“O modelo tradicional de intermediação financeira liderada pelos bancos, em que os bancos recebem depósitos dos aforradores e concedem empréstimos sensíveis em termos de informação aos mutuários, registou um declínio dramático desde a década de 1970. Em vez disso, o crédito privado é cada vez mais intermediado através de transacções independentes, como a titularização”, refere o novo estudo do NBER (National Bureau of Economic Research).

Cada vez mais “o trabalho pesado” do sistema financeiro está agora a ser feito pelos mercados de capitais. Pelo menos nos EUA.

O Financial Times num artigo baseado no novo estudo do NBER (National Bureau of Economic Research) estima que a quota de mercado dos bancos norte-americanos em todos os empréstimos privados caiu quase para metade, de 60% em 1970 para 35% no ano passado; os empréstimos como percentagem dos activos bancários caíram de 70% para 55%; e a percentagem da riqueza das famílias detida em contas de depósito caiu de 22% para 13%.

“Documentamos que o peso dos empréstimos privados no balanço global diminuiu de 60% em 1970 para 35% em 2023, enquanto o peso dos depósitos de poupança diminuiu de 22% para 13%. Além disso, a percentagem de empréstimos em relação aos activos dos bancos diminuiu de 70% para 55%. Desenvolvemos um modelo estrutural para explorar se as melhorias tecnológicas na securitização, as mudanças nas preferências dos aforradores em relação aos depósitos e as alterações nos subsídios implícitos e nos custos das actividades bancárias podem explicar estas mudanças”, refere o estudo assinado por Greg Buchak, Gregor Matvos, Tomasz Piskorski e Amit Seru.

O reverso da medalha é uma explosão de empréstimos por fundos de obrigações e outros veículos de investimento que são frequentemente designados coletivamente por “bancos sombra”.

Embora os títulos de dívida insensível à informação regulatória – títulos de dívida – seja emitida tanto por bancos paralelos “independentes” (instituições não depositárias, ou shadow banks) como por bancos.

“Examinando a forma como estas mudanças afectam a sensibilidade do sector financeiro à regulamentação macroprudencial, concluímos, que embora o aumento dos requisitos de capital ou de liquidez diminua a atividade de concessão de crédito, tanto no cenário inicial (década de 1960) como no recente (década de 2020), o efeito é menos pronunciado no período posterior, devido ao papel reduzido nos balanços dos bancos da intermediação do crédito”, revela o estudo.

A substituição dos empréstimos dos balanços dos bancos por títulos de dívida explica por que razão se observa um declínio bastante modesto na concessão de empréstimos no conjunto dos bancos, apesar de uma grande contração dos empréstimos dos balanços dos bancos.

“Em termos gerais, verificamos que o sector da intermediação sofreu uma transformação significativa, com implicações para a política macroprudencial e a regulamentação financeira”, avança o estudo.

“A participação dos bancos no crédito global – aquilo a que o documento se refere no meio académico como “quota de empréstimos sensíveis à informação” – não diminuiu mais desde a crise financeira de 2008, apesar de regulamentações ainda mais rigorosa, e muito dinheiro permaneceu em depósitos apesar das taxas de juros insignificantes”, acrescenta.

Mas o aspecto mais interessante do documento é o argumento de que a remodelação radical do ecossistema de empréstimos ao longo das últimas décadas significa que o sector bancário poderia lidar com requisitos de capital muito mais rigorosos sem reduzir maciçamente a concessão de crédito – o maior argumento contra tal medida.

Embora o aumento dos requisitos de capital dos bancos resulte numa diminuição significativa do crédito no balanço dos bancos, há simultaneamente um aumento nos empréstimos através de títulos de dívida que substituem, embora de forma imperfeita, os empréstimos do balanço dos bancos sensíveis à informação, revela o estudo.

“Faz sentido que, à medida que os empréstimos migram dos bancos para os mercados, se tornem menos sensíveis às mudanças na regulamentação bancária. Isto pode explicar por que razão a percentagem global de empréstimos bancários estabilizou desde 2009, apesar de todo o debate Dodd-Frank”, refere o FT.

As falências bancárias de 2023 nos Estados Unidos realçaram mais uma vez a questão fundamental da vulnerabilidade bancária, enraizada na elevada alavancagem financeira utilizada pelos bancos.

O FT escreve que a elevada alavancagem dos bancos é em grande parte um subproduto das redes de segurança incorporadas no financiamento de depósitos segurados e da capacidade dos bancos de emitirem dinheiro como créditos.

“A discussão regulamentar em curso, incluindo a fase final de Basileia III, visa abordar esta vulnerabilidade, considerando o aumento dos requisitos de capital para os bancos”, acrescenta o artigo.

Os críticos de tais propostas manifestam preocupações de que o aumento dos requisitos de capital dos bancos tenha grandes efeitos adversos no crédito agregado e na economia em geral.

A análise do NBER paper sugere que os bancos são hoje muito menos importantes para a concessão de crédito do que costumavam ser. “O nosso modelo estrutural indica que o aumento dos requisitos de capital dos bancos teria apenas efeitos adversos modestos sobre o crédito agregado e conduziria principalmente à reafectação do crédito dos balanços dos bancos para títulos de dívida”, refere.

“O nosso modelo estrutural indica que o aumento dos requisitos de capital dos bancos teria apenas efeitos adversos modestos sobre o crédito agregado e conduziria principalmente à reafectação do crédito dos balanços dos bancos para títulos de dívida”, sublinha a análise.

É claro que esta “reafectação de crédito” pode ter desvantagens, mesmo que a quantidade global de crédito não mude muito. “Eliminar os riscos dos bancos torna essa parte do sistema financeiro mais segura, mas os riscos não desaparecem. Eles simplesmente assumem outra forma”, conclui o FT.

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