[weglot_switcher]

Startups tentam escalar para Londres. “Mercado inglês dá valor às boas propostas, independentemente de onde venham”, diz mentor da embaixada

“A fase de scale-up é muito crítica. Acho muito interessante o Reino Unido se ter focado nela, porque é uma espécie de “vale da morte”: ou as empresas disparam ou acabam por morrer”, alerta Miguel Matias, jurado do programa do governo britânico e ex-diretor de Inovação da Galp.
2 Dezembro 2020, 11h59

O novo programa para atrair startups portuguesas para o Reino Unido – chamado “Tech Rocketship Awards” – está a decorrer e as três empresas nacionais que vão à final europeia serão conhecidas durante a Web Summit, que arranca esta quarta-feira. De entre as mais de 600 candidaturas da Europa, foram cerca de 30 os empreendedores portugueses que mostraram interesse nesta internacionalização.

Miguel Matias, CEO da Self Energy e ex-diretor de Inovação da Galp Energia, está há cerca de doze anos a acompanhar os trabalhos que a embaixada do Reino Unido em Portugal está a desenvolver e, em entrevista ao Jornal Económico (JE), explica como é que o Department for International Trade (DIT) tem promovido estes programas de aceleração para reter e levar empreendedores para Terras de Sua Majestade.

Em 2019, das seis empresas vencedoras globais, duas eram portuguesas: a iKi Technologies e a GoParity. “Portugal, sendo mais pequeno em termos de dimensão de mercado, conseguiu pôr duas startups inovadoras no topo de dois setores muito interessantes: fintech e healthcare.”, destaca o empresário ao JE.

Com que perceção tem ficado da presença do ecossistema português no Reino Unido ou da vontade das startups lá se fixarem?

Há um misto de dois temas. O Reino Unido continua a ser uma fonte de acesso a mercados maiores – por assim dizer – e a financiamento, com muitos fundos disponíveis para levar as empresas a outros patamares, em particular para depois entrar nos Estados Unidos ou na Ásia, onde o Reino Unido é muito forte e Portugal tem menos acesso diretamente. Por outro lado, acho que o ecossistema empreendedor português tem crescido muito. Ou seja, as empresas que vejo agora estão mais preparadas para este passo do que aquelas que via há uns anos. Até porque não põem os ovos todos no mesmo cesto e vão olhando, de uma forma focada e planeada, para outros mercados. O facto de o Reino Unido ser uma mais-valia e um passo importante, mas não o único, mostra alguma capacidade de o ecossistema criar as suas alternativas.

Esses planos de internacionalização passam pela abertura de um escritório ou apenas parcerias?

Depende. Nem sempre é necessário ter lá escritório, mas a maior parte está a pensar nisso, nem que seja uma equipa mais comercial ou de desenvolvimento de produto. Não deixa de ser importante ter alguém lá. Há até o cuidado de contratar CEO ou membros do conselho de administração com conhecimento do mercado inglês para dar esse passo, que olham para essa opção como parte da estratégia. Ainda assim, para a generalidade das empresas de software/tech, ter um escritório lá não é propriamente um tema porque conseguem fazer muito através das equipas de engenharias locais.

Só quem não esteve em feiras internacionais e não conhece a força que tem a diplomacia económica inglesa e não percebe esse valor. É uma das melhores do mundo

Quais os maiores receios? Como é os jovens empresários olham para o atraso nas negociações do pós-Brexit?

Vê-se algum receio e uma abordagem cautelosa, mas também há alguma falta de conhecimento, uma necessidade – e por isso é que estão nestes programas – de acompanhamento de equipas no terreno que os podem apoiar a perceber que fundos estão disponíveis, que escritórios os podem receber, quais as leis do país. Como é um mercado cinco ou seis vezes maior que o seu, há quem diga: “Vou pôr os objetivos de receias cinco vezes superior”. Não pode ser. Não é condição necessária o mercado ser maior e vendermos mais, porque é mais desenvolvido, mais competitivo, as margens deverão ser mais baixas, a moeda é diferente. O mercado inglês dá valor às boas propostas, independentemente de onde venham. Na minha opinião, o Brexit é uma ameaça e uma oportunidade. Por um lado, tenho uma empresa lá e estou a diversificar mais as minhas operações na Europa, voltei mais a Portugal para desenvolver projetos em energias renováveis. Por outro, a Inglaterra está a fazer um esforço para criar e desenvolver o seu mercado externo. Só quem não esteve em feiras internacionais e não conhece a força que tem a diplomacia económica inglesa e não percebe esse valor. É uma das melhores do mundo.

O DIT procura scale-ups. Que critérios têm definidos para considerar assim uma empresa?

A fase de scale-up é muito crítica. Acho muito interessante o Reino Unido se ter focado nela, porque é uma espécie de “vale da morte”: ou disparam e fazem scale-up ou acabam, eventualmente, por morrer por não terem oportunidade de crescer. Há critérios que são divulgados aos jurados. Há empresas que realmente estão prontas para o scale-up só como mercado e outro tipo de produtos se calhar precisa de provar outros mercados para poder crescer. Por exemplo, uma empresa que venda Software as a Service (SaaS) não precisa de estar em muitos mercados para fazer o scale-up. Tem que ver com os produtos e depois com a dimensão das empresas: até que ponto passaram pela fase de seed capital e de arranque. Estamos a falar de empresas que já faturem. Darem lucro ou não nos primeiros anos vai depender do tipo de projeto, mas que faturem e tenham alguma tração. Admito que surpreendido com alguns projetos que não conhecia. Acho que temos bons projetos, sinceramente. Há outro fator determinante neste processo: até que ponto o Reino Unido podia ser, para eles, um mercado de apoio para o resto do seu caminho? O que lhes poderia oferecer em termos de parceiros financeiros e tecnológicos, outros mercados da Commonwealth…?

Qual o ponto essencial que avalia?

A equipa. Como é que é a adesão da equipa, como é que a equipa se vê no futuro, até que ponto é multidisciplinar, está preparada para um mercado como o inglês. Os dez ou doze finalistas fazem depois um pitch para o júri para termos oportunidade de escolher.

https://jornaleconomico.pt/noticias/programa-do-governo-britanico-chega-a-europa-e-procura-empresas-tecnologicas-portuguesas-657555

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.