Fechada a maratona de debates na televisão, os oito partidos com assento parlamentar começaram o segundo dia de campanha oficial a esgrimir argumentos na rádio durante duas horas. Luís Montenegro, líder da Aliança Democrática (AD) voltou a ser criticado pela forma como geriu o apagão e pelo caso Spinumviva, que conduziu o país a eleições antecipadas. Mas seria o apelo ao voto útil o fio condutor de Luís Montenegro e de Pedro Nuno Santos no derradeiro confronto. Sobre estabilidade política e governativa, nem um nem o outro explicaram com que apoios tencionam governar nem esclareceram o que farão em caso de derrota quanto à continuidade ou não na liderança do respetivo partido e viabilização de um Governo contrário.
Pedro Nuno Santos sustentou que só “com uma vitória do PS” é possível evitar um Governo da AD e Luís Montenegro pediu a quem antes votou noutros partidos e a quem está indeciso para “concentrar o seu voto” na coligação PSD/CDS para “pôr cobro a uma rotina que está criada de termos eleições quase todos os anos”. Durante a tarde, reunido com a Confederação do Turismo de Portugal (CTP), em Lisboa, confrontado com a possibilidade de a AD chumbar um programa de governo socialista, caso o PS vença com minoria, o secretário-geral respondeu, recorrendo ao argumento da reciprocidade, que já usara noutras ocasiões.
“Era só o que faltava. Era só o que faltava”, atirou Pedro Nuno Santos, lembrando que o PS deu “todas as condições de governabilidade à AD” no último ano. Defendendo que “ninguém do Governo, e muito menos o ainda primeiro-ministro, se pode queixar do PS” porque o seu partido estando na oposição deu “estabilidade política ao país”, o secretário-geral afirmou que “o mesmo deve acontecer se o Partido Socialista ganhar as eleições” e que “é impensável” se isso não acontecer. “Não é um favor ao Partido Socialista. É simplesmente respeitar o país. E, já agora, respeitar também, primeiro, o país e os portugueses, e, em segundo lugar, um partido que quando estava na oposição deu estas condições de governabilidade à AD”, apontou.
Pedro Nuno garante ser “genuíno”
Pedro Nuno Santos assinalou que é preciso “exigir que seja garantida estabilidade política” a seguir às eleições de 18 de maio, assim como “a reciprocidade ao PS”. “Acho que nós só teremos estabilidade política em Portugal com uma vitória do Partido Socialista. E digo isto porque, infelizmente, de há dois meses para cá, e não termina com nenhum ato eleitoral, o ainda primeiro-ministro tornou-se a principal fonte de instabilidade política em Portugal”, acusou.
O líder do PS diria antes, nas declarações que se seguiram ao debate na rádio, que o Governo da AD “falhou nas áreas essenciais” e que “não há nenhuma razão para que o povo lhe renove a confiança”. Destacou as principais propostas socialistas para reduzir o custo de vida dos portugueses (IVA Zero nos bens essenciais, o IVA da eletricidade a 6% para todos os consumos, a redução do imposto de circulação e do preço do gás botija), assim como o aumento do salário mínimo e do médio. Além destas propostas, o líder socialista vincou ainda a necessidade de “continuar a proteger o SNS” e “não deixar que o privatizem como tentou a AD ao longo do último ano”, assim como na Segurança Social, protegendo o sistema público de pensões da “tentação da AD” de entregar parte ao mercado de capitais.
Respondendo às acusações do líder do PSD, que no debate afirmou que o “verdadeiro” Pedro Nuno Santos apareceu só agora (“apareceu sereno nos debates até esta semana, agora está nervoso, era tudo maquilhagem”), o secretário-geral do PS garantiu ainda ser “sempre o mesmo”, mesmo que as “circunstâncias” façam com que, em determinados momentos, “possamos ser mais ou menos combativos”. “Sou sempre a mesma pessoa. Sou um político transparente, transparente em toda a linha, ao contrário de Luís Montenegro que, ao longo da sua vida política, transformou a mentira numa forma de viver, a enganar os portugueses, essa característica é dele. Sou transparente, sou genuíno, coisa que Montenegro não é, é alguém que faz da mentira uma prática quotidiana”, acusou.
Montenegro puxa ex-líderes para campanha
Já Luís Montenegro apontou como solução para o país uma vitória da AD, somando estabilidade política à “estabilidade económica, à estabilidade financeira e à projeção de um país com mais esperança”. Só assim, disse nas declarações pós-debate na rádio, PSD/CDS vão conseguir “concretizar todas as políticas que recuperam o Estado Social, o Serviço Nacional de Saúde, que dão estabilidade à escola pública, que dão mais segurança aos cidadãos”.
Sobre a segurança, tema que não foi abordado na rádio, o líder da da Aliança Democrática (AD) quis salientar o trabalho do Governo “no reforço do policiamento de proximidade”, na visibilidade de segurança, “para combater a criminalidade violenta, para dar maiores garantias e salvaguardar as liberdades individuais” e, também, para “continuar a ter Portugal como um dos países mais seguros do mundo”, aproveitando esse ativo para “atrair recursos humanos e investimento empresarial”.
Passando depois em revista os feitos do Governo, estratégia do Executivo nesta corrida eleitoral que, acredita, os portugueses saberão reconhecer. “O Governo foi capaz de tudo isto e, ao mesmo tempo, aumentar salários, baixar impostos sobre o rendimento do trabalho, fomentar as condições para que os jovens não tenham de sair de Portugal”, sem esquecer os reformados, que tiveram as “pensões valorizadas”. “Assumimos o compromisso e aumentamos todas as pensões, aumentamos a comparticipação dos medicamentos, baixamos o IRS da classe média e baixamos o IRS através da atualização dos escalões do IRS, que também se aplica às pensões”, elencou.
Questionado sobre as elogiosas palavras de Cavaco Silva num artigo de opinião no Observador em que o antigo Presidente da República defende que o ainda primeiro-ministro está a ser alvo de uma “campanha de suspeitas e insinuações”, Montenegro aproveitou os microfones que se abriram depois do debate na rádio para agradecer e revelar que vai ter um encontro esta terça-feira com todos os que lhe antecederam na liderança do PSD, onde estará não só o antigo Presidente da República, como outros ex-líderes, Pedro Passos Coelho, Rui Rio, Santana Lopes e Marques Mendes incluídos.
Trata-se de um almoço na sede do partido por ocasião do 51.º aniversário do PSD, e não uma ação de campanha propriamente dita, mas Luís Montenegro não deixará de usar os notáveis como trunfo eleitoral numa demonstração de unidade e coesão. Certo é que no jantar que encerrará as comemorações do aniversário, no Centro de Congressos, em Lisboa, não se sentarão todos os que que horas antes estarão na São Caetano à Lapa.
Agricultura e TAP e mais Cavaco Silva
Na tarde do segundo dia de campanha, os líderes dos principais partidos dedicaram-se a setores distintos. O ainda primeiro-ministro esteve reunido com agricultores, a quem prometeu aliviar regras burocráticas e tornar o setor mais autossustentável, reduzindo gradualmente o défice comercial, mas sem qualquer protecionismo e com acordo fechado com o Mercosul. Posições defendidas por Luís Montenegro, num primeiro momento em conversa com agricultores da região do Oeste e, depois, num breve discurso que fez após ter visitado a Adega da Vermelha, no Cadaval. De lá, seguiu depois para Castelo Branco.
Luís Montenegro demarcou-se da posição de alguns agricultores, que são contra a concretização do acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul, lembrando que este acordo é a solução para se “exigir reciprocidade” em termos de cumprimento de regras ambientais e de controlo sanitário” – e não o contrário. E avisou: “Não temos de ter medo disso. Quem quiser fechar-se numa concha para proteger hipoteticamente o seu interesse, quando acordar, vai ficar com a sua prateleira [de vendas] cheia. Vai ver ver a prateleira do outro completamente vazia”.
Já em Lisboa, reunido com a Confederação de Turismo, Pedro Nuno Santos marcou o dia político com declarações sobre a TAP, voltando a defender a entrada de investidores estrangeiros na TAP através de uma participação minoritária no capital da companhia aérea portuguesa. “O Estado deve ter a maioria do capital da TAP e devemos abrir capital ao investimento estrangeiro, nomeadamente de outros grupos da indústria”, afirmou, recordando que esta era a sua posição quando liderava o ministério das Infraestruturas.
“Aquilo que sempre defendi quando na altura era ministro era que se abrisse o capital da companhia aérea para permitir a sua integração com outros grupos de aviação”, salientou, recordando que se a TAP não tivesse sido intervencionada pelo Estado teria tido muitos problemas, podendo inclusive ter encerrado. “Já tivemos exemplos noutros países em que a companhia de bandeira fechou e a sua recuperação nunca aconteceu. E, por isso, seria um prejuízo incalculável para a nossa economia nós deixarmos uma empresa crítica e central para o desenvolvimento nacional”, reforçou.
Sobre o novo aeroporto, que o Governo da AD estima estar construído até 2034, o antigo governante de António Costa pediu à “ANA que se despache” para que sejam reduzidos de “forma significativa” os prazos para a construção. Em relação à localização, o secretário-geral do PS afirmou que a decisão – Alcochete – está tomada e que, apesar de ter defendido a opção Montijo, essa é uma solução que “não é recuperável e está ultrapassada”.
“Aquilo que sei é que neste ano, se tudo tivesse corrido de acordo com os prazos, estávamos a receber mais aviões e mais passageiros. Se a decisão tivesse sido concretizada na altura e, depois, com tempo e com outra segurança, nós faríamos a preparação para um infraestrutura de maior dimensão que substituísse as outras duas”, defendeu. Horas depois, a entrada de um comício em Viseu, questionado sobre o artigo de opinião do antigo Presidente da República, Pedro Nuno recordou: “Cavaco Silva, 13 dias antes do BES cair, disse que estava tudo bem.”
E os outros partidos?
Depois do debate nas rádios, o Chega partiu para uma arruada em Santarém, onde aproveitou para criticar Luís Montenegro por trazer para a campanha ex-líderes do PSD, contrapondo que no seu partido quer é olhar para o futuro. “Nós não estamos aqui com históricos. Nós não queremos estar com históricos, nós queremos olhar para o futuro. Eu não quero dar a Portugal um passado, esse, Portugal já tem”, declarou André Ventura. Sobre governabilidade, o líder do Chega não excluiu viabilizar um novo Governo minoritário chefiado por Luís Montenegro, mesmo sem o integrar: “O doutor Luís Montenegro terá que levar ao Parlamento esse programa [de Governo] e esse programa será viabilizado, será viabilizado ou não.”
Comentando cenários a seguir ao dia 18 de maio, Rui Rocha, que poderá vir a ser a ‘chave’ da governabilidade, defendeu que este não é o momento para “decidir coligações”, mas sim propostas. O líder dos liberais esteve durante a tarde numa arruada em Lisboa dedicada especialmente aos jovens, a quem prometeu que a IL irá mudar o país.
Também em campanha na capital, Mariana Mortágua, coordenadora do Bloco de Esquerda, visitou uma escola na freguesia da Penha de França. A líder bloquista acusou a direita de ser uma ameaça para a escola pública e alertou para “projetos perigosos” como o da IL, que quer reduzir o número de funcionários administrativos.
Quem também aproveitou o segundo dia da campanha em Lisboa foi Rui Tavares. O porta-voz do Livre disse que se sente uma “enorme acrimónia” nos partidos políticos à direita e alertou que, em caso de vitória destes, criar-se-á uma “grande instabilidade” no país. De manhã, no debate das rádios, o historiador afirmou que “a direita pode estar a quatro lugares apenas – fazendo a transposição dos resultados para deputados – não de uma maioria de Governo, mas de uma maioria constitucional”, que corresponde a dois terços dos deputados. “Ou a esquerda tem clareza e mobiliza os votos progressistas e democráticos, ou podemos estar em face de uma situação que é constitucionalmente perigosa para o país, e este alerta tinha de ser lançado”, frisou.
A CDU (PCP/Verdes) regressou à campanha no Couço, vila de Coruche conhecida pela resistência antifascista, onde Paulo Raimundo agradeceu a coragem de mulheres e homens daquela vida na ditadura, mas lembrou que “a luta ainda não acabou”.
No Porto, a porta-voz do PAN, Inês Sousa Real, responsabilizou o PS e o PSD pela não aprovação da licença parental paga a seis meses e garantiu que, se for eleita, voltará a insistir na próxima legislatura.
Com Lusa
Tagus Park – Edifício Tecnologia 4.1
Avenida Professor Doutor Cavaco Silva, nº 71 a 74
2740-122 – Porto Salvo, Portugal
online@medianove.com