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Tarifas, Ucrânia e deportações: Trinta dias de Trump centrados em todas as promessas

Imigração, tarifas, Ucrânia, deportações, libertações, China, México, Canadá, União Europeia. Qualquer assunto de que se trate com relação aos primeiros trinta dias do governo Trump emana das promessas de campanha. Talvez com a exceção do antigo Golfo do México, que agora tem outro nome qualquer.
tarifas
20 Fevereiro 2025, 09h50

Donald Trump não perdeu tempo para cumprir as promessas que fez ao povo norte-americano durante a campanha eleitoral – e na substância não fez nada que pudesse constituir uma surpresa – o que quer dizer que todas as suas decisões estão antecipadamente sufragadas pelo voto popular registado a 5 de novembro do ano passado. Tomou posse a 21 de janeiro e nesse mesmo dia avançou com as suas primeiras decisões: o presidente assinou mais ordens executivas no seu primeiro dia de mandato que qualquer outro presidente na história dos Estados Unidos.

Nos primeiros dias da sua segunda administração, Trump tomou centenas de decisões executivas para proteger a fronteira, deportar imigrantes ilegais “criminosos” – segundo a susa opinião, que não é necessariamente coincidente com a dos tribunais – “libertou a prosperidade norte-americana, reduziu custos, aumentou a transparência do governo e reinstituiu a contratação baseada em mérito no governo federal”, segundo nota oficial da própria administração Trump.

Primeiro os investimentos…

O presidente já garantiu mais de um bilião de dólares (um trilião, na contagem americana) em novos investimentos, considerados históricos: 500 mil milhões em investimentos do setor privado para o maior projeto de infraestrutura de IA da história, com o CEO da Softbank, Masayoshi Son, o cofundador da Oracle, Larry Ellison, e o CEO da OpenAI, Sam Altman; um investimento da responsabilidade da Arábia Saudita – 600 mil milhões de dólares nos próximos quatro anos em vários projetos; e o anúncio de que a Stellantis, o gigante automóvel europeu que o gestor português Carlos Tavares acaba de abandonar avançará para uma fábrica de montagem em Illinois e construirá o novo Dodge Durango em Detroit.

Na frente da imigração, a Patrulha da Fronteira já foi posta a controlar a passagem com o México. Em apenas um dia e meio, as operações de remoção e fiscalização) prenderam mais de 460 imigrantes ilegais “que incluem históricos criminais de agressão sexual, roubo, arrombamento, agressão agravada, delitos de drogas e armas, resistência à prisão e violência doméstica”, ainda segundo fonte oficial. No dia seguinte, prendeu 538 imigrantes ilegais, “desde predadores de crianças até membros de gangues e um suspeito de terrorismo”. Ao mesmo tempo, Trump encerrou a aplicação CBP One, que lançou mais de um milhão de imigrantes nas malhas da ilegalidade – enquanto deixava de reconhecer a cidadania americana a filhos de imigrantes ilegais pelo simples facto de terem nascido em solo norte-americano – um tema que vários Estados levaram de imediato a tribunal, por o considerarem inconstitucional. Os voos de deportação começaram entretanto – o que redundou em vários problemas diplomáticos, nomeadamente com o México e com a Colômbia – que acabaram por aceitar a versão de Trump. E libertou mais de mil prisioneiros acusados de participação na sublevação de 6 de janeiro de 2021 no Capitólio

Trump assinou uma série de ordens executivas garantindo a eliminação de práticas discriminatórias, garantindo a contratação baseada no mérito para os organismos federais. A ordem executiva afirmando a realidade de que existem apenas dois sexos está indiretamente ligada ao processo. E acabou, nas agências governativas, com as práticas de trabalho remoto.

Mais tarde, o presidente declarou a Emergência Energética Nacional “para liberar todo o potencial energético dos Estados Unidos e reduzir os custos para as famílias americanas”, segundo explicou. Revogou todas as regulamentações energéticas de Joe Biden , dando poder de escolha ao consumidor “em veículos, chuveiros, sanitários, máquinas de lavar, lâmpadas e lava-louças”. Ao mesmo tempo, saia do “desastroso Acordo Climático de Paris, que prejudicou injustamente o nosso país” e suspendeu todos os novos arrendamentos e autorizações federais para grandes parques eólicos, “que degradam as nossas paisagens naturais e não se preocupam com os consumidores de energia americanos”. Reverteu as regulamentações onerosas que impediam a capacidade do Alasca de desenvolver seus vastos recursos naturais e acabou com a discriminação positiva de veículos elétricos e de palhinhas feitas em papel.

Vale a pena acrescentar ao rol: o interesse pela Gronelândia e pelo canal do Panamá. E a circense alteração do nome de Golfo de México para Golfo da América.

… depois as tarifas…

Mais tarde vieram as tarifas alfandegárias, também elas constando das promessas eleitorais de Donald Trump. México e Canadá, os vizinhos naturais dos Estados Unidos, foram ‘agraciados’ com aumentos generalizados de 25% – pulverizando o acordo NAFTA – enquanto um aumento de 10% era dirigido à China. Ficou claro que a vontade de Trump irromper contra a China não seria tão forte como se tinha imaginado – mas poucos dias depois veio a explicação: depois de meia dúzia de telefonemas, o Canadá primeiro e o México depois conseguiram uma moratória de um mês, durante a qual as tarifas de 25% não serão aplicadas. Os analistas colocam a hipótese de que elas venham a ser esquecidas.

E finalmente chegou a vez da Europa. Trump disse que o continente e principalmente o bloco dos 27 passaram anos a destratar os Estados Unidos – criando, entre outras coisas horríveis, um enorme défice comercial do lado dos Estados Unidos – e que isso teria de acabar. Para já, ainda não é claro como todo o plano se vai processar, sendo certo que a União Europeia, como lhe é costume, esta sentada para ver o que acontece. Aliás, a reação imediata foi mesmo essa: vamos sentar-nos para discutir. Aparentemente, Trump não tem tempo para isso.

O que ficou claro, é que Trump não tolera mais que os países europeus não cumpram os gastos de 2% do PIB no setor da defesa. E como não cumpriam, têm agora um novo desafio: não serão 2%, mas 5% – um aumento de 150%. Que se saiba, ninguém disse peremptoriamente que ‘não’, até porque de imediato, o neerlandês Mark Rutte, que se apresenta como secretário-geral da NATO, fez um périplo pela Europa (Portugal incluído), para explicar que não haveria discussões sobre a matéria.

… e finalmente a Ucrânia

E finalmente a Ucrânia – e mesmo nesta matéria Donald Trump não inovou: fez apenas o que estava dito que faria. Ligou a Vladimir Putin por telefone, falou com ele durante uma hora e meia e com ele combinou que delegações ao nível dos ministérios dos Negócios Estrangeiros se iriam encontrar para resolver a ‘pessegada’ da Ucrânia. Foi isso mesmo que aconteceu esta semana em Riad, Arábia Saudita, sem a presença de qualquer outro país que não a Rússia e os Estados Unidos – ‘expulsão’ essa que se estendeu também à própria Ucrânia. Nada de novo: Trump tinha dito que “eu resolvo a guerra” e só falhou no prazo: afinal não foram 48 horas. De então para cá, o presidente dos Estados Unidos tem-se preocupado em ‘destratar’ publicamente o seu homólogo ucraniano – que, já se percebeu, passou a ser ‘descartável’. E tem guardado um tempo para se rir, ao ver que a resposta europeia é fazer uma cimeira de imergência com meia dúzia de países e dois dias depois uma cimeira de imergência 2.0 com os países que não beneficiaram da sorte de terem sido convocados para a primeira. Até nisso, as coisas estão a correr bem a Trump: como é fácil abrir brechas entre os europeus, ao mesmo tempo que os obriga a cumprir coisas que eles não prometerem a ninguém.

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